O papel da fome

Um dos programas sociais em que o governo federal mais se empenha é o Fome Zero. Há até um ministério denominado Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome. No apêndice do extenso nome dessa pasta evidencia-se a importância que o governo dá ao programa, que mereceu propaganda até internacional e aplausos vindos dos mais longínquos recantos do planeta. Afinal, surgira um governo num país que se diz em desenvolvimento, mas, considerando a miséria em que vivem 40% de seus cidadãos, é de fato subdesenvolvido, uma administração sensível ao problema da fome e disposta a acabar com ela, antes que ela acabe com suas vítimas. E com coragem suficiente para liderar programas em que os países desenvolvidos se mobilizem para, em alguns anos, não mais existir fome no mundo. Utopia talvez, mas uma idéia para aprovar genuflexos.

Os países desenvolvidos disseram sim e não fizeram nada. Mas no Brasil alguma coisa está sendo feita. Insuficiente, com certeza, e bem menos do que sonhava Lula. O programa vem beneficiando alguns milhares de carentes e, é preciso reconhecer, sendo objeto da sanha de políticos e funcionários malandros, que, sem serem carentes, senão de vergonha na cara, entraram nessa como se fosse uma ?nova boquinha?. Já foram descobertas esposas, filhas e até prefeitos que se deram os parcos óbulos do Fome Zero.

Mas, entre críticas sempre proveitosas, não dá para deixar de aplaudir um programa como esse, apesar das fraudes e erros cometidos em sua execução. E o fato de ainda haver mais esfomeados fora que dentro do Fome Zero.

O governo precisa fazer uma séria e competente escala de prioridades, pois o dinheiro sempre será escasso diante da imensidão de necessidades do povo brasileiro. Isso, apesar dos recordes de arrecadação e a política de ?mão de vaca? que chegou a deixar à míngua vários programas governamentais e mesmo ministérios. Os recursos públicos não chegam para tudo e sempre haverá um programa que deve ter prioridade. É o caso do Fome Zero, pelo menos para este governo de esquerda e voltado aos problemas sociais.

Pois acaba de surgir mais um caso de falta de senso de prioridades e este é simplesmente abismante, se não também escandaloso. Descobriu-se que o governo federal gasta em fotocópias (xerox) mais que nos programas do Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome, aquele que toca o Fome Zero. Não é por nada que os catadores de papel de Brasília dão preferência à zona do governo, a Esplanada dos Ministérios, em cujo final (ou princípio) estão os poderes Executivo, Legislativo e Judiciário, com seus respectivos palácios. A metade das oitenta mil toneladas de papel catados por mês em Brasília vem desse reduto de ?excelências?.

No primeiro ano deste governo, os gastos com xerox chegaram a R$ 102,2 milhões. Nos anos seguintes ocorreram reduções, porém pequenas. O Sistema de Integração e Administração Financeira da União (Siafi), ou seja, o próprio governo, revela que em 2005 foram gastos R$ 88,6 milhões com fotocópias. Todos os investimentos realizados, no mesmo período, pelo Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome, somaram R$ 87,4 milhões. Pode-se dizer que uma administração assim é um ?papelão? e ainda ecologicamente incorreta. 

Grupos de WhatsApp da Tribuna
Receba Notícias no seu WhatsApp!
Receba as notícias do seu bairro e do seu time pelo WhatsApp.
Participe dos Grupos da Tribuna
Voltar ao topo