O direito de resposta ou retificação é reconhecido constitucionalmente como direito fundamental no art. 5, inc. V da Constituição Federal e encontra-se regulamentado na Lei da Imprensa n.º 5.250/67, arts. 29 a 36. Assim, constitui-se como direito que assiste a toda pessoa, física ou jurídica, objeto de uma notícia publicada por um órgão de comunicação social, de ver difundido gratuitamente um desmentido, uma defesa ou uma retificação de informações nela contidas(1).
Antes de mais, importa sublinhar que, apesar de ser gradativa a afirmação do direito de resposta perante a doutrina e a jurisprudência, ainda é prática comum dos titulares de direitos de personalidade lesados pelos medias se absterem de exercê-lo. O que não podemos deixar de lamentar, pois seu exercício pronto e eficaz, frente às ofensas causadas aos direitos de personalidade, tais como a honra, imagem e vida privada, pode, em casos específicos, representar economia da máquina judiciária, apaziguando-se os ânimos e evitando, muitas vezes, uma disputa judicial. Muito embora, neste aspecto, não olvidamos o fato de que dificilmente uma resposta terá o mesmo impacto sobre o público, causado pelo texto ou imagem publicada, e apague in totum as impressões deixadas.
Quanto aos seus fundamentos, são de diversas ordens aqueles apontados pelos autores, na doutrina nacional e estrangeira. Vital Moreira sintetizou o fundamento e as funções do direito de resposta, apontando as principais diferenças que medeiam os sistemas alemão, italiano, francês e o português, nos quais se espelha o Brasil(2).
Segundo o autor, na doutrina predominante, o direito de resposta encontra-se associado à proteção dos direitos de personalidade, designadamente ao direito ao bom nome e à reputação. Esta compreensão do direito de resposta encontra guarida nomeadamente na França, onde a sua concepção é bastante ampla, equivalendo a um ?direito de se pronunciar publicamente sobre o assunto em causa?, atribuído a todos aqueles que foram mencionados na imprensa. No caso da doutrina italiana e alemã, o seu fundamento está associado a um direito genérico à identidade.
Alguns autores o compreendem como um direito individual de expressão ou de opinião, conotando uma idéia de função social da imprensa, isto é, um direito individual de acesso aos meios de informação, uma concretização do direito de participação na formação da opinião pública.
Como instrumento de pluralismo informativo, outra parte da doutrina, principalmente na Itália, repudia a dimensão individual do direito de resposta. Acentua-se, assim, o seu caráter social, a sua função objetiva, pública e institucional.
Ainda, o direito de resposta é entendido como garantia da veracidade informativa, ao procurar tal direito desmentir ou corrigir informações inverídicas ou inexatas transmitidas pela imprensa, incentivando o autocontrole dos jornalistas, que se pautarão pelo rigor e objetividade ao recearem um desprestígio no seu próprio órgão de comunicação.
Por último, há aqueles autores que vêem no direito de resposta uma medida sancionatória, ou uma forma de indenização em espécie. O que não se sustenta de plano, primeiro, porque dispensa para o seu exercício a ilicitude ou a culpa do meio de comunicação social, segundo, porque a resposta afasta a causa do dano e minora seus efeitos, mas não pode, em princípio, repará-los na íntegra.
Entretanto, não condiz a ordem jurídica brasileira com a redução da função do direito de resposta apenas à defesa da honra, direito de personalidade mais freqüentemente ofendido pela imprensa, ou fundamentado apenas em alguma das outras teses acima enunciadas. O direito de simples retificação de um texto ou imagem, através de correções de referências inverídicas ou errôneas, independe da sua natureza ofensiva aos direitos de personalidade. Isto é possível porque o Brasil parece ter adotado um sistema misto, em que a resposta pode ser formulada contra fatos ou contra opiniões ou juízos de valor, pese embora, não ser tão simples distinguir um do outro, principalmente quando estamos diante de acontecimentos que chamam a atenção do público e, por si só, ensejam uma divulgação mais eloqüente, mais emotiva, envolvendo, muitas vezes, um juízo pessoal do transmissor. De qualquer forma, referindo-se exclusivamente a fatos, um texto que contenha informações não correspondentes com a verdade, seja por erro desculpável ou não, merece retificação, ainda que as referências, diretas ou indiretas, não afetem a reputação e a boa fama do visado. Referindo-se apenas a opiniões e juízos de valor, para o exercício do direito de resposta, é de exigir que o texto respondido tenha ofendido a honra ou a intimidade do respondente, sem o que não se justificaria.
