Os exportadores argentinos de trigo, na contingência de escassez do produto no mercado interno, decidiram restringir os embarques do cereal para os países compradores tradicionais. Entres estes está o Brasil, o maior comprador do trigo produzido na Argentina, com uma quota anual de 6,7 milhões de toneladas. A preocupação elementar do governo Kirchner é que a falta do principal produto de consumo alimentar no país contribua para a alta do nível inflacionário. Há pouco tempo o governo pressionara o setor exportador de carne a cortar os embarques para o exterior, também premido pela ameaça de perder o controle sobre a estabilidade da moeda.
Fontes ligadas aos moinhos brasileiros afirmam que o Brasil fechou a compra de 5,5 milhões de toneladas, das quais 4,1 milhões já foram embarcadas, restando 1,1 milhão de toneladas.
O setor de moagem teme que os exportadores argentinos, diante da crise de abastecimento, passem a pedir preços maiores pelo restante a ser comercializado. A tonelada de trigo nos portos argentinos, em função da quebra de safra, subiu US$ 20, estando atualmente cotada em US$ 155. A Associação Brasileira da Indústria do Trigo (Abitrigo) antecipou a péssima notícia que as prováveis restrições nos embarques de trigo argentino para o mercado brasileiro poderão ocasionar o aumento de 30% a 40% no preço do produto.
Os rumores vindos do Rio da Prata fizeram com que aumentasse a demanda por parte dos moageiros nos leilões de entressafra realizados pelo governo, e no último leilão se registrou a tendência de alta do preço do cereal. Apesar da elevação dos preços, o setor não acredita em falta de farinha e derivados no mercado interno, lembrando que a dificuldade momentânea será suprida pelo trigo norte-americano, embora o baque esteja no custo da tonelada (US$ 217 base Kansas). Assim, o nó que ninguém se habilitará a desatar – muito menos o governo federal – pela enésima vez será transferido para o consumidor, que vai pagar mais caro pela farinha de trigo, pão e massas em geral, itens de presença obrigatória no cardápio da maioria dos brasileiros.
Muitos leitores haverão de lembrar que há duas décadas, se tanto, a região sul do Brasil produzia trigo em volume suficiente para garantir o abastecimento interno, além de diminuir as importações da Argentina e do Canadá. O Banco do Brasil operava a Comissão do Trigo Nacional (Ctrin), que, além do crédito de custeio e garantia de compra da produção, proporcionava aos triticultores acesso a sementes de variedades adaptadas às condições de clima e solo das regiões produtoras. Os resultados dessa política acertada não se fizeram esperar e dela o Paraná se beneficiou de modo extraordinário, contribuindo com excelentes safras até meados dos 90s.
A extinção da Ctrin e o desestímulo à produção de trigo como opção de cultivo de inverno fez com que o País passasse a depender do trigo argentino, em maior escala, para garantir o abastecimento. Uma decisão de governo – se afirmava – lastreada na obrigação de honrar compromissos comerciais com o país vizinho, à época e ainda hoje, não explicada em seu inteiro teor. Na contingência da quebra de safra do trigo argentino, o consumidor brasileiro não tem a quem apelar: paga mais ou deixa de comer o pão nosso de cada dia…
