A seis meses da eleição que definirá seu sucessor, a presidente argentina, Cristina Kirchner, atingiu a média de uma aparição semanal em rede nacional de rádio e televisão. Foram 12 em 2015. O direito de parar a programação aberta para discursar está garantido no artigo 75 da Lei de Mídia “sempre que haja situações graves, excepcionais ou de transcendência institucional”.

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Este ano, Cristina inaugurou uma fábrica de cosméticos, da qual ganhou uma cesta de produtos para o cabelo. Celebrou uma nova unidade de produção de refrigerantes, enfatizando que em nenhum outro país se consome tanto essa iguaria – 137 litros por habitante. Sobre os projetos do governo, variou entre dados sobre vacinação, energia nuclear, saneamento básico e transporte público.

“O Executivo considera de transcendência institucional falar de vacinas ou inaugurar fábricas. O último item do artigo redigido é ambíguo e dá margem ao governo”, avalia Henoch Aguiar, professor de comunicação da Universidade de Buenos Aires. “É a única maneira de mostrarmos as coisas positivas, que os telejornais não exibem”, argumentou Cristina em uma das transmissões, na qual prometeu usar ainda mais o recurso em um discurso concluído com a frase “a Argentina não é uma república de bananas”.

No ano passado, foram recordistas em comentários nas redes sociais duas transmissões. Numa, em julho, o rapper Mustafá Yoda cantou diante de Cristina os versos “os caminhos conduzem a Roma porque o mundo é imperialista, o ser humano se acha anarquista e o álcool o conquista. Resista”. Na outra, em dezembro, a presidente felicitou os torcedores do Racing pelo título nacional – time de seu filho Máximo e do ex-presidente Néstor Kirchner, morto em 2010, ano em que ela citou a carne de porco como afrodisíaca, outro “hit” na história das transmissões oficiais.

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As emissões costumam ser mais protocolares. Em geral, começam com Cristina chamando um ministro que, após ser elogiado, explica o que está fazendo em certa região do país. Se sua tarefa é inaugurar uma fábrica, passa o microfone ao empresário, que faz a propaganda do negócio. Em seguida, um empregado agradece pela oportunidade de trabalho, se possível com um filho ao lado, que troca palavras com a presidente. “Na crise de 2001, tive de ir para o Uruguai. Agora, posso voltar a viver no meu país”, disse um menino em fevereiro, arrancando aplausos dos grupos políticos levados até o local para figurar como claque. “Obrigado por nossa nova escola”, disse uma menina em outra transmissão.

A razão formal pela qual uma rede é convocada raramente ganha os títulos do jornais locais. “O destaque são os comentários que a presidente faz sobre os fatos políticos. Seu objetivo é tocar cada tema de forma personalista”, diz Aguiar. Segundo o especialista, Hugo Chávez fazia uso semelhante das redes oficiais, mas hoje não há países em que sejam tão frequentes. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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