O Poder Judiciário tem milhares de servidores no foro judicial. Outro tanto no chamado foro extrajudicial, que compreende tabelionatos e atividades afins, como Cartório de Registro Civil e de Imóveis. Na semana passada esta coluna foi dedicada aos que exercem cargos de direção na área judicial e administrativa do Poder Judiciário. Nesta semana o tema será os que atuam nos cartório ou secretarias judiciais, sem poder de mando.
A tarefa não é fácil. Os servidores do Judiciário não constituem um grupo uniforme. Ao contrário de outras instituições (v.g., Polícia Militar), eles possuem situação diversa, conforme a Justiça ou o local. Todavia, atualmente estão unidos nas reivindicações por meio de Sindicatos e até de Federações (v.g., Fenajud).[1] E assim deve ser. Reivindicações coletivas, impessoais, equilibradas e responsáveis. Isto retrata maturidade nas relações de trabalho.
O maior contingente de servidores é da Justiça Estadual. Cada estado tem o seu Código de Organização Judiciária, que estabelece os cargos, nomes, natureza e atribuições. Como os Tribunais de Justiça são os descendentes dos antigos Tribunais da Relação, regra geral, seguem o mesmo modelo. Por isso a maioria dos cargos possui a antiga denominação, como o secretário no tribunal e escreventes na primeira instância.[2] Evidentemente, há sensíveis diferenças entre eles, muito embora todo o funcionalismo se sujeite aos princípios dos artigos 37 a 41 da Constituição. Por exemplo: em alguns estados o cargo de oficial de Justiça exige diploma de curso superior, em outros não. Mais significativo é o fato de que em muitos ainda existem cartórios particulares, ou seja, o escrivão contrata os funcionários e paga seus salários. Nos cartórios públicos o ingresso é por concurso, exceto para os cargos de confiança, que devem ser a exceção e em percentual limitado.
Na Justiça da União (Federal, Eleitoral, Militar e do Trabalho) não existem cartórios particulares. Os servidores ingressam por concurso público e são poucos os cargos em comissão. O trabalho é exercido na secretaria, mas alguns assessoram os juízes no gabinete. Usa-se denominação diferente, como por exemplo de analista judiciário, para cargo que exige diploma superior.
Os vencimentos da Justiça da União costumam ser mais elevados do que na Justiça dos estados. O site da Justiça Federal do Paraná fornece a média de vencimentos dos juízes federais e dos servidores. Um técnico judiciário (cargo de nível médio) recebe em média R$ 8.149,03.[3] Ainda que muito diferentes as situações dos servidores do Judiciário, uns recebendo bem e trabalhando em locais bem estruturados e outros atuando em comarcas distantes ou sem recursos, é possível traçar algumas linhas comuns de procedimento que se aproximem do ideal.
A primeira delas é que o servidor deve ser reconhecido e tratado como uma peça essencial ao sucesso da unidade judiciária. Com efeito, de nada adiantará um juiz brilhante, proferindo as mais brilhantes decisões, se na secretaria não houver gente qualificada e disposta a dar execução ao que foi deliberado.
A motivação de um servidor passa por dois fatores: remuneração adequada e reconhecimento. Os vencimentos devem ser dignos, correspondentes à importância do cargo. E o reconhecimento deve ser sempre externado diretamente por quem dele está próximo (diretor ou juiz), ou indiretamente pelo tribunal, através de providências administrativas (v.g., cursos de capacitação).
O servidor deve sonhar, mas nunca transformar uma decepção (v.g. o desejo de ocupar função gratificada) em fonte de ódio e de reclamações permanentes. Se assim proceder, acabará cada vez mais longe do cargo almejado e mais longe também de seus colegas.
O inconformismo com alguma situação deve ser exteriorizado. Porém, com educação e respeito. Atualmente não é raro ver explosões de fúria retratadas em representações. O resultado é que a pretensão é vista com má vontade e raramente alcança seus objetivos. É dizer, a defesa de direitos não tem como requisito ofender a quem quer que seja. Isso só gera sofrimento a todos os envolvidos. Inclusive ao que representa.
Neste particular, é preciso ter noção da realidade. O mundo (não o Judiciário) não é local de santos. Injustiças existem, fazem parte da vida. Não se pode, à primeira decepção, reagir com violência ou entrar em depressão. O certo é analisar friamente o ocorrido, ver se algum erro foi cometido, evitar sair anunciando a todos própria desgraça e no dia seguinte recomeçar com força redobrada e equilíbrio emocional.
A criação de cargos públicos criou uma situação nova: os aprovados no concurso nem sempre são do local. Meses depois, querem retornar à origem. Isto desfalca a Vara e prejudica a população. Ao assumir, o servidor deve pesar as consequências de seu ato e não procurar resolver o problema a que deu causa através de pedido político ou ação semelhante.
Atualizar-se é sempre um desafio. O ideal é que os tribunais cuidem disto, possibilitem aos servidores acesso a cursos, presenciais ou não. Mas quem quer mais, ambiciona ascender a cargos mais elevados, dentro ou fora da carreira, não aguarda o impulso oficial. Vai por sua conta e risco atrás de cursos, seminários ou congressos. Claro que isso representa investimento e nem sempre é possível a um servidor mal remunerado. O que se está a dizer é que tente capacitar-se dentro da sua realidade econômica.
O relacionamento humano é fundamental para a própria felicidade e para a carreira. Com os colegas, cordialidade e discrição. Relações muito próximas, quando rompidas, geram ressentimento. Futricas podem gerar inimizades eternas. Reclamações diárias ocasionam afastamentos pois, afinal, todos já têm preocupações suficientes. Com o público externo, principalmente no balcão, onde há, por vezes, pessoas agressivas e ignorantes, uma resposta malcriada em nada contribuirá para melhorar as coisas. Respirar dez vezes antes de dizer “poucas e boas” pode evitar aborrecimentos.
Há servidores que não gostam do que fazem. Estão no lugar errado. É preciso ter a coragem de deixar a estabilidade do serviço público e procurar outro destino. Por outro lado, há aqueles que amam sua atividade e, em que pesem as dificuldades, procuram fazer o melhor. Mais cedo ou mais tarde serão reconhecidos.
Em suma, os servidores do Judiciário, pelo que fazem e representam, devem valorizar-se e ser valorizados.
Notas:
[1] (http://www.fenajud.org.br/
[2] Vianna Gabriel, Organização e distribuição da Justiça no Brasil, Rio de Janeiro, Supremo Tribunal Federal, pgs. 56 e 204, 1923.
[3] http://www.jfpr.jus.br/transparencia/salario_medio.php

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Vladimir Passos de Freitas é desembargador federal aposentado, professor doutor de Direito Ambiental da PUC-PR e assessor-chefe da Corregedoria Nacional de Justiça.

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