O emprego piorou?

Se formos acreditar nas estatísticas divulgadas no Brasil, acabaremos crendo que vivemos no país das maravilhas. Se fizermos o que geralmente ninguém faz, que é esmiuçar os números, compará-los com o que aconteceu antes aqui e acontece em outros países, começaremos a desconfiar que quando se fala em melhora, de fato se está mostrando que as coisas pioraram menos. Que quando se está falando em crescimento, não estamos assegurando o fim do nanismo neste ou naquele setor. Quando falamos em redução da criminalidade, não estamos fazendo mais do que dizer que agora morreram menos do que na semana passada, mas que na semana anterior a coisa pode ter sido uma carnificina. Quando se fala nos progressos na saúde pública, o que estamos afirmando é que antes todo mundo estava com febre e agora nada se sabe, pois acabou o estoque de termômetros.

É só olhar os jornais para ver que as coisas estão cada vez mais turvas. Mas há gente que diz que toda essa deterioração na vida brasileira não passa de ?coisas da mídia?. Ou intrigas da oposição. Venceu o ?sem ter medo de ser feliz?. Hoje temos medo de pôr o nariz para fora da porta de nossas casas e, dentro delas, vivemos em sobressalto. Não temos medo de ser felizes, mas nos sentimos profundamente infelizes. A tal ponto de montarmos um dramático cemitério de cruzes negras na mais famosa praia brasileira, Copacabana, para expressar a dor e a vergonha que nos confrange.

O Cesit (Centro de Estudos Sindicais e de Economia do Trabalho) da Unicamp elaborou um indicador de quantidade e outro de qualidade do trabalho metropolitano no País. O estudo abrangeu seis regiões e considerou o rendimento, a estabilidade e a jornada semanal do trabalhador. A conclusão foi que o número de empregos nas regiões metropolitanas de São Paulo, Rio de Janeiro, Belo Horizonte, Salvador, Porto Alegre e Recife cresce ano a ano desde 2002. A qualidade desse emprego, entretanto, após apresentar melhora em 2005, voltou a piorar em 2006. O indicador do que é emprego de qualidade considera o trabalho formal, o tempo de estudo do empregado (superior a oito anos), a estabilidade (mais de dois anos de atividade no mesmo local de trabalho), a jornada de trabalho de 44 horas semanais, o rendimento (acima de um salário mínimo mensal) e a idade (faixa de 18 a 50 anos) dos trabalhadores em relação ao total das pessoas ocupadas.

Os indicadores de quantidade e qualidade variam de zero a um. Quanto mais perto de um, melhor o emprego. Em 2002 esse indicador nas regiões metropolitanas prediletas do IBGE (Curitiba não entra) ficou em 0,652. Em 2003 caiu para 0,644 e, em 2004, para 0,642. Em 2005, subiu para 0,650 e voltou a cair para 0,646 no ano passado, segundo os cálculos do Cesit, que foi orientado pelo economista Márcio Pochmann.

?O que dá para afirmar é que a qualidade do emprego metropolitano em 2006 está pior do que a de 2002, apesar de o número de postos de trabalho estar crescendo desde 2002. As pessoas têm menor estabilidade no emprego, trabalham mais do que a jornada legal e ganham menos?, afirma Pochmann. Em compensação, o Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Sócio-Econômicos – Dieese acaba de concluir que as negociações de reajustes salariais no ano passado foram as melhores nos últimos dez anos. Das 656 negociações pesquisadas, 85,7% conseguiram reajustes superiores à inflação.

São números que outros números podem contrariar. Mas se as coisas estão piorando ou melhorando, a gente sente na própria pele, na própria carne, nas filas dos desempregados e no medo incontrolável de ser posto no olho da rua a qualquer momento.

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