A população em geral acredita que o direito penal atinja somente um grupo específico de pessoas; no imaginário geral, os pobres. Mas isso, não é verdade, quando se constata um número cada vez maior de membros da classe média participando de crimes.
No entanto, o objetivo deste artigo não é discutir esse tipo de criminalidade crescente, mas mostrar que todas as pessoas estão sujeitas a cometer um crime. Todo estudante de direito já ouviu em uma aula de direito penal que atropelar uma pessoa é algo que pode acontecer com qualquer um que esteja dirigindo um carro. Logo, todos podem ser processados e julgados por tal conduta e assim se submeterem à tutela do direito penal.
Dois crimes correlatos são praticados todos os dias por pessoas de boa índole, mas que à luz do código penal são criminosas, já que cometem fatos típicos, antijurídicos e culpáveis, ou seja, crimes.
O primeiro destes crimes é a pirataria, que pode ser de um disco, um programa de computador, entre outras. O artigo 184, § 1.º do Código Penal prevê que:
Violar direito autoral:
Pena- detenção, de três meses a um ano, ou multa.
§ 1.º: Se a violação consistir em reprodução, por qualquer meio, com intuito de lucro, de obra intelectual, no todo ou em parte, sem autorização expressa do autor ou de quem o represente, ou consistir na reprodução de fonograma ou videofonograma, sem autorização do produtor ou de quem o represente.
Sendo assim, qualquer pessoa que tenha baixado uma música no computador não só para ele, mas para vizinhos e amigos, cobrando por isso, ou copiado aquele jogo que o amigo comprou é sujeito ativo deste crime. É imperioso que a conduta visse lucro.
O segundo crime é a receptação, pois a simples conduta de comprar um CD pirata configura crime. Isso por força do artigo180, do código penal que assim dispõe:
Adquirir, receber, transportar, conduzir ou ocultar, em proveito próprio ou alheio, coisa que sabe ser produto de crime, ou influir para que terceiro, de boa-fé, a adquira, receba ou oculte:
Pena- reclusão, de um a quatro anos, e multa.
§ 3.º: Adquirir ou receber coisa que, por sua natureza ou pela desproporção entre o valor e o preço, ou pela condição de quem oferece, deve presumir-se obtida por meio criminoso.
Pena- detenção, de um mês a um ano, ou multa, ou ambas as penas.
Segundo Delmanto é necessário que seja produto de crime e não de contravenção penal.
A Jurisprudência tem firmado que: “A aquisição de pequena quantidade de relógios em ambulantes, mesmo que violando o tipo penal, não está a merecer sanção aplicada, por ser desproporcional à gravidade do crime. A insignificância do dano e o caráter subsidiário do Direito Penal determinam a absolvição. (TRF da 2.ª R. AP 1.166-RJ, DJU 12/11/1996, in Código Penal Comentado, Celso Delmanto entre outros)”.
Apesar de ser crime a compra de um CD pirata ou outros produtos em um “camelô” isso não levará ninguém à prisão, como já visto, já que no direito penal há o princípio da insignificância ou da bagatela, uma excludente de ilicitude que: “não permite que o delegado instaure inquérito policial, o promotor de justiça ofereça denúncia, o juiz a receba ou, após a instrução, condene o réu”.
A bagatela se caracteriza segundo GOMES, citado por MIRABETE, quando uma conduta tem as características: a) escassa reprovabilidade; b) ofensa a bem jurídico de menor relevância; c) habitualidade, d) maior incidência nos crimes contra o patrimônio e no trânsito.
Não poderia ser diferente, uma vez que movimentar todo o Poder Judiciário, já abarrotado, para punir alguém que comete uma conduta que pela lei é crime, mas é aceitável e justificável pela sociedade, não beneficiaria ninguém.
A sociedade justifica tal prática pela constatação de que o produto original seja ele qual for, custa em média três a cinco vezes mais que o pirata, isso em CD, perfumes, camisetas, mas na falsificação de um relógio Rolex, por exemplo, o preço do pirata é irrisório perto do preço do original. E não há como dizer que quem compra o pirata está prejudicando a empresa fabricante do original, já que aquele nunca teria condições financeiras de comprar o original.
Logo antes de julgar uma pessoa acusada de cometer um crime pense se você também não poderia ser acusado, processado e julgado por algo que faz corriqueiramente. Talvez assim sejamos mais cuidadosos com o julgamento que fazemos das pessoas.
Pesquisa: 1- MIRABETE, J. F. Manual de direito penal. 18.ª ed. São Paulo: Atlas, 2002. p. 118.
DELMANTO, C. Código penal comentado. 6.ª ed. atual e ampli. Rio de Janeiro: Renovar, 2002.
Leis números: 9.609/1998- propriedade de software, 9.610/1998- propriedade autoral e 9275/61- propriedade industrial.
Priscilla Gabrielle Manfredini da Rosaé
acadêmica da Faculdade de Direito de Curitiba.