É muito difícil prever o futuro, ainda mais no campo da educação, que se defronta com uma complexidade interminável de problemas, tanto de natureza socioeconômica quanto de diversidade cultural e de valores. A Unesco, em sua experiência de mais de meio século de lutas, sempre procurou estabelecer, de comum acordo com os governos, metas de médio e longo prazos na busca de maior eqüidade educacional entre os países. Nessa trajetória, colheu muitos êxitos, mas não esconde a sua frustração diante da existência de quase 900 milhões de adultos analfabetos e mais de 100 milhões de crianças sem escola. E isso, no contexto de uma época que possui todos os meios para erradicar a pobreza e abrir clarões de cultura para todas as pessoas de todas as partes do mundo.

Especificamente no caso do Brasil, ele não teve a sorte de haver feito, em tempos passados, reformas educacionais que ajudassem a garantir a sua inserção plena nas rotas que conduzem à democratização da cidadania. Em decorrência, colhe hoje os frutos dessa omissão. Apesar de tudo, como recentemente se manifestou o ministro Cristovam Buarque, é possível – ver o exemplo de algumas nações como a Espanha e a Coréia, entre outras, que, há algumas décadas, se defrontavam com problemas semelhantes aos que o Brasil enfrenta na atualidade, e conseguiram vencer dificuldades e obstáculos de grande magnitude, estruturando sistemas educacionais includentes e de qualidade.

É certo que a educação por si só não opera milagres. Estes se tornam possíveis em uma visão sistêmica do desenvolvimento. Espera-se que, daqui a 25 anos, ou seja, em 2028, o Brasil já tenha se inserido plenamente na economia internacional competitiva, especialmente no âmbito das Américas e com sensível ampliação do mercado interno e integração de populações marginalizadas no contexto de uma nova economia. Todavia, para construir esse quadro, a educação condiciona e se coloca, cada vez mais, como estratégia privilegiada do desenvolvimento, na medida em que ela proporciona a reforma de mentes e de mentalidades para enfrentar os desafios do nosso tempo.

Se o Brasil (poder público e sociedade civil) tiver hoje a coragem de empreender as reformas educacionais que se tornam necessárias, é possível prever, para daqui a 25 anos, o acesso generalizado à educação básica e uma elevada proporção da população concluindo a educação superior, com presença ponderável dos afro-descendentes. Também será possível prever a elevação da qualidade, aproximando-se dos países de menor renda da OCDE e abolindo, de vez, as manchetes e lamúrias em relação às crianças que chegam analfabetas à 4.ª série da educação fundamental. Nessa fase da evolução educacional do Brasil, espera-se que a questão docente esteja equacionada, ao menos em seus aspectos fundamentais, quais sejam: proporcionar aos professores uma carreira que tenha um horizonte de progressiva qualificação e melhorar os padrões salariais com a amplitude da responsabilidade social do exercício do magistério.

A esse tempo, já estarão superadas as discussões entre ensino público e privado, coexistindo, ambos, com sentido público, ética e responsabilidade. Os currículos darão grande ênfase à utilização da energia e ao respeito ao meio ambiente, como imperativos diante do esgotamento das fontes de energia fóssil. Darão também destaque aos valores e atitudes para manter a convivência e a solidariedade internacional. No que diz respeito às violências nas escolas e aos crimes hediondos que assistimos hoje, certamente o controle ao crime organizado já se terá instaurado e ele não será mais uma ameaça à estabilidade social e muito menos à escola, que passará a ter condições de criar ambientes que favoreçam a liberação do potencial criativo das crianças e adolescentes, com vistas ao enriquecimento do acervo cultural e científico e à construção de uma cultura de paz.

É possível prever, para 2028, que as novas tecnologias de comunicação e informação, na plenitude de seus avanços, já estejam a serviço da educação do povo, mediante as mais diversas ofertas de educação em suas múltiplas finalidades, para o mercado, pois uma das principais funções da educação do futuro será formar e consolidar mentes éticas para o enfrentamento das incertezas do século XXI. É sempre oportuno lembrar que a dimensão e a importância da subjetividade estão presentes na trajetória humana e definem o sentido de ser e fazer. Por isso mesmo, deverá estar presente em todo e qualquer projeto educacional, independente de tempo e espaço.

Por último, importa ressaltar que um novo projeto educacional, capaz de viabilizar as metas e cenários descritos para 2028 no campo da educação, depende de uma redução significativa das desigualdades sociais que, por sua vez, dependem tanto de uma nova postura no plano interno quanto da sensibilidade de pessoas e instituições que lideram a economia internacional.

Jorge Werthein é representante da Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura (Unesco) no Brasil.

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