Foto: Chuniti Kawamura/O Estado |
Cães, gatos, chinchilas, hamsters e pássaros são enterrados no Jardim do Bom Amigo, em Colombo. O local foi criado em março de 2001. continua após a publicidade |
Para muita gente, cães, gatos, chinchilas e outros animais tidos como de estimação são verdadeiros integrantes da família, participando das rotinas da casa e recebendo atenção especial. Por isso, quando o bichinho morre, a dor dos proprietários é igual ou muitas vezes até superior à verificada diante do falecimento de um parente próximo.
Na opinião da psicóloga e psicopedagoga Kelly Cristie Benvenutti Pereira, de Curitiba, o convívio com animais de estimação é extremamente benéfico tanto para adultos e idosos quanto para crianças. Porém, quem adquire um bichinho ou já o mantém em casa deve ter consciência de que ele geralmente tem uma estimativa de vida menor.
?Muitas pessoas conseguem interagir melhor com animais do que com outras pessoas. Eles são capazes de suprir carências e sentimento de solidão, além de ajudar crianças a desenvolver a afetividade e senso de responsabilidade. Algumas famílias os adotam como filhos, conversam com eles e até dividem sentimentos. Por tudo isso, quando o animal morre, seja ele um cão ou mesmo um peixinho, o sentimento de perda costuma ser muito grande?, comenta.
Kelly explica que a tristeza pelo falecimento é normal. Nos primeiros dias, também é comum estranhar a ausência do amigo e ter a sensação de que a casa está mais vazia e silenciosa. O problema maior é quando a tristeza não vai embora, durando vários dias e podendo até se transformar em depressão. ?A depressão nasce da não aceitação do fato ou da nova situação. Quem a tem deve passar por avaliação profissional e receber tratamento, muitas vezes passando por atendimento individual?.
Segundo a psicóloga, a depressão também atinge as crianças. Geralmente para elas, que muitas vezes ainda não vivenciaram nenhuma perda, a morte do animalzinho acaba sendo muito mais traumática. ?Tudo depende do apego que a criança tinha ao animal e da forma como a perda foi explicada a ela pelos pais. A depressão em crianças pode se manifestar através da agressividade, da dificuldade de aprendizagem e de atenção dispersa. Quando isso acontece, também é indicado procurar ajuda profissional?.
Antes de adquirir o animal, Kelly aconselha os pais a já alertarem as crianças sobre as possibilidades de fuga, roubo, sumiço e até falecimento. Diante da morte do bichinho, ela acredita que é mais sensato tentar explicar o que aconteceu do que tentar inventar histórias ou desculpas. ?A morte não deve ser tratada como um tabu, sendo que todos nós nascemos, crescemos e morremos. Por mais que a criança vá começar a questionar o assunto e muitas vezes não haja explicações, é melhor usar a sinceridade do que tentar enganá-la?.
Cemitério particular para bichos
Desde março de 2001, o município de Colombo conta com um cemitério particular específico para animais de estimação, o chamado Jardim do Bom Amigo. O lugar – onde são enterrados bichinhos de pequeno e médio porte, como cães, gatos, chinchilas, hamsters e pássaros – atende moradores de Curitiba e região metropolitana.
A idealizadora do cemitério é Sandra Fumagalli, que é proprietária do local. No ano de 1999, ela perdeu um cãozinho pelo qual tinha muita afeição e sofreu por não ter um espaço onde enterrar o animal e poder cultivar sua memória. ?O corpo de meu animalzinho acabou indo para o aterro sanitário, o que me deixou bastante chateada. Foi daí que tive a idéia de criar o cemitério?, conta.
Atualmente, estão enterrados no local cerca de setecentos bichinhos, mas a capacidade é para 8 mil. Em cada sepultura, podem ser colocados até quatro corpos. Seguindo exigências do IAP (Instituto Ambiental do Paraná), as exumações podem ser realizadas após três anos da data do sepultamento. Alguns cães de grande porte, cuja decomposição é considerada mais lenta, só são exumados após quatro anos.
Para enterrar os animais no cemitério, os proprietários devem adquirir um espaço específico, que custa entre R$ 260,00 e R$ 1.540,00. A administração do local oferece três planos: o standard, no qual é colocada uma lápide em concreto e uma placa; o luxo, que inclui tampo de mármore com placa e foto em porcelana; e o extra luxo, que é semelhante ao luxo, mas tem lápide em tamanho maior. Todos incluem traslado do corpo, sepultamento e urna feita de papelão (material considerado menos poluente por ser biodegradável).
?Não realizamos velório, mas o proprietário pode acompanhar o enterro de seu animalzinho e, posteriormente, visitá-lo quando desejar. Algumas pessoas freqüentam o cemitério semanalmente, fazem orações, se emocionam diante das lápides e deixam velas e flores. É a forma que elas encontram de aliviar a dor proveniente da perda. Para elas, os bichos de estimação são considerados integrantes da família?, diz o funcionário de serviços gerais do Jardim do Bom Amigo, Manoel de França.
