Os municípios brasileiros estão, em sua grande maioria, falidos. Discute-se até a mudança na lei para possibilitar que um município insolvente possa, de fato, declarar-se incapaz para ser anexado a outro, em situação melhor. Este é um problema que deveria preocupar a todos, principalmente os que foram eleitos para tratar dos interesses coletivos. Mas os cerca de 70 mil vereadores brasileiros, pelo visto, não estão nem aí para a crise e, dedicando-se a outro esporte, já estão ganhando o jogo-de-braço pelo aumento na participação orçamentária municipal, prenúncio de aumento salarial dos nobres edis na próxima virada de mandato.
Quem dá a notícia e faz o alerta é o presidente da Confederação Nacional dos Municípios, Paulo Ziulkoski, que é também prefeito do município de Adriana Pimentel, no Rio Grande do Sul. Se o trem da alegria dos vereadores não for brecado, ele calcula que a despesa extraordinária reivindicada poderá ultrapassar a casa de um bilhão e seiscentos mil reais por ano. Não é pouco. Significa que o gasto com os legislativos municipais pode duplicar e, em alguns casos, até triplicar.
As coisas acontecem no Planalto, de forma não muito transparente para o simples eleitor, aqui na planície preocupado com a sobrevivência de cada dia. Está andando em forma de emenda constitucional, já aprovada sem alarde pelo Senado da República e também pela Comissão de Constituição e Justiça da Câmara Federal. É a Proposta de Emenda Constitucional 547, que obriga os prefeitos a dividir com os vereadores até mesmo recursos vinculados constitucionalmente à saúde e à educação, que são transferidos pela União aos municípios.
Explicando melhor: os vereadores querem mudança na base de cálculo (entre 5 e 8%, dependendo do tamanho da cidade) dos repasses prevista no artigo 29 da Constituição, atualmente formada pela receita tributária própria e pelas transferências constitucionais. Pela emenda, os mesmos índices passariam a incidir sobre a receita corrente líquida dos municípios, que é mais ampla que a atual em pelo menos 27 bilhões de reais e que engloba recursos vinculados ao setor social, como educação (Fundo de Desenvolvimento do Ensino Fundamental – Fundef e merenda escolar), saúde (Sistema Único de Saúde – SUS) e outros. Uma cidade como Curitiba, por exemplo, passaria a gastar cerca de R$ 85,6 milhões de reais com seus vereadores, contra os cerca de R$ 36 milhões atuais – um aumento calculado em torno de 138%.
Mas esse rombo pode ser ainda maior se forem computadas outras verbas, como Segurança Pública. “A gravidade – diz Paulo Ziulkoski – é tirar dinheiro de uma área miserável para aumentar salário de vereador”, pois no frigir dos ovos é nisso que vai acabar. Ou no aumento das bancadas de vereadores, maioria já além do que prevê a lei. Para tentar neutralizar a pressão que em Brasília fazem os vereadores de gabinete em gabinete, o presidente da entidade que congrega os municípios ameaça com a possibilidade de simplesmente deixar de pagar o INSS sobre subsídio de prefeitos e vereadores. Emenda pior que o soneto, pois isso agravaria ainda mais as já combalidas contas da Previdência.
A média salarial paga aos vereadores é de mil e quinhentos reais por mês. Mas existem os que, mesmo em municípios pequenos, ganham 6, 8, 10 mil reais ou mais por um mês mal trabalhado. Há cidades em que o mais importante “emprego” é o de vereador – uma função nobre quando bem exercida, mas comumente figurativa e atrelada a interesses nem sempre comunitários. O aumento de vencimentos em causa própria, principalmente neste momento difícil da economia brasileira, é demonstração de falta de sensibilidade para com os sérios problemas do povo representado. Esperemos que na Câmara dos Deputados a emenda constitucional tenha melhor sorte que a obtida no Senado. Isto é, que seja rejeitada em consideração ao Brasil do Fome Zero.