Apesar da urgência de um programa de proteção para os 4,5 milhões de quilômetros quadrados que compõem o território marítimo brasileiro, dificilmente, uma ferramenta de segurança e monitoramento aos moldes do Sistema de Vigilância da Amazônia (Sivam) sairá do papel ainda esta década. A avaliação é do comandante da Marinha, almirante Roberto de Guimarães Carvalho, que se mostra pessimista com a efetivação de qualquer projeto diante das dificuldades econômicas que a Força enfrenta.
"É muito difícil (que isso aconteça até 2010). A situação financeira (da Marinha) é complicada. Precisamos mudar a percepção da sociedade e do poder político sobre a importância que esse mar tem no País", afirmou, em evento na Federação das Indústrias do Estado do Rio de Janeiro (Firjan), referindo-se à Amazônia Azul, uma região maior do que a Amazônia Verde, composta pelas 200 milhas marítimas, na chamada Zona Econômica Exclusiva (ZEE) – que pode chegar a 350 milhas, no caso de prolongamentos naturais da massa terrestre em Estados costeiros.
Embora tenha sido estabelecido na Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar que todos os bens econômicos existentes ao longo da ZEE são, por direito, propriedade exclusiva do País ribeirinho, o governo precisa cumprir também uma série de deveres, entre os quais, os relacionados à área ambiental e de segurança pública na referida zona.
"Precisamos desenvolver, por exemplo, a nossa indústria pesqueira. Se não fizermos isso, outros países, onde os recursos já estão se esgotando, vão pedir autorização para fazer isso aqui. Se não dermos, eles vêm, ilegalmente. Precisamos, portanto ter alguém lá tomando conta", alertou.
Segundo Carvalho, o Programa de Reestruturação da Marinha (PRM), que é revisto e deve ser entregue à administração federal em breve, prevê um gasto de US$ 6,8 bilhões para o período de 2006 a 2025. No entanto, o total é relativo à compra de equipamentos como navios e helicópteros. Não contempla, portanto, os custos necessários para a criação de um sistema de proteção da Amazônia Azul. "É um dinheiro que pode ser buscado no Tesouro, nos royalties ou em financiamentos externos", sugeriu.
Presidente da Atech Tecnologias Críticas, empresa responsável pelo desenvolvimento dos sistemas que controlam mais de 90% do tráfego aéreo brasileiro, Tarcísio Takashi Muta salientou que a conscientização da Marinha sobre a necessidade de um programa é insuficiente para fazê-lo deslanchar. "Isso não basta. Se ela não tem recursos, não tem como se equipar. Precisamos de ação política", disse, sem dar detalhes sobre um eventual esquema de monitoramento semelhante ao Sivam, iniciado em julho de 2002.
Para dar uma idéia da relevância de um projeto para a Amazônia Azul, Muta destacou quanto o País poderia ganhar, por exemplo, no setor de transporte marítimo. De acordo com ele, as empresas brasileiras, sejam públicas ou privadas, gastam, anualmente, US$ 7 bilhões em fretes. "A maioria vai para as mãos de navios de bandeiras internacionais. Apenas 3% deste total é destinado aos brasileiros. Temos um potencial enorme. Precisamos explorar isso", disse.
Ministério
A importância de um controle da área, de grande potencial comercial, distribuído em setores como prospecção de petróleo, pesca e transporte marítimo, foi ressaltada também pelo almirante Armando Vidigal, que lançou uma proposta classificada por ele como ousada: criar um conselho de gerenciamento do mar coordenado por uma autoridade com poder ministerial. "A autoridade marítima hoje não tem nível ministerial. Isso traz grandes dificuldades de administração de questões que envolvem diversos ministérios", afirmou. Embora apóie a sugestão, o comandante da Marinha não acredita que seja viável. "Seria o ideal. Mas isso é uma coisa que não tem volta (a perda do poder ministerial para cada uma das Forças Armadas)."