O Instituto de Criminologia e Política Criminal ICPC, dirigido pelo douto Professor Juarez Cirino dos Santos, referência em termos de Criminologia Crítica no Brasil, trouxe a Curitiba o Professor Sebastian Scheerer, para um Curso sobre as “Tendências atuais na Teoria Criminológica, na Sociologia Jurídica e no Sistema Penal”, que aconteceu em Curitiba, de 18 de outubro a 17 de novembro.

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O renomado Professor, além de falar fluentemente o português, é um ser humano afável, simpático e com seu jeito simples cativou a todos. Logo na primeira aula, veio com a observação de que estava usando sandálias e meias pretas para provar que era um legítimo Professor alemão, revelando o seu ótimo senso de humor, presságio de que as trinta e seis horas seguintes viriam a ser extremamente prazerosas.

Nascido na Alemanha Ocidental, formado em Direito e Educação nas Universidades de Köln/Geneve e Münster/Wesffalen, o Professor Sebastian é Doctor Iuris na Universidade de Bremen, possuindo pós-doutorado em Sociologia na Johann Wolfgang Goethe Universität Frankfurt AM Main. Atualmente é Professor na Universidade de Hamburgo, ocupando os cargos de Diretor do Instituto de Pesquisas Criminológicas e vice-diretor do Departamento de Ciências Sociais dessa renomada e tradicional instituição de ensino. Conferencista e Professor visitante em inúmeras universidades, o poliglotismo em muito contribui para que possa espargir seu vasto conhecimento de modo didático, franco, demonstrando que é plenamente possível discutir Criminologia sem o apego a fronteiras ideológicas não mais existentes.

O Curso se revelou interessantíssimo e indispensável para aqueles que atuam na área criminal, tendo iniciado com uma abordagem histórica da Criminologia, sendo mostrado que a partir de Lombroso, reconhecido por muitos como precursor dessa ciência, o foco migrou de uma perspectiva que considerava o criminoso como um degenerado moral (antes de 1860), para ser considerado, a partir dele, um degenerado biológico. Depois disso, a Criminologia não parou mais de crescer, surgindo inúmeras outras teorias, notadamente nos Estados Unidos da América, fonte inesgotável de atual pesquisa.

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Discorreu o douto mestre com inegável brilho e profundidade sobre as teorias mais importantes da Criminologia, as quais foram catalogadas por Charles Tittle, no consagrado estudo intitulado “Theoretical Developments of Crimininology”, em que as classifica por aquelas que explicam o crime a partir de: I – diferenças individuais (differences in criminal behavior among individuals); II diferenças da criminalidade no percurso da vida (differences in crime at different times in the lifecycle); III diferenças pelo aumento/decréscimo da taxa de criminalidade em determinado lugar (differences in crime rates among societies, cities, communities, neighborhoods, or other sociopolitical units); IV diferenças de situações que criam ou favorecem a criminalidade (differences among social situations in criminal outcomes).

Após a referida empreitada, que perpassou uma miríade de questões sócio-jurídico-filosóficas, nosso renomado mestre alemão tratou do tema terrorismo, apresentando-o em perspectiva histórica.

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Sustentou, na contramão de muitos doutrinadores, que o terror não é estranho ao Estado, lembrando que Robespierre, na Revolução Francesa, decretou que o governo revolucionário deveria governar com virtude e terror, pregando o terror como princípio de governo, o que espanta aos nossos ouvidos. Apresentou, a seguir, critérios para identificar a conduta terrorista, a saber: 1) sequência de atos de violência contra a vida; 2) motivação política; e, 3) caráter simbólico da violência.

Referindo-se a publicação brasileira, disse ter gostado do livro “Terrorismos”, organizado por Salete Oliveira e Edson Passetti, destacando o artigo escrito por Nilo Batista. Em outro momento, estimulou a leitura do livro “How Terrorists Groups End”, de Martin C. Libicki Jones.

Superado o estudo desse atualíssimo assunto, perpassado de intrigantes questões, o Curso rumou para o tema das drogas, tendo afirmado o eminente Professor que há no mundo uma análise pouco científica e dominada por um tipo de moral que precisa ser repensada, já que o tráfico só existe porque rapazes e moças da classe média e alta a querem comprar e não aceitam que o Estado lhes determine o que podem ou não fazer.

Discorreu com detalhes sobre a história da proibição das drogas, os custos e as inúmeras mortes que essa verdadeira guerra acarreta.

Constatou existir uma ação preconceituosa e estigmatizadora, sugerindo a leitura do artigo “Narcofobia – Proibição às Drogas e Geração de Abusos Contra os Direitos Humanos”, de Fernanda Mena e Dick Hobbs, publicado na Folha de São Paulo de 10/10/2010, pela sua atualidade e objetividade.

O assunto das drogas foi abordado com a profundidade e preocupação que merece, afirmando o Professor Sebastian ser elogiável que o Brasil o esteja discutindo abertamente, citando como exemplo o filme “Tropa de Elite”, que ele, entusiasticamente, recomendou aos alunos.

Prosseguiu discorrendo sobre a corrupção na polícia, mencionando a sua ocorrência no mundo todo, assentando raízes, no mais das vezes, no combate ao tráfico, visto que a presença dela tanto por parte do traficante, quanto por parte do consumidor da droga, não é requerida. Nesse contexto, para combater o tráfico, a polícia tem que ser proativa, secreta, infiltrada num comércio lucrativo, onde corre muito, mas muito dinheiro mesmo, dando origem a um sistema que gera uma teia propícia à corrupção policial. Tal situação chegou ao ponto de alguns países tentarem a criação de uma polícia especial para combater as drogas, formada por policiais que não interagem com as demais polícias. Mas isso não vem funcionando muito bem.

Dissecados esses assuntos, foi tratado o tema das prisões, sem o véu de que se trata de um local propício à reeducação, mas que, na maioria dos casos, presta-se à expiação, apresentando o exemplo da superpopulação carcerária como a prova dessa constatação. Trouxe a lição de Gilles Delleuze, que ofereceu um cenário interessantíssimo da sociedade de controle e as perspectivas para os dias atuais, sendo que, para esse filósofo, o século XIX foi caracterizado pelo princípio da reclusão. Tudo era recluso e seguia a uma mesma arquitetura: o hospital, a escola, o batalhão, a fábrica, a prisão… Felizmente, as coisas estão em processo de progresso com muito mais abertura, sendo o monitoramento dos presos uma necessidade e um recurso humanizador ao condenado que, em certos ca sos, perde parte de sua capacidade deambulatória, mas mesmo assim pode conviver em sociedade.

Para cada tema tratado foram apresentadas interessantes teorias e exemplos concretos de como a melhor ação humana enfrenta a questão. Pois, em se tratando a criminalidade de um fenômeno mundial, há sempre um modo preventivo ou repressivo mais eficiente.

Ao término do Curso fica para nós a saudade das magníficas aulas do renomado Professor Sebastian Scheerer e a consciência de que muito devemos trilhar em busca de uma ação criminológica inteligente, produto de pesquisa séria, que permita mais inclusão social e menos violência.

Para finalizar, tenhamos a certeza de que o Curso ministrado por Sebastian Scheerer no Instituto de Criminologia e Política Criminal ICPC – é capítulo memorável para o desenvolvimento da Criminologia no Brasil.

Vielen dank herr Professor Sebastian Scheerer.

Luiz Fernando Tomasi Keppen é Juiz de Direito. Mestre em Direito pela UFPr.