ONU quer juro e câmbio no Brasil a favor do crescimento

Os níveis de taxa de juros estabelecidos por um governo e o regime de câmbio escolhido devem estar dentro de um plano para garantir o desenvolvimento do país, a geração de emprego e o aumento das exportações, e não apenas para manter controlada a inflação ou as reservas nacionais. Essa é uma das principais mensagens do relatório da Conferência da ONU para o Desenvolvimento e Comércio (Unctad), que faz um duro ataque ao Consenso de Washington – termo criado pelo economista John Williamson em 1989 que resumia o receituário neoliberal para os países emergentes na década de 90.

Divulgado na última quinta-feira (31), mesmo dia em que saiu o número desfavorável do PIB brasileiro no segundo trimestre (crescimento de apenas 0,5% sobre o anterior), o relatório também faz um alerta para a escolha macroeconômica do Brasil e pede que o Banco Central trabalhe com o governo para o País crescer.

Apesar de não ser destinado a questionar a política econômica brasileira, põe em dúvida duas estratégias que, até o momento, têm sido bases da política macroeconômica do governo: o câmbio flexível e o uso de altas de juros para garantir a estabilidade de preços.

Segundo os economistas da agência da ONU, a política cambial precisa ser flexível o suficiente para auxiliar na "estratégia de desenvolvimento" de uma economia. Por isso, a entidade prega um regime cambial que não seja nem fixo nem totalmente flutuante.

"Precisamos de um regime intermediário. Para alguns países, será necessária uma intervenção (no câmbio)", disse o tailandês Supachai Panitchpakdi, secretário-geral da Unctad e ex-diretor da Organização Mundial do Comércio (OMC).

Na avaliação de Supachai, essa intervenção pode ser importante para garantir que a política cambial seja um instrumento para ajudar na competitividade dos exportadores. No caso do Brasil, a valorização do real tem sido motivo de debate e setores exportadores, como o de calçados, insistem na necessidade de intervenção no câmbio.

Segundo o economista-chefe da Unctad, Reiner Flasbeck, o Brasil pode enfrentar sérios problemas nas exportações quando os preços das commodities caírem. As cotações elevadas dos últimos anos teriam escondido a valorização do real.

Outro ponto de destaque no relatório é o debate sobre a estabilidade de preços. A Unctad sugere que políticas monetárias e a taxa de juros são importantes para controlar a inflação, mas diz que existem outros meios para obter o mesmo resultado sem prejudicar a capacidade de investimento do País. Para a agência, uma menor taxa de juros pode ajudar a promover o crescimento de uma economia.

Segundo a Unctad, o exemplo na América Latina a ser seguido é a Argentina, que teria conseguido estabilizar a economia, mas sem taxas de juros altas. "O que o Brasil faz é problemático, pois atrai capital de curto prazo e gera valorização no câmbio. Por isso, o Brasil é mais frágil hoje que a Argentina, que parece ter crescimento mais sustentável", alerta Flasbeck.

A Unctad, porém, garante que isso não significa o fim da necessidade de independência dos bancos centrais. "Um banco central tem de trabalhar com governo e ajudar a promover objetivos como a geração de empregos, exportações e formação de capital", diz Supachai. Ele lembra o status do Federal Reserve (o BC americano). "O Fed é independente, mas quando fixa suas metas tem em conta não só a inflação, mas a geração de emprego.

De acordo com o relatório, até tarifas de importação devem ser usadas por emergentes para promover o desenvolvimento de um setor, ainda que a OMC pregue o contrário.

Para a ONU, economias emergentes precisam usar os mais diversos instrumentos e políticas públicas para promover o desenvolvimento. O documento é considerado "uma reviravolta no Consenso de Washington", que desde os anos 90 defendia certos parâmetros para o controle de inflação e para evitar choques externos.

"Precisamos de mais intervenções, mais uso de tarifas e mais políticas públicas. Só assim se conseguirá atrair mais investimentos sintonizados com a estratégia de desenvolvimento", diz Supachai. Ele aponta o exemplo da China que só consegue crescer a taxas elevadas há tanto tempo porque se utilizou de um maior número de instrumentos e de políticas para atingir seus objetivos.

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