Anunciado na segunda-feira (24), o acordo de leniência feito por três empresas do grupo J.Malucelli com o Ministério Público do Estado do Paraná (MP-PR) e com o Ministério Público Federal do Paraná (MPF-PR) pode abastecer ao menos três investigações “locais”, ligadas ao ex-governador do Paraná Beto Richa (PSDB) – Operação Rádio Patrulha, Operação Piloto e Operação Integração –, mas também deve alcançar apurações como a Operação Buona Fortuna/Operação Lava Jato, que apura ilícitos na construção da Usina Hidrelétrica de Belo Monte, no Pará, e como a Operação Sépsis/Operação Greenfield, que trata de desvios em Fundos de Investimentos da Caixa Econômica Federal (CEF).
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Além disso, entre as três empresas do grupo J.Malucelli que integram o acordo de leniência, está a Televisão Icaraí, que é responsável pelo conteúdo e pela transmissão da TV da Assembleia Legislativa do Estado do Paraná.
A TV Icaraí ainda não tinha aparecido no bojo das denúncias já oferecidas até aqui pelo MP e pelo MPF, o que pode indicar a abertura de novas investigações, sobre casos ainda não conhecidos pelos promotores de Justiça e procuradores da República.
As duas outras empresas do grupo incluídas no acordo de leniência são a Companhia Paranaense de Construção (cujo nome social atual é J.Malucelli Construtora de Obras) e a MLR Locações de Máquinas (a J.Malucelli Rental).
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Mas o conteúdo dos chamados “anexos” do acordo de leniência ainda está em sigilo. Ou seja, o que as pessoas ligadas às empresas relataram a integrantes do MP e do MPF para obterem o acordo de leniência ainda não foi divulgado. Apesar disso, nomes de empresários ligados ao grupo J.Malucelli já apareceram em situações reveladas pelo MP e pelo MPF desde 2018, indicando assuntos que foram abordados no acordo de leniência. Entre os episódios que ganharam repercussão, há supostos pagamento de propina e fraude em licitação.
Fundador do grupo J.Malucelli e primeiro suplente do senador Alvaro Dias (PODE-PR), Joel Malucelli virou réu em uma ação penal derivada da Operação Rádio Patrulha no final de 2018, acusado de corrupção ativa. Áudios da investigação revelaram que Joel Malucelli, mesmo derrotado no processo licitatório ligado ao programa “Patrulha do Campo”, acabou participando da divisão informal dos lotes do certame.
Lançado pelo governo do Paraná no fim de 2011, na gestão Beto Richa, o programa “Patrulha do Campo” oferecia um conjunto de maquinário para os municípios utilizarem em obras de melhoria das estradas rurais. O maquinário seria alugado de empresas, definidas a partir de um processo de licitação, dividido em três lotes. Em conversa gravada ocorrida em dezembro de 2013, Joel Malucelli fala que “menos de quatro patrulhas [quatro conjuntos de maquinário]” não era vantajoso para ele, e contestou os parceiros da fraude.
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O nome de Joel Malucelli também já apareceu durante a investigação da Operação Greenfield, e que está conectada com a Operação Sépsis. O ex-superintendente de Fundos de Investimentos da Caixa Econômica Federal Roberto Carlos Madoglio, delator no âmbito da Operação Greenfield, disse que entregou a Joel Malucelli o número da conta bancária na Suíça na qual receberia propina do empresário de Curitiba – aproximadamente R$ 500 mil.
O “agrado”, nas palavras do delator, tinha relação com um aporte de cerca de R$ 300 milhões feito em 2009 pelo Fundo de Investimento do FGTS (FI-FGTS), ligado à Caixa Econômica Federal, em usinas elétricas da J.Malucelli Energia, braço do Grupo J.Malucelli. A propina, ainda segundo o delator, teria sido oferecida pela primeira vez por Alexandre Malucelli, que é filho de Joel e presidente do grupo desde 2013.
Em outro trecho da sua delação, Madoglio citou novamente o empresário Alexandre Malucelli, ao falar sobre o que teriam sido as negociações em torno da formação do consórcio que venceu o leilão para construir a Usina Hidrelétrica de Belo Monte, no Pará, no ano de 2010. Madoglio explicou que, diante de um aparente mau negócio, conseguiu evitar a participação do FI-FGTS no leilão da Belo Monte e ficou “surpreso” quando soube que a J.Malucelli Construtora de Obras integrava o consórcio vencedor do negócio.
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Nesta época, a J.Malucelli Energia já era acionista do FI-FGTS, e Madoglio então perguntou a Alexandre Malucelli o motivo da participação da J.Malucelli Construtora de Obras no negócio da Bela Monte. Alexandre Malucelli, segundo Madoglio, teria respondido da seguinte forma: “Não tive escolha, me mandaram participar”. Alexandre Malucelli não teria dito de quem partiu a “ordem”, ainda segundo Madoglio.
Quando as delações de Madoglio vieram à tona, a família Malucelli negou veementemente os relatos. Nesta segunda-feira (24), a Gazeta do Povo entrou em contato com o advogado Rodrigo Nicoletti Alves, que no acordo de leniência é quem assina para representar as três empresas, mas ele informou que “não tenho nada a declarar sobre este tema”.
Empresas prometem pagar R$ 100 milhões ao longo de 8 anos
Além de um pedido público de desculpas, o grupo J.Malucelli concordou no acordo de leniência que irá pagar um total de R$ 100 milhões em decorrência dos ilícitos narrados nos “anexos”. Parte do valor – 27% – será revertido aos cofres do Estado do Paraná. A maior parte do valor – 73% – será entregue aos cofres da União. O pagamento poderá ser feito ao longo de oito anos, em parcelas anuais. A primeira parcela vence já na primeira quinzena de setembro.
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No acordo de leniência, além de reconhecer os ilícitos praticados e fazer o ressarcimento, as empresas se comprometeram a fornecer informações e provas relevantes sobre a participação de terceiros e a apresentar dados de movimentação financeira entre 2009 e 2018, para a investigação dos fatos. Assumiram, ainda, o compromisso de adotar medidas especiais para evitar a repetição de condutas ilícitas no futuro.
O acordo de leniência foi homologado pela 5ª Câmara de Coordenação e Revisão do MPF no último dia 6 de agosto e pelo Conselho Superior do MP em 6 de julho.