O MP e as investigações

Estamos diante de sério problema jurídico-institucional. O Supremo Tribunal Federal está julgando uma ação em que a defesa alega a imprestabilidade das provas recolhidas pelo Ministério Público contra o réu. E dois ministros já acolheram a tese da defesa: a incompetência legal do Ministério Público para proceder à investigação de que resultou a ação. Diz-se que outros têm a mesma opinião.

O fundamento contra o procedimento do MP é de que a Constituição da República não lhe dá a incumbência da investigação criminal.

Como, então, o Ministério Público, que tem a incumbência da defesa da ordem jurídica, procedeu e vem procedendo a investigações que motivaram a ação referida e as apurações em curso? Em que fundamento legal apoiou-se o Ministério Público para essa atuação?

Foi, certamente, no seu direito/dever de se informar para requisitar a instauração do inquérito policial – item VIII do art. 129 da Constituição, em consonância com o disposto no item I do art. 26, da Lei Orgânica Nacional do Ministério Público, Lei n.º 8.625, de 12/2/93, que autoriza o MP, no exercício de suas funções, instaurar “outras medidas”, e o item II do art. 5.º do Código de Processo Penal, para instruir a requisição de abertura de inquérito policial.

Se o º 1.º desse art. 5.º do Código de Processo Penal exige que o requerimento do ofendido para o início do inquérito policial deve conter, sempre que possível, “a narração do fato, com todas as circunstâncias; a individuação do indiciado; a nomeação das testemunhas, com indicação de sua profissão e residência”, a mesma exigência cabe para a requisição a ser feita pelo Ministério Público. E daí, para instruir a requisição de instauração de inquérito policial, o Ministério Público pratica os atos relacionados nas letras a, b e c, do item I do art. 26 da sua Lei Orgânica:

a) expedir notificações para colher depoimento ou esclarecimentos e, em caso de não-comparecimento injustificado, requisitar condução coercitiva, inclusive pela Polícia Civil ou Militar, ressalvadas as prerrogativas em lei;

b) requisitar informações, exames periciais e documentos de autoridades federais, estaduais e municipais, bem como dos órgãos e entidades da administração direta, indireta ou fundacional de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios;

c) promover inspeções e diligências junto às autoridades, órgãos e entidades a que se refere a alínea anterior.

Como sabem os juristas, o comando de uma norma geralmente não está em um só dispositivo; é preciso encontrá-lo na unidade da norma e no sistema de que ela faz parte. É o caso. As determinações legais do exercício das funções do Ministério Público não estão simplesmente na generalidade do art. 127 da Constituição; estendem-se pelos dispositivos citados.

Os resultados das investigações preliminares que o Ministério Público tem feito, com sua independência e motivação funcional, justificam seu bom trabalho, que está conforme a lei.

A prevalecer no Supremo Tribunal Federal o entendimento de que o Ministério Público não pode proceder a essas investigações, ter-se-á um dano jurídico-institucional extraordinário com efeito negativo, no presente e no futuro, para o combate às fraudes e à corrupção.

O ministro Nelson Jobim bem que poderia ter inserido mais um parágrafo em seu discurso de posse: “A sociedade deseja que o Ministério Público continue realizando o bom trabalho que vem fazendo”.

J. Ribamar G. Ferreira é advogado e professor aposentado da Universidade Federal do Paraná.

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