1. Regras legais
Existem dois dispositivos celetários aparentemente antagônicos e que tratam do encaminhamento das razões recursais na Justiça do Trabalho.
O primeiro, e mais antigo, é o caput do art. 899, cuja redação, bem antiga, diz o seguinte: “Os recursos serão interpostos por simples petição e terão efeito meramente devolutivo, salvo as exceções previstas neste título, sendo permitida a execução provisória, até a penhora. Os embargos e o recurso ordinário terão efeito suspensivo” (Correção de acordo com o art. 1.º do Decreto-lei n.º 6.353, de 20.03.44, DOU 22.03.44)(1).
Posteriormente, nova redação dada pela Lei n.º 5.442/68 estabeleceu o texto do caput do art. 899 assim (como se encontra atualmente em vigor): “Os recursos serão interpostos por simples petição e terão efeito meramente devolutivo, salvo as exceções previstas neste Título, permitida a execução provisória até a penhora”.
Relativamente ao agravo de petição, dispositivo mas específico foi introduzido na CLT. Trata-se do § 1.º do art. 897: “O Agravo de Petição só será recebido quando o agravante delimitar, justificadamente, as matérias e os valores impugnados, permitida a execução imediata da parte remanescente até o final, nos próprios autos ou por carta de sentença”(2).
2. A obrigatoriedade da presença de advogado
Existem autores se posicionando no sentido que a interposição do recurso ordinário, agravo de petição e agravo de instrumento prescindiriam de razões, em face dos arts. 899, caput, e 791, caput, ambos da CLT. Entretanto, como o art. 133 da Constituição Federal em vigor teria revogado o art. 791, caput, da CLT, tornando-se, em face disso, indispensável a presença do advogado no processo, não haveria motivo “de ordem lógica ou jurídica, para continuar sustentando a antiga opinião de que os recursos trabalhistas podem ser admitidos mesmo sem fundamentação. Esta, pois, tornou-se necessária, em virtude da presença do advogado no processo. Não basta, assim, que a parte especifique os capítulos da sentença que está impugnando; é essencial que o faça de maneira fundamentada, ainda que laconicamente”(3).
3. Recurso apresentado por termo nos autos
Alguns lecionam que, por força do jus postulandi, os recursos poderiam até mesmo ser apresentados por termo, nos autos(4), mas entendemos, com apoio em Christovão Piragibe Tostes Malta(5) que, afora os casos de remessa de ofício, devem, sempre, ser apresentados por petição.
4. Os casos específicos de agravos
Corrente doutrinária entende que o agravo de petição jamais pode ser admitido por “simples petição”, considerada a exigência de se delimitar, concomitantemente, matérias e valores (art. 897, § 1.º, da CLT); assim como o agravo de instrumento, porque o agravante deve indicar o motivo pelo qual o recurso não foi recebido. Só o recurso ordinário, portanto, poderia, e, ainda assim, desde que não seja apresentado por advogado.
5. Recurso perante os tribunais superiores
Outra linha de pensamento existe no sentido de que o recurso por simples petição só não pode ser admitido perante os tribunais superiores, onde os apelos devem justificar como a decisão recorrida violou a lei.
6. A defesa do recurso sem fundamentação
A possibilidade de recurso mediante uma simples petição a desencadear a revisão do julgado é defendida com base no princípio da devolutividade, no dever do juiz de conhecer o direito e de aplicá-lo, e na desnecessidade de motivação nas remessas de ofício.
Antonio Lamarca(6), que recorda palavras do Ministro Orozimbo Nonato do E. STF(7), não tem dúvida quanto a este entendimento.
7. Posição contrária ao recurso sem fundamentos
A majoritária doutrina confirma a necessidade do oferecimento das razões que fundamentam o recurso, a fim de que o Tribunal conheça os motivos de sua interposição, bem assim para que não se permita a proliferação de recursos meramente protelatórios.
Entre outros, podemos citar: Eduardo Gabriel Saad(8), Valentin Carrion(9), Wilson de Souza Campos Batalha(10), Júlio César Bebber(11), Christovão Piragibe Tostes Malta(12) e Osiris Rocha(13).
8. A regra celetária e a Constituição
A regra do caput do art. 899 da CLT, que admite interposição do recurso por simples petição não teria sido recepcionada pela nova ordem constitucional, estando derrogada, em face da garantia da ampla defesa prevista no art. 5.º, LV, e parágrafo 1.º, da CF/88, que impõe a obrigatoriedade de fundamentação dos recursos com as razões de fato e de direito para possibilitar o contraditório pela outra parte através de contra-razões.
9. O recurso por simples petição e a reformatio in pejus
O recurso por simples petição poderia suscitar a possibilidade de reforma em prejuízo, na medida em que se permite ao tribunal reexaminar toda a matéria (princípio da devolutividade – art. 515 do CPC).
10. Requisitos legais de admissibilidade
Ao contrário do que possa parecer, em nenhum momento o recurso por simples petição está dispensado de ser interposto no prazo legal, de comprovar o pagamento de custas e o depósito recursal.
Nesse sentido se manifesta Tostes Malta, explicitando sua orientação ao recorrente no sentido que, em qualquer hipótese de entendimento da expressão, “pode ficar sujeito a depósito e ao pagamento de custas e deve respeitar o prazo de lei para seu apelo”(14).
