O companheiro Morales

Eleito para presidir a Bolívia e com posse marcada para o próximo dia 22, o líder ?cocalero? Evo Morales esteve em Brasília para conversar com o presidente Lula. Não foi uma visita com as pompas de recepção a chefe de Estado, mas sim uma prévia de negócios envolvendo o gás de que o país vizinho é rico e a Petrobras, que o explora, compra e abastece o Brasil. Tanto é que a direção da Petrobras esteve presente ao encontro entre os dois chefes de Estado. Lá estava o presidente da nossa estatal de petróleo, José Sérgio Gabrielli.

O líder dos plantadores de coca bolivianos e primeiro indígena a chegar ao poder no país vizinho, recebeu apoio aberto de Lula quando candidato. Há entre os dois, e mais o presidente da Venezuela, Hugo Chávez, um esquerdismo em comum, um socialismo parecido e um antiamericanismo que guarda visíveis semelhanças. Isso não significa, entretanto, entendimento garantido, pois há pedras no caminho. Ou, melhor dizendo, gás natural e petróleo que abundam na Bolívia e Venezuela e, em nosso país, escasseiam. Verdade que, em matéria de petróleo, estamos bem perto da auto-suficiência, graças a um trabalho de décadas de sucessivos governos e uma quebra parcial no monopólio estatal.

A Petrobras é atualmente responsável por 75% das exportações de gás da Bolívia para o Brasil, opera 46% das reservas de gás daquele país, 95% de sua capacidade de refino e 23% da distribuição de derivados do petróleo, produzindo 100% da gasolina e 60% do diesel consumido pelos bolivianos. A Petrobras também é responsável por 24% da arrecadação de impostos na Bolívia, 18% do PIB (Produto Interno Bruto) e 20% dos investimentos lá realizados entre 1994 e 2004. Somos o que, no linguajar das esquerdas e de facções nacionalistas, imperialistas sugando os bolivianos.

O movimento de reação dos bolivianos, mesmo antes da eleição de Evo Morales, já deu seus frutos para aquele país e diminuiu substancialmente nossas vantagens. Nova legislação elevou a carga tributária incidente sobre as atividades da Petrobras na Bolívia de 18% para 50%. Isso fez com que a nossa estatal do petróleo adiasse decisões de investimentos naquele país.

O ambiente cortês que cercou a recepção a Evo Morales em Brasília deve ser creditado às proximidades ideológicas, aos nossos interesses econômicos que lá estão cada vez mais em risco e à proposta boliviana de que a Petrobras seja ?sócia? ou parceira da estatal petrolífera boliviana. Para mantermos a predominância no setor energético boliviano, que já está enfraquecida com o brutal aumento de impostos que nos impuseram, Morales quer que o Brasil e a Petrobras façam novos e altos investimentos na Bolívia, aportando inclusive recursos para ser sócio de sua estatal petrolífera. A idéia é cobrar, e caro, a manutenção de uma posição forte dos brasileiros na indústria petrolífera da Bolívia, investindo naquele país capitais de que eles não dispõem, pois se trata da nação mais pobre da América do Sul.

O líder ?cocalero?, que pretende tomar posse como um índio, descalço e em cerimônia de seus ancestrais, é ?companheiro?, mas só o será se houver a devida paga. Se não, seremos imperialistas tão indesejáveis quanto os abjetos ianques.

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