O presidente Luiz Inácio Lula da Silva vai colher muito mais do que uma previsível vitória nas votações finais das reformas tributária e da Previdência Social. Com a saída dos “radicais” do PT, Lula verá o surgimento de um partido substancialmente diverso da legenda que o ex-líder operário fundou e do qual é sua maior estrela. O Partido dos Trabalhadores que emergirá do embate das reformas guarda diferenças significativas em relação à legenda de orientação ideológica fortemente socialista fundada em 10 de fevereiro de 1980, no Colégio Sion, em São Paulo, durante a histórica reunião dos 101 representantes de 17 estados brasileiros que participavam do Movimento Pró-PT.

Maior e mais importante partido político do País, o PT possui um perfil cada vez mais próximo da orientação social-democrata das legendas que governam as principais nações européias. O partido tem pautado suas ações, ao menos no plano federal, baseado em princípios que seguem a lógica pragmática e racional das economias capitalistas de mercado. Não é outro o motivo pelo qual os chefes de Estado desses países têm festejado a orientação política que tem sido adotada por Luiz Inácio Lula da Silva na condução do governo brasileiro.

Essa orientação político-administativo-econômica tornou-se mais do que evidente durante as discussões sobre a reforma da Previdência, quando o Palácio do Planalto alegou razões de ordem essencialmente financeiro-contábil para justificar o projeto que enviou ao Congresso Nacional. Aliás, é justamente nesse ponto, a mudança de orientação política da cúpula do partido, que reside a maior diferença do PT que governa o País em relação ao partido de perfil notadamente marxista, revolucionário e basista característico dos sindicatos de trabalhadores, comunidades eclesiais de base, movimentos sociais e das minorias, associações de moradores, intelectuais e associações profissionais que fundaram o PT, há 23 anos.

Não que o PT tenha abandonado seu princípio fundamental de lutar pelo fortalecimento das instituições democráticas, pelas minorias e pela redução das desigualdades econômico-sociais, a peça discursiva mais cara do documento de fundação e do estatuto do partido.

Ocorre que a cúpula petista se distanciou do seu princípio de fazer do PT um partido de esquerda diferente dos PCs burocráticos e reformistas e do PTB populista que havia no Brasil daquele período. Se, no passado, o PT seguia fielmente a cartilha determinada por essas organizações sociais, hoje, o Partido dos Trabalhadores que governa o Brasil tem se mostrado, contraditoriamente, mais flexível com as grandes corporações políticas que com a base da pirâmide social. Isso ficou evidente durante o processo de negociação do projeto de reforma da Previdência Social enviado pelo governo ao Congresso. O Palácio do Planalto acabou concordando em alterar o texto original, cedendo às fortes pressões que recebeu dos governadores dos estados e do Poder Judiciário. Mas não cedeu às pressões da CUT, da Força Sindical e dos servidores públicos, por exemplo, que condenaram duramente a cobrança dos inativos, o aumento do tempo de serviço e o teto da isenção da contribuição à Previdência. Deixemos para discutir em outro momento, porém, as conseqüências políticas internas que este ato acarretou para o PT.

Aurélio Munhoz (política@parana-online.com.br) é editor-adjunto de Política de O Estado e mestrando em Sociologia Política pela UFPR.

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