O destino dos brasileiros

Paulo Skaf

Considerando o índice de crescimento demográfico médio do País nos últimos anos, de 1,5%, nascerão, em 2005, 2,7 milhões de brasileiros, número equivalente à população do município de Buenos Aires, a capital da vizinha Argentina. Caberá à nação decidir o futuro de seus novos filhos, bem como das crianças e adolescentes que estão nas escolas, dos jovens e adultos em busca de emprego. Considerando que, em 2020, segundo projeção do IBGE, seremos 207 milhões de habitantes, ao Brasil está vetada a hipótese de estagnação econômica. Assim, qualquer ponto percentual no PIB ganha importância extraordinária.

Superávit primário das contas públicas, controle da inflação, ajuste fiscal, cumprimento dos acordos com o FMI e organismos multilaterais de crédito? Claro que tudo isso é fundamental. No entanto, o país detentor da quinta maior população do planeta não pode dar-se ao luxo de analisar a performance da economia apenas sobre planilhas e números relativos à dança dos índices. É preciso ir além, muito além, revertendo, o mais rapidamente possível, os equívocos do passado e alguns conceitos teimosos da política econômica do atual governo e de seu antecessor. Além de promover um ciclo duradouro de crescimento, é necessário que os benefícios da expansão do PIB sejam sentidos de forma mais efetiva pela população. De nada adianta a economia ir bem sob a ótica fria de alguns indicadores, se os brasileiros não desfrutam de mensurável melhoria na qualidade de vida.

O País foi relativamente bem em 2004, crescendo cerca de 4%, registrando promissora retomada da contratação de trabalhadores, mantendo as contas públicas e a inflação domadas. Contudo, o passivo é ainda imenso e o desemprego cumulativo continua grande. Para 2005, é possível vislumbrar dois cenários, segundo estudo da Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo). O primeiro, cujas premissas são a redução dos gastos públicos e da taxa de juros, e a conseqüente desvalorização do real em relação ao dólar, deverá apresentar crescimento de 4%, fomento industrial de 5% e investimentos de 22% do PIB. O segundo, com a manutenção da atual política fiscal do governo, dos juros altos e do câmbio valorizado, terá como resultados máximos incremento econômico de 3%, expansão industrial de 4% e inversões de 20% do PIB.

A diferença entre os dois quadros parece ínfima, mas não é! Um ponto percentual no décimo maior PIB do mundo significa muito no destino de cada um dos 2,7 milhões de brasileiros que virão à luz em 2005. Por outro lado, não se deve considerar, mesmo prevalecendo o melhor entre os dois cenários possíveis no ano novo, que isso seja suficiente para colocar o Brasil à porta do desenvolvimento. É chegada a hora de observar a realidade por trás dos indicadores econômicos. Nesse sentido, basta recorrer, por exemplo, ao estudo "Estatísticas do Século 20", do IBGE, que demonstra: apesar de a riqueza nacional ter-se multiplicado por 100 no último século, em 1960 os 10% mais ricos detinham renda 34 vezes maior do que os 10% mais pobres.

Trinta anos depois, ou seja, em 1990, a diferença já era de 60 vezes. Segundo análise do consultor Matthew Bentley, do Programa de Meio Ambiente da ONU, considerando os números do Censo 2000, dos então 170 milhões de habitantes do País, somente 57 milhões enquadravam-se no perfil de "consumidor", ou seja, com poder aquisitivo anual maior do que US$ 7 mil. Isso significa que 67% dos brasileiros consomem pouco, o mínimo ou nada.

Dessa maneira, paralelamente à sabedoria de dar ouvidos às recomendações básicas de quem produz e trabalha, reduzindo juros, carga tributária e o valor relativo do real em relação ao dólar, o governo precisa implementar políticas públicas mais eficazes na direção da distribuição de renda. Isso não significa apenas e tão-somente programas sociais como o Fome Zero ou convocar a sociedade para engrossar a bem-vinda corrente do Terceiro Setor; significa, também e sobretudo, multiplicar oportunidades, ou seja, mais e melhor educação, saúde, habitação e criação de empregos em escala mais ampla e ininterrupta. É essencial, ainda, a melhoria do poder de compra dos salários, somente viabilizada com a redução do montante de dinheiro transferido anualmente da produção para os setores público e financeiro, via juros, impostos e legislação trabalhista anacrônica e paternalista. Por mais importantes e necessários que sejam a filantropia e os programas sociais, nada é mais eficaz e digno do que emprego e renda para a inclusão na cidadania plena.

Assim, que 2005 traga à pátria esse olhar mais abrangente do verdadeiro papel da economia no contexto de uma nação. Para ilustrar tudo isso, há um emblemático discurso: "O País precisa reduzir os encargos para produzir mais, valorizar e prestigiar sua vocação industrial e agrícola, exportar, estimular o setor de serviços e atrair capitais voltados ao desenvolvimento e à qualidade de vida" (Luiz Inácio Lula da Silva – campanha eleitoral de 2002).

Cumpra-se!

Paulo Skaf é presidente da Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo).

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