A manhã do último 11 de setembro foi carregada de emoções no mundo inteiro, forçado a lembrar sons, imagens e dores de um ano atrás, quando um grupo de terroristas ludibriou a guarda da principal potência mundial para avançar sobre seus importantes símbolos e causar uma tragédia sem precedentes. Mas, por mera coincidência ou inteligência proposital, enquanto funcionava o global replay, às nossas barbas iniciava, também pela manhã cedinho, a enésima rebelião de presos num dos mais famosos presídios brasileiros o Bangu 1, no Rio de Janeiro.
Durou o dia inteiro e mais. À testa da rebelião promovida pelo Comando Vermelho, que, na verdade, foi segundo dizem as autoridades policiais um confronto entre grupos, estava o tido e havido como principal traficante de drogas do Brasil, Fernandinho Beira-Mar. Aconteceram mortes, como sempre. Criou-se um alvoroço que agitou a nação inteira diante dos telejornais, mobilizou inclusive o governo federal e, nos morros cariocas, colocou a polícia outra vez de joelho diante do crime organizado.
De dentro da cadeia onde está-dizia-se naturalmente- Beira-Mar está agindo para organizar em todo o Brasil o seu “império”. Quer obediência a seu comando e quem não se subordinar está condenado à morte. Somente nos morros vizinhos àquele onde foi executado o jornalista Tim Lopes, mais gente morreu este ano que no conturbado Oriente Médio com todos os ódios milenares. Mais gente morreu apenas em algumas áreas faveladas do Rio de Janeiro que todo o estrago causado pela explosão das Torres Gêmeas de Nova York.
Nosso 11 de setembro culminou como culminaram as demais rebeliões. A polícia cedendo para os bandidos, que ordenaram, também, o fechamento do comércio e escolas nos arredores das áreas conflagradas. Convém relembrar que, mesmo à frente de policiais armados até os dentes, a população amedrontada preferiu obedecer os bandidos. “A gente mora aqui e amanhã vocês não estão aqui”, respondiam os aterrorizados cidadãos. Nas ruas, cenas de guerra com os traficantes metralhando escolas e lojas.
Um dirigível foi equipado com a mais moderna tecnologia para vigiar os morros nas 24 horas do dia, gabavam-se dias antes altos integrantes do governo carioca. Toda a tecnologia não conseguiu detectar, menos ainda neutralizar, os planos do “general” Beira-Mar um preso sob custódia do Estado, já flagrado tentando negociar até míssil. Estupefatos, os cidadãos não conseguem entender como alguém, assim preso, tem tanto poder, tamanha liberdade de ação que, colocando em cheque o governo, sua polícia e sua estrutura paga pelos contribuintes, faz dele seu porta-voz para anunciar a formação do império do mal.
Nosso 11 de setembro foi mais triste e real que aquele organizado em Nova York, onde não faltaram evidências de manipulação da lembrança em direção à continuidade da guerra. Aqui tombaram as torres da cidadania encurralada pelo terror do crime organizado. Sem direito a comemorações nem minuto de silêncio.