A corrupção no Brasil é tanta que caminha pelas próprias pernas. Absurdamente, aceita-se como um mal menor as administrações que roubam e os políticos corruptos, desde que, como no ditado italiano, vivam e deixem viver. Se ladrão que rouba ladrão merece cem anos de perdão, caminhamos para uma anistia geral. E, não obstante o estouro de tantos escândalos em tempos recentes, com o fim da ética na política e as negociatas sendo produzidas por atacado, parece que boa parte do eleitorado, numa posição fatalista, está aceitando fazer parte desse jogo, considerando-o prática consagrada e inevitável.
Mas as coisas não são ou não deveriam ser bem assim. Embora haja imperdoável condescendência, a corrupção tem um custo e esse custo tem para os cidadãos, mesmo os que se conformaram com a situação geral de descalabro, um preço cada vez mais impagável.
O economista da Fundação Getúlio Vargas Marcos Fernandes tenta quantificar os prejuízos que o atual gigantesco esquema de corrupção causa à nossa economia. Para ele, o dinheiro perdido anualmente pelo Brasil com as irregularidades corresponde a 0,5% do Produto Interno Bruno (PIB), algo em torno de R$ 2 trilhões. Esquemas de corrupção como o da máfia dos sanguessugas, envolvendo fraudes com ambulâncias superfaturadas compradas com dinheiro de emendas orçamentárias de autoria de parlamentares, geram prejuízo anual de quase R$ 10 bilhões.
A estimativa é de que a corrupção por atacado equivale quase à metade do total previsto no orçamento federal para investimentos neste ano, R$ 24,5 bilhões. Esta quantia embolsada pelos corruptos, mercê de sua generalização e de um expresso ou tácito perdão da sociedade, pagaria, por exemplo, a construção de mais de meio milhão de casas populares, atendendo aproximadamente dois milhões de brasileiros.
Onde estaria o epicentro desse terremoto que causa um verdadeiro tsunami de corrupção? Para estudiosos como Roberto Piscitelli, professor de economia na Universidade de Brasília, na esfera federal o que faz a corrupção tanto crescer é a maneira como é fabricado o Orçamento Geral da União, dando ao Executivo direitos quase que absolutos. Sendo autorizativo e não de mandamentos obrigatórios, o orçamento dá prerrogativas quase totais ao governo, abrindo espaço para o jogo político e as barganhas eleitorais.
Há pouca participação da sociedade no planejamento de gastos do governo e faltam metas definidas. Não se sabe onde, exatamente, o dinheiro do povo é ou deve ser gasto. E os que o manipulam aproveitam para reservar uma boa parte para os próprios bolsos ou para pagar interesses escusos seus ou de seus grupos, cabos eleitorais, partidos, aliados ou financiadores.
Se não houver um estancamento desse processo, com reeleição ou não, o que teremos será a consecução de um anunciado objetivo: o Brasil caminhar pelas próprias pernas. Só que não para o progresso, e sim para um buraco negro onde todo o poder do povo será entregue aos fora-da-lei.