A Assembléia Legislativa aprovou, em segunda votação, projeto de Lei que disciplina a contratação de servidores para o desempenho do cargo em comissão. Entre outros, o ponto polêmico deste projeto de Lei é a possibilidade de se contratar assessores de Deputados Estaduais para atuarem nos seus escritórios políticos e bases eleitorais.
Este projeto de Lei, neste especial aspecto, padece de vício de inconstitucionalidade, devendo assim ser reconhecido pelo Poder Judiciário, guardião máximo da Constituição Federal.
A criação de cargos em comissão pelo Legislativo não é uma atividade livre, já que encontra limites na Constituição Federal. O acesso ao cargo público dá-se, como regra geral e absoluta, por meio da realização do concurso público (art. 37, II da CF), sendo certo que a nomeação para a assunção da função de confiança deve ser estrita e pontualmente permitida, sob pena de exercício indevido da regra de competência legislativa e indisfarçável abuso do direito.
A real natureza de um cargo de confiança está diretamente ligada aos contornos jurídicos estabelecidos pela Constituição Federal. Significa afirmar, neste diapasão, que a simples criação de um cargo com a nomenclatura de “Função de Confiança”, de livre nomeação, não desnatura a realidade das coisas: a simples roupagem conferida pelo legislador pode consubstanciar burla de etiquetas, que não altera a realidade como verdadeiramente se apresenta.
A atividade legislativa não é incontrastável, devendo guardar estrita consonância com os ditames constitucionais, o que torna legítima a atuação do Poder Judiciário no sentido de corrigir os indevidos exercícios da regra de competência, como sói ocorrer em qualquer Estado juridicamente controlado (Estado de Direito).
Nos termos do art. 37, inc V, da Constituição Federal, as “funções de confiança, exercidas exclusivamente por servidores ocupantes de cargo efetivo, e os cargos em comissão, a serem preenchidos por servidores de carreira nos casos, condições e percentuais mínimos previstos em lei, destinam-se apenas às atribuições de direção, chefia e assessoramento.”
Por simples interpretação sistemática, infere-se que os cargos em comissão devem possuir uma qualidade que lhe é inerente: seu executor deve desempenhar as funções de direção, chefia e assessoramento, cujas atribuições influenciem nas decisões políticas da Casa de Leis. Estas funções devem ser preenchidas por pessoas que tenham a missão de executar e tomar decisões sobre um determinado programa ideológico de ação.
Estabelecido os paradigmas do cargo em comissão, fácil é perceber que a criação de cargos de assessores para atuarem nos escritórios políticos ou bases eleitorais dos palamentares consubstanciam verdadeiros cargos fantasmas, sobretudo porque, este se materializa não apenas nas nomeações de pessoas que não desempenham qualquer função pública (recebem sem trabalhar).
Também é um cargo fantasma, na acepção finalística do termo, nomear pessoas para desempenhar atividades eleitoreiras, privadas, simplesmente voltadas à consecução de fins pessoais do agente político (deputados).
Não é crível, em qualquer Estado de Direito Democrático e social, que se admita que o parlamentar utilize o cargo público para fazer populismo com o dinheiro do erário, valendo-se de verdadeiros cabos eleitorais para angariar votos para a próxima eleição.
Registre-se que a discricionariedade do Administrador Público, de qualquer esfera de poder (função), na contratação de cargos em comissão, está regrada e balizada pelos princípios da moralidade, impessoalidade, isonomia e eficiência, cujos comandos normativos devem ser resguardados pelos respectivos legitimados.
Conclui-se, então, que o aumento de despesa pública em favor de interesses pessoais e desconectados com o interesse público viola nas disposições contidas no art. 37, caput, da CF, caracterizando ato de Improbidade Administrativa que causa lesão ao erário e viola os princípios que regem a Administração Pública, legitimando, como controle abstrato, a propositura de ação direta de inconstitucionalidade ou, uma vez aprovada, ação civil pública para desconstituir os atos lesivos ao patrimônio público com nomeações acoimadas de ilegais, e impor as respectivas sanções pela prática de atos de Improbidade Administrativa.
Renato de Lima Castro é professor de Direito (Unopar e Escola Magistratura). Promotor de Defesa do Patrimônio Público de Londrina.