Se não renunciasse, poderia tornar-se inelegível pelo prazo de oito anos. Como já está reeleito, renunciou. O deputado Pinheiro Landim, cujo mandato atual falece de partido, seguiu a regra e os “bons costumes” vigentes no Congresso Nacional. E ofereceu à nação outro triste episódio, um mau exemplo cujo script, sempre na reta final seguido por Tízios e Simprônios, clama por reformas. Landim renuncia a quinze dias de mandato mas reassume no começo de fevereiro para, de alma lavada, empurrar o processo que o incomoda para o fórum privilegiado a que tem direito e, assim, seguir colaborando para as grandes causas brasileiras… Ora, bolas!
Direito? Ele está envolvido até o gogó com uma história que enlameia também a alma da magistratura nacional pela ação de dois juízes: faria parte de um esquema de produção de habeas corpus, mediante alto pagamento, para a soltura de traficantes de drogas. Pelo que se acompanhou até aqui, seria tão difícil a Landim provar sua inocência quanto sustentar seu mandato parlamentar a que agora renuncia para renascer em quinze dias. Seu direito à renúncia estaria lastreado em disposições regimentais aprovadas em causa própria pelo Parlamento que, não faz muito tempo, viu outros três próceres seguirem a mesma estrada: o senador e ex-presidente do Senado Antônio Carlos Magalhães, o também senador e também ex-presidente do Senado Jader Barbalho e o líder do governo José Roberto Arruda.
Por mais que se invoque o exemplo para justificar comportamento semelhante a Landim, as situações são diferentes. Os três que o precederam na vergonhosa renúncia o fizeram para, depois, submeter-se ao crivo das urnas. Obtiveram sucesso e, como o processo de cassação do mandato contra eles fora arquivado, voltam triunfantes, embora pelo menos Barbalho esteja ainda respondendo a processos na área criminal e, conseqüentemente, também entra na fétida canoa do fórum privilegiado.
O caso de Landim é ainda mais gritante. Renuncia já tendo à mão outro mandato e, mesmo assim, o Parlamento prodigamente (ou cinicamente) arquiva a possibilidade de cassação de seu mandato, sabendo que ele volta já, sem mesmo interromper a emissão do contracheque mensal. “Renuncio como recurso derradeiro e para não atirar-me nas chamas, embora vivencie um verdadeiro calvário”, teria dito ele momentos antes de valer-se do recurso dos covardes. O calvário referido é nosso, já que temos que aturar tanta desfaçatez.
O episódio merece análise mais funda que a de um breve artigo como este. Não para entrar no mérito das acusações que pesam sobre o parlamentar, embora as investigações apontem com muita clareza para a possibilidade de seu envolvimento com o crime organizado. Mas, sim, para evidenciar, uma vez mais, o quanto é funesto para a nação o instituto do fórum privilegiado, assim como esse malformado recurso da renúncia, através do qual eventuais facínoras podem preservar seus mandatos.
Acusações “graves e muito fortes”, como as descreve o líder do PT na Câmara, deputado Nelson Pellegrino, principalmente se fora do âmbito das prerrogativas parlamentares, deveriam conduzir o Parlamento para caminho diametralmente oposto a esse da aceitação da renúncia para salvar a pele do acusado. Deveriam motivar o afastamento do indigitado representante do povo até que ele provasse estar isento de culpa para fazer jus à função que insiste ocupar a qualquer custo.