11. Comandos superiores sobre o assunto
Existem orientações jurisprudenciais firmes nos seguintes sentidos: a) quanto à possibilidade de as razões de recurso não necessitarem de assinatura, desde que a peça de apresentação a contenha (OJ 20 da SDI I do C. TST); b) quanto à necessidade de recurso ordinário para o C. TST atacar os fundamentos da decisão recorrida, sob pena de não conhecimento (OJ 90 da SDI II do C. TST).
12. O entendimento do E. TRT da 9.ª Região
O Tribunal Regional do Trabalho da 9.ª Região, que exerce a jurisdição sobre o Estado do Paraná, tem posição majoritária quanto à necessidade de fundamentação recursal, tanto no âmbito de sua Seção Especializada (que julga os Agravos de Petição(15)), quanto no de suas Turmas (que julgam Recursos Ordinários), e bem assim através de algumas Decisões Monocráticas.
Relativamente ao Agravo de Petição, a Seção Especializada do E. TRT da 9.ª Região firmou diversas Orientações Jurisprudenciais (DJPR 09.05.03) interpretando o efetivo alcance do § 1.º do art. 897 da CLT. São elas: OJ’s 61, 68, 72, 79 e 80.
Julgados existem, também, no E. TRT da 9.ª Região não conhecendo, ou negando provimento(16), a parte do recurso por ausência de fundamentação, com espeque em julgado do C. TST(17).
Em decisão monocrática, perante a E. 2.ª T. do E. TRT da 9.ª Região, já se entendeu: “Recurso ordinário. Não conhecimento. Razões dissociadas da decisão recorrida. Se as razões tecidas em recurso dissociam-se do julgado recorrido, inviabilizado está o apelo. Cabe à parte deduzir fundamentos a rechaçar a tese do Juízo, dirigidos aos argumentos que contribuíram para seu convencimento. Logo, se acolhida a preliminar de ilegitimidade passiva, extinguindo a ação trabalhista, a qual visava o reconhecimento do liame empregatício, inexistente o recurso que objetiva a responsabilidade solidária pelo crédito trabalhista, em face de sua condição de dono da obra. Recurso que não se conhece”(18).
Notas
(1) Ver, a respeito, CESARINO JÚNIOR. Consolidação das Leis do Trabalho Anotada. 2. ed. atual. e amp. Rio de Janeiro/São Paulo: Freitas Bastos, 1945. Vol. II. p. 325.
(2) Redação dada pelo art. 49 da Lei nº 8.432/92, de 11.06.92, DOU 12.06.92, LTr 56-7/885.
(3) TEIXEIRA FILHO, Manoel Antonio. Sistema dos recursos trabalhistas. 9. ed. São Paulo: LTr, 1997. p. 124-125.
(4)RUSSOMANO, Mozart Victor. Comentários à CLT. Rio de Janeiro: Forense, 1990. Vol. II. p. 1009.
(5) MALTA, Christovão Piragibe Tostes. Prática do processo trabalhista. 31. ed. São Paulo: LTr, 2002. p. 538.
(6) LAMARCA, Antonio. Processo do trabalho comentado – arts. 643 a 910 da CLT. São Paulo: RT, 1982. p. 661.
(7) Ob. cit. p. 661.
(8)SAAD, Eduardo Gabriel. Consolidação das leis do trabalho comentada. 28. ed. São Paulo: LTr, 1995. p. 693.
(9) CARRION, Valentin. Comentários à consolidação das leis do trabalho. 28. ed. atual. por Eduardo Carrion. São Paulo: Saraiva, 2003. p. 767.
(10) BATALHA, Wilson de Souza Campos. Tratado de direito judiciário do trabalho. 3. ed. São Paulo: LTr, 1995. V. II. p. 551.
(11) BEBBER, Júlio César. Recursos no processo do trabalho – teoria geral dos recursos. São Paulo: LTr, 2000. p. 111.
(12) MALTA, Christovão Piragibe Tostes. Prática do processo trabalhista. 31. ed. São Paulo: LTr, 2002. p. 537-538.
(13) ROCHA, Osiris. Teoria e prática dos recursos trabalhistas. 4. ed. São Paulo: LTr, 1996. p. 55.
(14) MALTA, Christovão Piragibe Tostes. Prática do processo trabalhista. 31. ed. São Paulo. LTR, 2002. p. 538.
(15) TRT-PR-AP-01310/2003. Rel. Juíza Marlene T. Fuverki Suguimatsu. Ac. 20.484/03. DJPR 12.09.03.
(16) TRT-PR-RO-11.826/2002. Rel. Juíza Ana Carolina Zaina – julgado em 02.09.03.
(17) TST, ED-Ag-RR 3.763/86.8. Rel. Min. Marco Aurélio, Ac. 1.ª T. 2.259/87.
(18) RO-PR-6620/2003. 2.ª T. Rel. Juiz Luiz Eduardo Gunther. Decisão Monocrática de 12.08.03. Notificadas as partes em 20.08.03, sem agravo regimental, transitou em julgado em 25.08.03.
Luiz Eduardo Gunther e Cristina Maria Navarro Zornig
, juiz e assessora no TRT da 9.ª Região.