Há vários anos se debate, pela imprensa e em áreas interessadas, o tema da reforma do Poder Judiciário. Muito se tem escrito e falado a esse respeito. E ainda agora, a propósito da votação do projeto de emenda constitucional que tramita no Legislativo, ressurgem manifestações, algumas sensatas, outras passionais.
A reforma judiciária tem sido reclamada, há muito tempo, dentro de seus próprios quadros, ou fora deles. É irrecusável que o aprimoramento da Justiça em muito contribui para a ordem e para a paz sociais, já que ao Judiciário incumbe o restabelecimento da ordem jurídica que foi rompida, restaurando-se o equilíbrio social, na feliz expressão de João Monteiro.
A Justiça bem organizada e em perfeito funcionamento é condição essencial para o progresso econômico, político e social da Nação, pois, se multiplicadas, as falhas do Poder Judiciário promoverão, inevitavelmente, intranqüilidade, revolta e desagregação social.
A grande deficiência do Poder Judiciário, nos dias atuais, reside no acúmulo de serviço, com reflexos negativos na segurança jurídica e na estabilidade social. O acesso incondicionado ao Judiciário faz crescer o número das demandas, a implicar a necessidade de mais juízes e de mais serviços auxiliares, o que, por sua vez, em decorrência dos recursos, acarreta a multiplicação dos tribunais, impossibilitando-se o ideal de uniformização do direito.
Dispenso-me da demonstração da necessidade e da oportunidade da realização da reforma do Poder Judiciário. Há, todavia, um aspecto do processo legislativo que não pode ser descurado: a necessidade que dele participe o Poder Judiciário, a fim de que possa prestar a sua imprescindível colaboração, com o oferecimento de sugestões ditadas pela experiência de seus integrantes.
Com efeito, se para a reforma do Poder Judiciário não lhe confere a Constituição a iniciativa legislativa, reservada aos poderes políticos, convém, ainda assim, à prática do regime constitucional, que ela se execute em harmonia com o Poder que será reformado. Afigura-se-me acertada a orientação segundo a qual, antes de tudo, deveria ouvir-se o Poder Judiciário, sem prejuízo, naturalmente, da competência dos outros Poderes, a ser exercitada a seu tempo.
O Poder Judiciário, através do seu órgão de cúpula, o Supremo Tribunal Federal, constituiria uma comissão de alto nível que procederia ao levantamento imediato dos dados e subsídios necessários, em cada área da atividade jurisdicional, para a elaboração do Diagnóstico do Poder Judiciário.
Elaborados esses estudos, após ampla consulta a todos os setores interessados, o Diagnóstico seria encaminhado pelo Supremo Tribunal Federal ao presidente da República e ao presidente do Congresso Nacional para, aí sim, iniciar-se a urgente reforma da Justiça.
A experiência não é nova na história brasileira. Realmente, em 1974, o então presidente Ernesto Geisel, em visita ao Supremo Tribunal Federal, solicitou de seu presidente, o saudoso ministro Eloy da Rocha, a elaboração pela Excelsa Corte do Diagnóstico do Poder Judiciário, que, posteriormente, serviu de base à Reforma Judiciária de 1977.
O ideal de um Judiciário qualificado e apto a desempenhar a sua elevada missão corresponde em fazer – como disse Couture – que os povos tenham mais fé no Direito, como melhor instrumento para a convivência humana; na Justiça, como destino normal do Direito; na paz, como substitutivo bondoso da Justiça, e especialmente na liberdade, sem a qual não há Direito, nem Justiça, nem paz.
Carlos Eduardo Thompson Flores Lenz
é desembargador Federal do Tribunal Regional Federal da 4.ª Região.