O inocente Renan

Atribui-se ao famoso político mineiro Benedito Valadares a máxima ?Aos amigos, tudo. Aos inimigos, a lei?. Parece que é assim que pensa o senador Epitácio Cafeteira, do PTB do Amapá, nomeado relator do caso Renan Calheiros na Comissão de Ética do Senado. Diz ele que foi tomado de surpresa com a escolha do seu nome. Chegou a Brasília com cara de quem nada sabia sobre o assunto e, dois ou três dias depois, decidiu que nada queria mesmo saber. E nada quer seja revelado aos demais membros da comissão. Evidentemente que seria prematuro considerar, desde logo, o presidente do Senado, Renan Calheiros, como culpado do crime de usar dinheiro de uma empreiteira para pagar pensão a uma filha havida com uma jornalista da capital federal. O deslize marital, pois Renan é casado, ele já admitiu. Foi mais longe e reconheceu a filha tão logo um exame de DNA não lhe deixou outra saída. Mas não se comportou mal, pois sempre pagou pensão à menina e à mãe. O problema é saber se o dinheiro saiu do bolso dele ou de uma empreiteira, pois se foi de uma empresa que tem negócios com o governo, a ajuda é ilegal, suspeita e compromete Renan eticamente, para não falar no fato de que deveria pôr em risco até o seu mandato. Isso, pelo menos teoricamente.

Como tem repetido incansavelmente o presidente Lula, e é regra do nosso Direito, ninguém é culpado até que assim se prove. No estado atual das coisas, Renan não é culpado, até que surja prova em contrário. Mas o que pretendeu o senador Cafeteira foi arquivar antecipadamente o processo, não iniciando a investigação contra Renan Calheiros e até rejeitando a auditiva da mãe de sua filha. Desejou considerar provada a inocência porque não há provas de culpabilidade e o meio que encontra para fazê-lo é não buscando tais provas. Seja em inquérito policial ou na Justiça, há o dever de quem preside os processos ouvir quem seja nos casos investigados referidos. A mãe da criança foi referida. Seu advogado e ela própria fazem declarações desmentindo pontos importantes da defesa já apresentada pelo presidente do Senado.

O PSOL já requereu que ela seja ouvida.

Mas o senador relator do caso achou que o melhor caminho foi ignorar tudo, pois se ninguém tiver a oportunidade de dizer no processo do Conselho de Ética o que sabe sobre o escândalo, entender-se-á que não foi produzida prova contra Renan Calheiros. Mas isso será inocentar alguém por antecipação, sem investigar, sem permitir provas que o incriminem. Será agir como ensinava Benedito Valadares: a Calheiros, que é amigo, tudo. Se fosse inimigo, então seria aplicada a lei.

Muita gente no Congresso, mesmo da oposição, vinha e vem torcendo por Renan Calheiros. Afinal de contas, trata-se do presidente do Senado, chefe do Congresso Nacional. Trata-se também de um político que, embora aliado de Lula e por isso em posição contrária aos oposicionistas, com estes mantém boas relações e não é difícil encontrar nos partidos oposicionistas quem por ele torça. Mas ele tem se comportado com certa majestade que não fica bem para quem está, ou deveria estar sendo investigado. Ficou na presidência do Senado, num trono, e não no banco dos réus e apareceu um seu amigo, o Cafeteira, lutando para engavetar o processo antes que se iniciasse.

Será o Benedito?

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