Notícia é coisa ruim

O balanço do fracasso. Assim os líderes do partido que ontem era governo – o PSDB – apelidaram a tentativa do presidente Lula de avaliar positivamente seu primeiro ano de governo. Segundo eles, Lula não cumpriu nenhuma das promessas de campanha, o número de empregos diminuiu, enquanto aumentou o número de desempregados, a carga tributária pesa mais sobre o lombo dos contribuintes e ficará ainda pior no ano que vem, a segurança pública continua um descalabro, ninguém cresceu, enquanto quem ganhou foi só o setor financeiro. Qualquer setor sobre o qual se faça uma criteriosa avaliação revelará que tivemos retrocesso ou estagnação. Foi um ano perdido. Em lugar do “espetáculo do crescimento” tivemos o “espetáculo do marketing”…

Lula diz que não é bem assim. Revela ter aprendido que é notícia apenas coisa ruim, ou “aquilo que não queremos que seja publicado”. Bobagem de quem joga para a torcida. Entre tantas notas dez dadas ao desempenho governamental por colaboradores sem muito senso crítico, um seu ministro preferido – Luiz Fernando Furlan, do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior – deu nota seis. Nota seis ao governo seria ainda demais para muitos brasileiros que, já em maioria (54%), conforme a última pesquisa do Ibope, desaprovam as iniciativas do Planalto no combate ao desemprego. Pior ainda é a desesperança que já toma conta de quase a metade (47%) da população, que não acredita em melhora à vista.

Desconfia-se que não tenham mostrado o resultado da pesquisa ao presidente Lula. Ou nela ele não acredita. Ou finge não acreditar. Pois afirmou com todas as letras estar “infinitamente mais feliz” do que quando começou, cheio de felicidade. Venho aqui anunciar – disse no megaespetáculo montado no Planalto, dia 18, ao lado de todos os ministros – que o “tempo da incerteza já passou”. Repetição do que dissera há algumas semanas sobre o “tempo das vacas magras” que teria ficado para trás…

Depende do significado emprestado a essas vacas. O comércio e a indústria não vão bem. O povo, idem. Mas os marqueteiros de Lula (e ele próprio) gostam de jogar com símbolos. Num cartaz gigante estava escrito que “a mudança já começou”. De fato, disse Lula, pegamos um País quebrado, revertemos todas as expectativas pessimistas, reconquistamos a confiança em nossa economia e na capacidade de crescimento do País. Graças ao ministro Antônio Palocci, que (não disse, mas esta é a verdade) soube reverter o péssimo clima gerado a partir da candidatura do próprio Lula, antes da fase paz e amor.

Entre o discurso de 1.º de janeiro e o de agora, uma abissal diferença. No primeiro, a promessa de mudança incontinenti e a sensação do redescobrimento do Brasil, onde nada até aqui acontecera por falta de vontade política. Neste, um pouco mais de prudência e pés no chão: Lula destacou ter consciência de que as mudanças de que o Brasil precisa não serão obra de um mandato, nem de dois, ou de uma década. “Quem sabe – sublinhou – seja obra de uma ou mais gerações.” Mesmo assim, restou um vesgo de jactância quando se coloca na condição do construtor exclusivo das bases ou alicerces, “para que a casa não caia com o primeiro vento forte ou com a primeira chuva”.

No mais, o triunfante Lula continua como se estivesse no palanque. Fala das coisas boas e esquece dos fracassos. Seria uma tática para aumentar a nossa auto-estima, já que “ninguém respeita um país que não se respeita, um povo que não tem estima por si mesmo”? Seja como for, no cartaz estava escrito que 2002 foi o ano em que a esperança venceu o medo; 2003 foi o ano de semear, e 2004 será o ano de começar a colher. Que a colheita seja boa. É imperioso olhar sempre à frente para não perder o horizonte. O paraíso ainda existe e um dia chegaremos lá.

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