O governo acaba de arrancar “a fórceps” do Congresso Nacional a reforma da Previdência. Também a tributária. Uma e outra estão incompletas, mas a primeira já determinou que se avance nos bolsos dos aposentados e pensionistas, que retardem as aposentadorias dos servidores públicos e que sejam limitados os proventos a serem pagos. Até as pensões serão picotadas. A filosofia dessa reforma foi fazer com que os que ganham mais ganhem bem menos. E os que ganham menos continuem ganhando menos. Ou seja, a justiça social através do empobrecimento generalizado.
Não obstante, a reforma era absolutamente necessária porque o déficit do INSS é enorme e crescente. E, muito embora haja quem entenda que a legislação previdenciária é de cunho social, cabendo o suporte do poder público, a verdade é que o buraco no sistema tem sido crescente e o Tesouro Nacional tem se mostrado incapaz de cobri-lo. O secretário de Previdência Social, Helmuth Schwarzer, acaba de confirmar que o déficit do INSS, em 2003, primeiro ano do governo Lula, ficou em R$ 26,4 bilhões em valores nominais. O déficit em termos reais, deflacionado pelo INPC, chegou a R$ 27 bilhões. Isso equivale a 1,7% do PIB (Produto Interno Bruto) do País. Em relação ao ano de 2002, o déficit de 2003 apresentou um crescimento de R$ 6,8 bilhões. Em termos reais, ou seja, descontada a inflação, o déficit do último ano do governo FHC foi de R$ 20,2 bilhões.
Não se poderia esperar, da reforma da Previdência recém-votada, resultados que enchessem de imediato as burras do INSS e eliminassem ou pelo menos reduzissem o déficit. Os efeitos dessa reforma virão aos poucos e demorarão anos para se consolidarem. No mais, o Congresso foi reconvocado a peso de ouro, deputados e senadores ganhando uma fortuna para votar, com prioridade, a chamada PEC paralela que corrigiria alguns pontos da reforma da Previdência. Embolsaram o dinheiro e a PEC ficou na gaveta.
As autoridades não esperavam uma elevação tão grande do déficit do INSS, mesmo porque teria havido um esforço arrecadatório, com combate à sonegação. Acontece que esse déficit crescente é mais uma cobra na cabeça da medusa da recessão, da falta de desenvolvimento econômico. A arrecadação da Previdência e a demanda por seus benefícios também variam em razão da crise econômica.
O desemprego recorde aumenta as filas do INSS e reduz as contribuições. Aumenta, também, o emprego informal, aquele que não tem carteira, nem registros, nem tributos, nem contribuições previdenciárias. São o quebra-galho de quem, desempregado, não consegue uma colocação formal, na qual obrigatoriamente contribuiria para o INSS. No mais, a crise por que passam muitas de nossas empresas faz com que soneguem ou retardem contribuições obrigatórias para a Previdência. E, muitas vezes, essa atitude irregular, e até mesmo ilegal, é legítima defesa, pois pagando todas as obrigações, não poucas empresas faliriam.
Assim, o patinar no mesmo lugar ou até o declínio de nossa economia, além do desemprego, repercute também no próprio governo e, neste caso, no sistema previdenciário. A prioridade número um é, portanto, o desenvolvimento econômico que não será promovido, mas deverá ser facilitado por políticas governamentais. Esse desenvolvimento resolverá uma gama enorme de problemas, inclusive o do déficit da Previdência que o governo chora como sendo uma sangria nos cofres do Tesouro Nacional.