Em suas andanças pelo País à busca de votos para eleger-se presidente da República, o candidato Luiz Inácio Lula da Silva criou muitas esperanças num estilo próprio de dizer as coisas. O tucano José Serra também. Lula, por exemplo, diz que depois de ganhar a eleição vai estabelecer uma grande mesa de negociações e cuidar do Brasil como cuidaria de um filho. Menos paternal que o concorrente, Serra aposta na competência e na experiência sob as cores verde-amarelas. Embora as pesquisas não lhe ajudem como gostaria, aposta numa virada de última hora. A política é a arte de realizar o que às vezes parece impossível.

Sonhando com um provável governo, Lula elegeu (e fez divulgar) uma prioridade acima das demais: combater a fome. Com o dinheiro que tem para a área social, ele faz as contas e acha possível. O programa já tem até um nome: “Fome Zero”. Com barriga cheia, o cidadão pensa melhor, tem mais ânimo para realizar e encara as outras dificuldades com maior otimismo. Lula imagina em seu primeiro ano de mandato um grande banquete: café da manhã, almoço e jantar para 50 milhões de brasileiros. Não diz como será, mas garante que fará.

São promessas valentes. Em Londres, um deputado chamado Denis MacShane, ex-ativista do movimento sindical internacional e hoje alto funcionário do Departamento das Relações Externas do governo britânico, sentencia, nostálgico: depois de Fernando Henrique Cardoso, Lula “talvez seja a pessoa mais preparada para assumir a Presidência na história do Brasil. Ele tem capacidade de entender as aspirações das classes média e trabalhadora”. Nada contra o atual governo. Nem a derrota de Serra significaria uma rejeição das obras (algumas inacabadas) de FHC. Apenas isso: “O impacto positivo das reformas adotadas por Cardoso não teve tempo suficiente para ser sentido completamente”, diz o analista britânico. Ele esquece das que não foram permitidas pela oposição, que hoje promete fazê-las.

Aqui no Brasil, as preocupações de gente iluminada como o presidente da Comissão de Superação da Miséria e da Fome (órgão da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil-CNBB), dom Luciano Mendes de Almeida, vai além da fé nas promessas de palanque. Na quarta-feira, o prelado cobrou resposta política “sem partidarismos e ressentimentos” para esse projeto comum em defesa da vida e da dignidade. Mas admoestou, como convinha, que “ninguém resolve nada sozinho, muito menos num país de 170 milhões de habitantes”.

A idéia do banquete prometido por Lula, na verdade, não é dele. Nasceu na CNBB, em abril de 2002, com seu Mutirão para a Superação da Miséria e da Fome. Em julho último, foi reavivado em Brasília, quando várias entidades (entre elas o MST e a OAB) subscreveram uma declaração dirigida aos candidatos a postos eletivos e aos homens e às mulheres de todo o País reafirmando o “Direito Humano à Alimentação e à Nutrição, na sua universalidade e indivisibilidade”. Como se vê, Lula ou Serra têm documentos de sobra a inspirar-lhes obras sociais de vulto. Na questão do emprego, a diferença entre os dois se resume a apenas dois milhões. No grande banquete para 50 milhões, entretanto, não podem faltar garçons. Nem patrocinadores.

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