Não apreensão da arma utilizada no crime de roubo pode não o qualificar

O tema em questão pode causar espanto ante ao senso comum de que leis severas e em abundância são a solução para o problema da criminalidade. Porém, conscientes da notória e absoluta ineficácia da inflação legislativa na esfera penal e, diante da inegociável necessidade de aplicação justa e proporcional das leis penais em vigor, reconhecemos que a interpretação da lei penal deve atender à razoabilidade de seus ditames, evitando-se entendimentos distorcidos, direcionados à satisfação do clamor de uma sociedade em pânico, que geram o indevido recrudescimento de leis, penas e decisões judiciais.

Portanto, ousamos em afirmar que a não apreensão da arma quando cometido o crime de roubo (subtração mediante grave ameaça) não pode gerar o aumento de pena, pelo reconhecimento da causa qualificadora do § 2.º, inc. II do art. 157 do CP (com emprego de arma), mesmo que haja prova testemunhal de sua utilização, no caso da arma ter sido utilizada apenas para intimidar a vítima, ou seja, não ter havido comprovação que durante a prática do delito a arma pudesse ter potencial lesivo (não era de brinquedo e não estava desmuniciada ou danificada). Tal exegese deve ocorrer a partir do cancelamento da súmula 174 do STJ (25/10/01), que previa o aumento da pena pela utilização de arma de brinquedo, pois por maioria de votos, os ministros da Terceira Seção do STJ reconheceram que havia dupla aplicação de pena para o mesmo fato. A inocorrência desse bis in idem baseia-se no fato de a utilização da arma de brinquedo dever ser interpretada como grave ameaça (art. 157, caput), tão somente, não devendo ocorrer o aumento previsto pelo emprego de arma (inciso II, § 2.º do art. 157 do CP), pois uma maior reprovação de conduta com incidência de qualificadora só se justifica se ficar comprovada a efetiva ofensividade da arma ao bem jurídico tutelado (integridade física da vítima). Por seu turno, com a edição da Lei 9.437/97 ocorreu expressa adequação típica da utilização de arma de brinquedo ou simulacro de arma capaz de atemorizar alguém, quando destinadas ao cometimento de crimes (art. 10, § 1.º, II), solucionando eventuais impasses diante desse entendimento mais atual e a nosso ver mais acertado.

Se arma de brinquedo ou simulacro não geram o aumento de pena, como fundamentar dita qualificadora, quando sequer houve apreensão do instrumento utilizado para engendrar a ameaça, se não há como quantificar seu potencial ofensivo? Portanto, quando não houver a apreensão da arma, utilizada tão somente para intimidar a vítima, por ocasião da prisão de quem comete o crime de roubo, pela falta de comprovação do real potencial lesivo da mesma (impossibilidade de realização de perícia na arma), não se pode reconhecer a causa qualificadora, tendo em vista que poderia tratar-se de arma de brinquedo ou simulacro.

Marcelo Nogueira Artigas

é advogado, professor e vice-coordenador do Núcleo de Prática Jurídica da UTP; pós-graduando em Ciências Penais pela PUCPR.

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