Até agora, o governo federal perdeu todas as batalhas do “Waldogate”. Prepara-se, conforme se anuncia em Brasília, para não perder a guerra. Provavelmente, para o bem geral da nação, não perderá. Mas o que mais intriga não são as dúvidas jurídicas acerca da constitucionalidade ou não da medida provisória que tentou proibir o jogo às vésperas do Carnaval, nem o cenário policialesco montado para o seu cumprimento de norte a sul, mas, sim, o que de fato será feito para esclarecer as denúncias – e punir exemplarmente os culpados – que envolvem diretamente pelo menos um graduado funcionário do Executivo nas artes do achaque e da arrecadação subterrânea de fundos de campanha.
Ninguém acredita – repita-se à exaustão – que Waldomiro Diniz, um homem que gozava da total confiança do ministro-chefe da Casa Civil, José Dirceu, a ponto de com ele ter morado durante algum tempo, tenha agido sozinho. A traição por Dirceu referida, admitindo-se que fala a verdade, deve se situar noutros detalhes do imbróglio ora revelado por uma casualidade do destino. Não na essência das múltiplas e intrincadas “missões” a Waldomiro confiadas. “Se existem inquilinos do Palácio do Planalto cujas ações independem das ordens e escapam à vigilância da chefia, então a coisa é mais grave do que se imagina”, escreveu na edição de Quarta-feira de Cinzas do jornal O Estado de S.Paulo o jornalista José Nêumanne.
De fato, é aconselhável – como recomendou o mesmo articulista – que José Genoino, Aloizio Mercadante, Arlindo Chinaglia, João Paulo Cunha e Ideli Salvatti, e todos os demais destacados homens da linha de frente da estrutura de poder atual, “parem de falar e agir como se o protagonista do escândalo ?Waldogate? fosse um incômodo ?estranho no ninho?, anômalo na estrutura de poder da república petista”. Isso ofende a mediana inteligência de todos. Se a nação não chegou ainda a exigir a cabeça de José Dirceu e mais, é talvez porque, como disse o governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, “cabe ao presidente avaliar o que deve ser feito no governo”. Arcando, naturalmente, com todas as suas conseqüências.
De nossa parte gostaríamos que não houvesse essa tergiversação que vem sendo meticulosamente ensaiada no Planalto para atirar outra vez para debaixo dos tapetes tanta sujeira. O governo do PT prometia ser diferente. Ficará igual, ou pior, se seguir andando pelos caminhos começados. Não é o jogo do bingo, ou qualquer outro jogo até aqui permitido e até incentivado que é inconstitucional, mas, sim, o crime cometido. E a pactuação com ele.
Eis, pois, o que precisa ser feito: prestar contas à nação de tudo o que de certo ou errado aconteceu por trás desse imenso biombo chamado Waldomiro Diniz. Apenas acabar com o jogo é o mesmo que tirar o sofá da sala, como já referimos aqui, na lembrança do episódio de um hipotético marido traído pela mulher adúltera. Um Dirceu assim traído deve também ter muito que contar.
Espera-se que com o passar das festas momescas e com o término do recesso branco imposto pelo “amigo” presidente do Senado, José Sarney, o Congresso Nacional assuma seu papel que é, além daquele legislativo, o de fiscal da coisa pública. Isso precisa ser feito agora e não depois, durante alguma nova campanha política, a proveito de candidatos oportunistas que se elegem construindo a dúvida sobre os outros. Trata-se de medida saneadora que envolve o governo das esperanças.
Dizem que o presidente Lula não teria peça de reposição no caso do afastamento mesmo que temporário de José Dirceu. Ninguém é insubstituível. É uma estratégia que pode se revelar outra vez errada, pois o desgaste pode ser fatal. A menos que Lula assim prefira, já incomodado pelo excesso de poder concentrado nas mãos de alguém que não esconde o projeto de lhe suceder…
