A Constituição Federal, promulgada pela Assembléia Nacional Constituinte em 5 de outubro de 1988, está completando 20 anos de vigência, fato esse que, por si só, já é digno de muita comemoração, uma vez que consiste no maior período democrático do País desde a Carta de 1946.
Deveras, a atual Lei Fundamental constitui um marco basilar na consolidação do processo de redemocratização nacional, porquanto efetivamente rompeu o ciclo do regime militar que até então vigorava. Com a sua promulgação, pois, deixou de viger a Carta de 1967, com redação dada pela Emenda n.º 1, que foi imposta em 1969 por uma Junta Militar.
Por outro lado, é bem verdade que, passadas duas décadas da sua promulgação, depois de ter sido modificada por pouco mais de meia centena de emendas, o texto original Constituição mais ADCT foi acrescido de 30 artigos, o que, à primeira vista, parece não ser expressivo. Todavia, ditas alterações, além de terem sido substanciais, implicaram num razoável aumento de incisos e alíneas no Texto Constitucional.
Quanto à referida profusão de emendas à Constituição, fácil é de se inferir que ela aconteceu em decorrência do quorum para a respectiva aprovação ser de apenas três quintos de ambas as casas legislativas do Congresso Nacional. O mencionado quorum, há que se convir, não é de difícil obtenção.
Além do mais, contribuindo para a mencionada profusão, percebe-se uma necessidade de cada governo deixar timbrada a sua marca nessa especial sede. Esses fatos, pois, somados à natureza analítica da atual “Lex Legum”, acabaram gerando um texto constitucional bastante volumoso.
Pois bem, a Carta de 1988, ou seja, a “Constituição Cidadã” do saudoso deputado Ulisses Guimarães, que nela via um formidável instrumento para a recuperação como cidadãos de milhões de brasileiros, vítimas da pior discriminação constituída pela miséria, realmente trouxe grandes avanços para o nosso sistema jurídico.
Nesse passo, impossível é olvidar dentre esses avanços a minuciosa disciplina dos direitos fundamentais, tanto individuais, como sociais, uma vez que, além de restarem induvidosamente reconhecidos, também foram disponibilizados valiosos meios para as respectivas garantias, tais como os tradicionais remédios constitucionais, bem assim outros como o mandato de segurança coletivo, o mandado de injunção e a ação de inconstitucionalidade por omissão.
A soberania popular também foi alvo de especial atenção, pois, além do sufrágio universal pelo voto direto e secreto, também restaram viabilizados o plebiscito, o referendo e a iniciativa popular. Quanto à organização do Estado, digna de nota foi a elevação dos Municípios à condição de ente federado, ladeando Estados e União.
Demais disso, quanto aos poderes estatais, não há como deixar de ressaltar a especial disciplina emprestada ao Poder Judiciário, que restou bastante fortalecido, tal qual órgãos como o Ministério Público e os Tribunais de Contas.
Por fim, possível é ainda de se citar o título que trata da Ordem Social, uma vez que contemplou matérias de subida importância como seguridade social (saúde, previdência e assistência social), educação, meio ambiente, família, criança, adolescente e idoso.
Com efeito, apesar da Carta Magna de 1988 conter inúmeras previsões não materialmente constitucionais, além de outros aspectos não positivos, certo é que, por outro lado e como já entrevisto, alberga ela múltiplos avanços, dentre os quais claramente se evidencia a especial busca da dignidade dos indivíduos.
Demais disso, reforçando esse precioso princípio, tem-se ainda a instituição entre nós do Estado Democrático de Direito, o qual, sem dúvida, também se consubstancia numa importantíssima salvaguarda dos indivíduos em relação ao Estado. Somente isso já torna a atual ordem constitucional muito melhor que a antecessora instalada pelo regime militar.
Logo, mesmo se desconsiderando os inegáveis avanços proporcionados pela Lei Fundamental de 1988 à sociedade brasileira, apenas por ter inaugurado uma nova ordem bastante distinta da anterior, já são os seus vinte anos de existência merecedores de muita comemoração.
Vitor Rolf Laubé é procurador-geral do município de São Bernardo do Campo e pós-graduado em Direito pela PUC-SP.