Originalmente, o cheque é concebido como uma ordem de pagamento à vista e, como tal, a partir de sua emissão tem o credor o direito de apresentá-lo para resgate em até 30 dias, se o pagamento tiver de ser efetuado na mesma praça da emissão, ou no prazo de 60 dias, caso seja em praça diferente.
Após estes prazos, não havendo o respectivo pagamento do cheque, tem o credor o direito, assegurado por lei, de promover a execução do referido título de crédito, autorizando-se a penhora em bens do devedor, suficientes para garantir a dívida.
Entretanto, a lei estabelece o prazo de 6 meses para o exercício da execução, iniciado após a data da apresentação do cheque, findo o qual ocorrerá a prescrição, de sorte que, não caberá mais ao credor valer-se do processo executório, tendo de buscar outras alternativas jurídicas para o recebimento, mais demoradas e nem sempre eficazes.
Acontece que a prática reiterada, tanto no comércio, quanto no cotidiano das relações pessoais, de emitir o cheque para pagamento futuro, mediante parcelamento da dívida, popularmente conhecido como ?cheque pré-datado?, provoca uma importante conseqüência, no que diz respeito ao prazo prescricional, qual seja, a sua prorrogação, que deve ser contada não a partir da emissão, mas sim, do vencimento da data previamente estipulada para sua apresentação.
Com efeito, as partes envolvidas na relação jurídica que originou o ?pré-datamento? dos cheques, obviamente, assumem de boa-fé, o compromisso de respeitarem os prazos estabelecidos, tanto para apresentação, quanto para o pagamento dos títulos.
Assim, se fosse possível ao devedor do ?cheque pré-datado? beneficiar-se com a fluência do prazo prescricional a partir da data da emissão, e não da data combinada para o pagamento, haveria aquilo que a doutrina jurídica nomeia de ?comportamento contraditório?, ou seja, uma situação considerada imprópria, vez que, uma das partes exerce uma posição em flagrante contradição com o comportamento anteriormente assumido, causando repulsa aos preceitos ético-jurídicos que devem nortear toda e qualquer relação contratual.
Assim, admitir-se a ocorrência da prescrição do ?cheque pré-datado?, a partir da sua emissão e não da data combinada para apresentação, representaria a premiação do comportamento contraditório do devedor, em detrimento do princípio da boa-fé, que exige de todos os participantes de uma relação negocial, um padrão de conduta baseado na probidade, honestidade e lealdade.
Marcione Pereira dos Santos é advogado, mestre em Direito Civil e professor universitário em Maringá e Cascavel-PR.