Daí que, constitui o direito de resposta também ?uma forma de liberdade de expressão e de acesso individual aos meios de informação (…). Compreende-se por isso que a Lei de imprensa inclua o direito de resposta entre as garantias do direito dos cidadãos a serem informados (art. 14), visto que ele proporciona a publicação de versões alternativas, facultando assim aos leitores uma perspectiva suplementar sobre a mesma questão?(3).
Com efeito, por um lado, o direito de resposta constitui uma medida de garantia dos direitos de personalidade, por outro, constitui um direito individual de acesso aos meios de comunicação social e de participação na formação da opinião pública. Ou seja, reconhece-se a este direito o duplo caráter de garantia institucional (direito do público à informação veraz), assegurando-se a sua dimensão individual, e de direito subjetivo (direito individual de defesa dos bens da personalidade ofendidos). Com isto, o direito de resposta, que inclui no seu âmbito o direito de retificação, cumpriria dois objetivos: ?(…) o de proporcionar a quem se sinta afectado pela imprensa de fazer valer a sua verdade; (…) o de permitir a difusão de versões alternativas, facultando ao público o acesso a pontos de vista contraditórios sobre o mesmo assunto, no que constitui uma verdadeira garantia do direito à informação?(4).
Assim, como bem define Coutinho Ribeiro(5), ?os direitos de resposta e de rectificação representam um instituto primacial do edifício que protege a liberdade de expressão num Estado de Direito, devendo ser aplicado, interpretado e acompanhado com o maior cuidado por todos os responsáveis dos órgãos da comunicação social, em particular pelos Directores e pelos Chefes de redação dos jornais?.
É certo também que a ordem institucional almeja um equilíbrio de posição entre os particulares e os meios de comunicação social, objetivo este que, em certa medida, é alcançado pelo direito de resposta, o qual não autoriza a difusão de resposta díspare em relação ao texto que a motivou, conforme preconiza o próprio texto constitucional. Em conformidade com os chamados princípios da igualdade de armas ou princípio da equivalência(6), a resposta deve ser formulada nas mesmas condições do texto que a desencadeou, ?designadamente na sua extensão, inserção e forma de apresentação, dado que se pretende conferir-lhe o mesmo relevo, para que possa atingir, com a mesma intensidade, sensivelmente o mesmo auditório que teve acesso ao texto respondido?(7). A resposta deve, pois, circunscrever-se ao objeto de réplica, ser publicado no mesmo local que o texto respondido e não pode exceder o necessário para corrigir os fatos inexatos ou inexistentes da informação.
Resta-nos, portanto, acentuar o caráter célere do direito de resposta, pela fixação de prazos limitados e relativamente abreviados, pelo que somente surtirá efeito enquanto perdurar o impacto do texto ou imagem que se pretende responder. A simplificação dos requisitos exigidos pelo texto da lei demonstra a intenção do legislador de possibilitar um meio ágil para uma defesa adequada dos direitos pessoais e, até por vezes, satisfatório à reparação de ofensas contra àqueles cometidas. Julgamos correto afirmar que uma retratação efetuada em tempo útil pode contribuir para eliminar boa parte da conseqüência danosa do ato ilícito, o que, não significa, esteja prejudicada eventual ação do ofendido para promover a responsabilização no âmbito civil e/ou penal.
Notas:
(1) O direito de resposta ou retificação pode resultar de qualquer texto ou imagem difundida por um órgão de comunicação social, inclusive de meras transcrições de declaração de titulares de órgãos de soberania, comunicados oficiais, anúncios, editoriais ou carta dos leitores, crítica literária, fotografias ou caricaturas, entre outros exemplos (Cfr. Vital Moreira, O direito de resposta na comunicação social. Coimbra: Coimbra Editora, 1994, p. 101/102.
(2) Idem, ibidem, pp. 24/32.
(3) Vital Moreira, O direito de resposta entre a Constituição e a realidade, in Actas do Congresso Internacional organizado pelo Instituto Jurídico da Comunicação da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra – 25 a 27 de nov./1993, Coimbra, 1996, p. 157.
(4) J.M. Coutinho Ribeiro, Lei de imprensa e legislação conexa. Lisboa: Quid Iuris-Sociedade Editora, 2001, p. 59.
(5) Op. cit, pp. 63 e 64.
(6) Vital Moreira, O direito de resposta na comunicação social…op.cit., pp. 40 e 41.
(7) Arons de Carvalho, Monteiro Cardoso e Pedro Figueiredo, Direito da comunicação social. Lisboa: Editorial Notícias, 2003, p. 221.
Ana Marina Nicolodi é mestre pela Universidade de Coimbra-Portugal, professora de Direito Civil e Empresarial na Faculdade Unibrasil.
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