O Brasil enfrentará problemas nos próximos anos para segregar a soja convencional da geneticamente modificada em razão da rápida expansão da produção de organismos geneticamente modificados (OGMs) no País. Profissionais envolvidos em sistemas de certificação e análise de lotes de sojas alegam que o País não tem infra-estrutura logística e de armazenagem para criar espaços isolados para guardar as duas categorias de produto.
"Já existe uma dificuldade neste momento, mas esta tende a aumentar muito com a expansão do plantio de soja transgênica, que dá mostras de avançar cada vez mais", alerta Johnny Drescher diretor-comercial da Schutter do Brasil, empresa holandesa que se fixou no País em 2000 para monitorar embarques de soja para a Europa e principalmente participar da organização de cadeias de soja livres de OGMs. "Existe um mercado de soja transgênica e outro de soja convencional. É fundamental o País conseguir manter este segundo", diz.
A questão se tornou mais complexa dado o volume de transgênicos que ano a ano é colhido nas lavouras brasileiras. Isso tem posto à prova estruturas de segregação feitas de forma amadora. Segundo Pablo Molloy, gerente-geral da GeneScan, laboratório alemão que mantém uma estrutura de análise de OGMs no Brasil, localizado na cidade de Itu, interior de São Paulo, muitas empresas que negociam soja convencional começam a ser surpreendidas com resultados positivos de seus lotes.
"Tem crescido muito esta situação. A empresa tem acordos comerciais para recebimento de produto não-geneticamente modificado e, ao fazer os testes, constata que possui uma carga transgênica. A reação é sempre de surpresa", diz Molloy. Diante desta situação, tem crescido o número de análises quantitativas, que tentam mensurar o porcentual de OGMs num lote. A "contaminação involuntária", considerada por compradores internacionais ou por indústrias de alimento, admite volume máximo 1% da carga de transgênicos num lote no Brasil e de 0,9% na Europa. Acima disso, o lote requer rotulagem. "Pegamos casos em que 98% do lote era de soja transgênica e a empresa não sabia", diz.
Molloy explica que tem sido muito comum a contaminação em caminhões, esteiras de transporte ou em silos usados para os dois produtos. "A infra-estrutura que o Brasil dispõe hoje praticamente suporta o volume de produção do País, mas não foi projetada para separações", diz Drescher. A situação, avalia, levará inevitavelmente a uma elevação dos prêmios pagos aos participantes de cadeias de produção que assegurarem oferta livre de OGMs. "Um prêmio razoável chega a US$ 5 por tonelada. Este valor pode ser maior ou menor conforme o nível de segurança agregado à cadeia", afirma. Sistemas com rastreabilidade que observa a cadeia do plantio até o embarque tendem a inflacionar esse prêmio.
É o caso da Coamo Agroindústria Cooperativa, do Paraná. A empresa decidiu concentrar a comercialização no mercado de soja convencional. Congrega 18 mil produtores do Paraná, Santa Catarina e Mato Grosso do Sul e criou um sistema de monitoramento para evitar contaminação de soja transgênica. A medida deu resultado. Segundo Drescher, o Carrefour acada de dar aval para a cooperativa se tornar fornecedora mundial de farelo de soja para uso como ração. "Os fornecedores de itens para a linha de produtos da rede receberão a recomendação para comprarem o insumo de empresas que asseguram a produção de soja não transgênica", explica Drescher.