O controle difuso de constitucionalidade

24 de fevereiro de 1803. América do Norte. Um caso envolvendo as partes Marbury x Madison será decidido pelo magistrado John Marshall da Suprema Corte norte americana e inaugurará uma nova doutrina para o Direito e para a sociedade. É o início do judicial review, que se sustentava na então novel teoria da supremacia da Constituição. Está-se implementando o controle difuso de constitucionalidade das leis, também conhecido como controle por via de exceção, aberto ou descentralizado.

Segundo notícia de Alexandre de Moraes, a possibilidade de controle difuso de constitucionalidade no Brasil, existe desde a Constituição republicana de 1891. Dentre suas principais características, sobressaem as seguintes competência para se declarar a inconstitucionalidade; efeitos da declaração e papel do Senado Federal no controle difuso.

A primeira característica competência para declarar a inconstitucionalidade forma, em verdade, o núcleo da idéia de controle difuso de constitucionalidade. Em determinadas demandas judiciais, para que o magistrado possa conhecer o mérito litigioso, ele precisa se pronunciar a respeito de uma questão prejudicial que lhe impede progredir na cognição do feito. Tal questão prejudicial é justamente a inconstitucionalidade de uma norma, levantada por uma das partes que figuram no processo.

Portanto, o levante de inconstitucionalidade da norma não é a questão principal da lide, mas tão-somente, uma questão incidental que compromete, enquanto não apreciada, a cognição do magistrado por envolver possível eiva na lei aplicável ao caso concreto. Deste modo, compreende-se o termo difuso que nomina esse meio de controle constitucional. Ou seja, todos os magistrados (de forma difundida) poderão se pronunciar sobre a inconstitucionalidade de uma norma que reja o caso concreto.

Fixada essa premissa, pode-se agora adentrar aos efeitos da declaração no controle difuso. Em dada situação concreta, a aplicação de uma norma destoa dos comandos constitucionais. Por conseguinte, sendo a exceção de inconstitucionalidade argüida em face do caso concreto, a eficácia da decisão se restringirá às partes (inter partes), posto que para aquela situação é que a norma é inconstitucional. Em conseqüência, tal declaração surtirá efeitos retroativos à data de aplicação da lei no caso concreto (ex tunc).

Entrementes, a Constituição prevê um mecanismo para ampliar o âmbito de eficácia desta decisão de inconstitucionalidade. Poderá ocorrer que a decisão de inconstitucionalidade pela via difusa obtenha eficácia contra todos (erga omnes). Neste momento ganha relevo o papel do Senado Federal no controle difuso de constitucionalidade. É possível suceder que, por meio de recurso extraordinário, a decisão final sobre a inconstitucionalidade de uma lei em um dado caso concreto chegue ao Supremo Tribunal Federal. À Corte Superior competirá, então, pronunciar, pela via difusa e de modo concreto, a inconstitucionalidade da lei que envolve as partes.

Neste caso, caberá ao Supremo Tribunal oficiar o Senado Federal para que, de acordo com o artigo 52, inciso X, da Constituição Federal, suspenda ou não a execução da lei fulminada. Caso o Senado suspenda a execução da lei essa decisão terá eficácia contra todos (erga omnes) e contará seus efeitos pro futuro (ex nunc). Embora haja discussão na doutrina acerca da natureza da decisão do Senado ser vinculada ou discricionária, a maior parte entende ser uma faculdade do Senado Federal.

Para finalizar, cumpre trazer à colação as palavras do Professor Mauro Cappelletti, que, comentando a decisão proferida em 1803 pelo magistrado John Marshall, afirmou que ?a mesma foi de importância fundamental e de profundo caráter inovador: ele fixou, por um lado, aquilo que foi chamado, precisamente, de supremacia da Constituição e impôs, por outro lado, o poder e o dever dos juízes de negar aplicação às leis contrárias à Constituição.?

Dante Bruno D?Aquino é assessor jurídico do Ministério Público do Estado do Paraná e pós-graduando em Direito Constitucional pela Academia Brasileira de Direito Constitucional. dantedaquino@yahoo.com.br

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