Quando, usando disposição legal, o governo FHC sustou repasses de recursos a determinados estados, por não pagarem a rolagem de suas dívidas assumidas pela União, houve pretextos, protestos, ações judiciais e até moratória. Os dois casos mais conhecidos e rumorosos foram de Itamar Franco, de Minas Gerais, e Olívio Dutra, do Rio Grande do Sul. O primeiro, hoje sem partido, mas na época de algum dos muitos partidos pelos quais já passou e o segundo do PT, agremiação que ainda integra e pela qual hoje é ministro de Lula, se não sem pasta, pelo menos dos sem-casa. Um prêmio de consolação para quem perdeu a eleição no Rio Grande do Sul.
Dutra, governando o Rio Grande do Sul, esbravejou contra o governo, falou em a União estar explorando os estados e foi à Justiça, em ações sem sucesso.
Mais barulhento foi Itamar Franco, que apoiou Lula. Disse que não pagava e decretou uma moratória mineira, suspendendo os pagamentos do estado que governava, como uma forma de forçar o Ministério da Fazenda, então nas mãos de Malan, a liberar recursos.
Como se sabe, tudo se prende à rolagem das dívidas dos Estados. Os estados se endividaram acima de sua capacidade de pagar, inclusive e principalmente no exterior, e na hora do aperto, correram para Brasília, pedindo dinheiro. O governo federal sucessivas vezes assumiu essas dívidas, passando a ser o seu principal pagador. Dos estados, ficou credor das importâncias adiantadas, a juros ínfimos de 6% ao ano, uma espécie de negócio de pai para filho. Mesmo assim, foi acusado de extorsão.
Como se tratava de um pleito em que praticamente todos os estados eram interessados e o governo FHC não estava, em termos de prestígio político, em seus melhores dias, na opinião pública tudo transcorreu como sendo Brasília o algoz e os estados, vítimas. Itamar chegou a ameaçar uma ridícula guerra, pondo de prontidão a Polícia Militar mineira, como se a tiros de mosquete fosse arrancar o dinheiro do Tesouro, a dilação de prazos ou amedrontar a União. De nada adiantou. O governo federal suspendeu os repasses aos estados devedores inadimplentes, para compensar o Tesouro Nacional do calote. Vale dizer, para defender o dinheiro dos contribuintes contra a gastança desbragada e o calote descarado.
Agora a coisa se repete. No Rio, Rosinha Garotinho não pagou nem o 13.º salário do funcionalismo, quanto mais o que seu Estado deve à União presidida por Lula. Acusa Benedita, ministra do governo PT, enquanto os petistas vão encontrar a raiz da dívida no próprio governo Garotinho, marido de Rosinha. Acusada de deixar quase nada em caixa e muito em papagaios, Benedita deu de ombros.
No Rio Grande do Sul, o governante, agora Germano Rigotto, do PMDB, tomou uma posição mais conseqüente. Também não pagou no prazo, para poder honrar os compromissos com o funcionalismo. Mas valeu-se de uma cláusula contratual permissiva, que lhe dá até o dia 10 para saldar suas dívidas com a União.
O que é notável em tudo isso é que, no seu primeiro dia de governo, via Banco do Brasil, sem dó nem piedade e cumprindo a lei e também atendendo o interesse público, a administração Lula está fazendo o que fez o governo passado. Não pagou, não recebe! Suspendeu os repasses ao governo de Rosinha Garotinho dentro da lei e certo de que, ao contrário da polícia de Itamar, a carioca não vai ensaiar uma quartelada ou revolução. Ou porque está ocupada na briga com os traficantes ou porque seus oficiais ficaram, de repente, surdos.