O que mudou com a nova Lei de Tóxicos – Parte XIX – Da Liberdade Provisória

Para os crimes tipificados nos arts. 15, 16 e 17, da Lei 6.368/76, por serem considerados de pequeno potencial lesivo, aplicam-se as regras da Lei 9.099/95. Já com relação aos crimes capitulados nos arts. 12, 13 e 14 da mesma lei, haverá a prisão, por isso há necessidade de analisar a questão relacionada com a liberdade provisória.

Para estes crimes em comentário, de imediato deve-se excluir a hipótese de concessão de liberdade provisória com fiança, haja vista que, pelo quantum mínimo atribuído para cada delito (superior a dois anos), falta este requisito para concessão da benesse legal.

Já a liberdade provisória sem fiança poderá ser concedida quando ouvido o Ministério Público, e o juiz entender que não se encontram presentes os requisitos para a decretação da prisão preventiva, aplicando-se neste caso o disposto no art. 310, parágrafo único, do Código de Processo Penal.

Pelo disposto no art. 2.º, inc. II, da Lei 8.072/90, em tese, não é possível a concessão de liberdade provisória aos crimes de tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins. Observe-se que essa lei expressamente proíbe que o réu se veja processar solto através de liberdade provisória, somente nos casos de tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins. Assim, não se aplica esta restrição aos delitos previstos nos arts. 13 e 14, sendo por isso possível a concessão de liberdade provisória sem prestação de caução.

A nova Lei de Tóxicos não faz qualquer referência à concessão de liberdade provisória, seja com ou sem fiança, a não ser no art. 43, o qual proibia o apelo em liberdade, sendo, entretanto, vetado pelo presidente da República.

Essa omissão da nova Lei de Tóxicos implica em duas interpretações.

Primeira, incide integralmente a vedação contida na Lei dos Crimes Hediondos, sendo por isso vedada a concessão de todo tipo de liberdade provisória para os crimes de tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins.

Segunda, considerando que a nova Lei de Tóxicos não cuidou dessa matéria, não seria aplicável a Lei dos Crimes Hediondos, mas sim a regra geral, que é o Código de Processo Penal, cuja norma não veda a concessão de liberdade provisória.

Essa interpretação pode ser embasada no argumento de que na oportunidade em que lei especial entra em vigor, somente as leis de regra geral, como por exemplo o Código Penal, Processo Penal, teriam regência sobre as matérias pertinentes à norma especial, e não outras legislações que cuidavam dessa mesma matéria. Especialmente em relação a direitos e garantias individuais consagrados na nossa Constituição Federal, cujo direito à liberdade é a regra, sendo exceção a mantença do acusado na prisão para responder o processo. Por isso, leis esparsas que cuidavam de matéria regulada por lei especial perdem a sua eficácia com a entrada em vigor de lei tratando dessa matéria, ficando os casos omissos a cargo da norma geral.

Não tem qualquer sentido fazer incidir sobre norma especial mais nova previsão legal de outras leis com vigência anterior e que não possuem caráter geral.

Portanto, sempre que uma lei especial entra em vigor, e sobre as matérias nela não tratadas, incidem as normas de caráter geral, e não legislações esparsas que as regulavam. Do contrário criaria insegurança jurídica, especialmente na interpretação das normas, por não se saber qual lei aplicar.

Essa linha de raciocínio pode ser combatida através do argumento de que a Lei dos Crimes Hediondos também é especial, porque regula matérias relacionadas com essa modalidade de crime ou a ele equiparados, como ocorre com os delitos de tráfico ilícito de substância entorpecente e drogas afins. Por isso, a lei especial que cuidou dos crimes de tóxicos, apesar de ser posterior, não teria qualquer relevância quanto a incidência da Lei dos Crimes Hediondos, face cuidar-se também de norma especial.

Jorge Vicente Silva

é pós-graduado em Pedagogia a nível superior, pela PUC/PR e especialista em Direito Processual Penal, também pela PUC-PR, e autor de diversos artigos e livros, inclusive já na 2.ª edição o livro “Tóxicos” – Manual Prático – Respostas às dúvidas surgidas com a Lei n.º 10.409/02″.

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