Desde a inauguração do cemitério, é Manoel quem se responsabiliza pela limpeza dos túmulos, exumações e também pelos sepultamentos. Em duas ocasiões, a primeira há quatro anos e a segunda há cerca de um mês, ele sentiu na pele a tristeza dos clientes ao ter que enterrar animais que lhe faziam companhia. ?Há quatro enterrei Xuxa, uma vira-lata muito querida, e recentemente sepultei Vítor, um pastor que fazia a guarda do cemitério. Os animais não eram meus, mas eu convivia com eles diariamente e sofri muito quando eles morreram?.
Proprietários
A maioria das pessoas que optam por enterrar seus animais no cemitério o fazem por se sentirem incomodadas com a idéia de os restos mortais de seus amigos irem parar no aterro sanitário. É o caso da psicóloga Sheila Cordeiro Abagge, que no último mês de outubro sepultou Wendy, uma gata persa de oito anos de idade que era tida como filha. ?Acredito que os animais, assim como os seres humanos, têm uma alma. Por isso, não queria que minha gatinha fosse jogada no lixo como se fosse um objeto. Levei-a para o cemitério e acredito que, desta forma, onde quer que ela esteja, ela sabe que continua sendo amada?, considera.
Mesma opinião tem o engenheiro aposentado Lineo Fernando Scorsin, que enterrou sua cadela Nicole, de 11 anos, no último dia 22 de outubro. ?Enterrei Nicole no Jardim do Bom Amigo porque queria deixar seus restos mortais em um lugar de fácil acesso e onde eu pudesse realizar visitas periódicas. Ela era especial, me deu muitas alegrias durante a vida e não merecia ir para o aterro sanitário?. (CV)
Empresa se especializou na cremação de animais
Para quem prefere não enterrar o corpo do animal, mas também não quer enviá-lo para o aterro sanitário, existe a possibilidade de cremação. Também em Colombo, está em funcionamente desde julho o Pet World, empresa especializada em procedimentos para cremação de animais de pequeno porte.
No local, são realizados tanto cremações coletivas – em fornos com temperaturas que variam de 880ºC a 1200ºC e têm capacidade de queimar até 400 quilos por hora – quanto individuais. No primeiro caso, as cinzas são guardadas para, posteriormente, serem depositadas em um local específico e adequado, que ainda está para ser construído.
Nas cremações individuais, as cinzas são entregues aos proprietários dentro de baús feitos de junco e vime. ?O destino das cinzas fica a cargo dos proprietários. Tem gente que opta por jogá-las no mar, enterrá-las sob uma árvore ou mesmo guardá-las em casa, em um cantinho especial, junto com a foto do bichinho?, comenta a gerente do Pet World, Léia Cristien Consani.
O local também oferece traslado do corpo e os donos podem acompanhar a cremação, posteriormente recebendo um certificado de que a mesma foi realizada. Depois que o corpo termina de ser queimado, as cinzas são recolhidas, ?sendo que a fumaça proveniente passa por tratamento antes de ser liberada no meio ambiente?. A cremação individual sai por R$ 300,00. Já a coletiva custa a partir de R$ 70,00.
Tranqüilidade
A profissional de vendas Rita de Cássia Ferreira Rico cremou, há pouco mais de um mês, o corpo de seu cãozinho Kiko, que tinha 12 anos de idade. Ela mantém o baú com as cinzas do animal em uma mesa de sua casa, ao lado de um porta-retrato e de uma fonte de água. ?Ao conservar as cinzas, das quais não quero me desfazer tão cedo, tenho a sensação de ainda ter o Kiko ao meu lado. Isso ameniza bastante a minha tristeza?, explica. (CV)
Solução mais econômica é abrir uma cova
Para quem não pode ou não quer arcar com as despesas de um crematório ou de um cemitério para animais, existem outras alternativas de destino para os restos mortais dos bichinhos. A presidente da comissão de meio ambiente do Conselho Regional de Medicina Veterinária do Paraná (CRMV-PR), Cynthia Hauer de Mello Leitão, afirma que a melhor solução para quem não quer gastar e deseja cultivar a memória do animal é a abertura de cova no quintal de casa ou chácara.
?Não há nada de errado em enterrar o corpo do cãozinho ou do gato no fundo do quintal, assim como também não é errado depositá-lo no lixo. O problema é que do lixo ele vai para o aterro sanitário e isso acaba gerando uma má impressão aos donos do bichinho, que o enxergam como um grande amigo ou mesmo um familiar?, declara.
A situação é mais complicada para quem vive em apartamento. De acordo com Cynthia, também é possível verificar a possibilidade de entregar os restos em clínicas ou consultórios veterinários – onde serão classificados como lixo hospitalar. Em Curitiba, é possível solicitar recolhimento ao canil municipal, que por sua vez se encarrega de enviar os corpos ao aterro sanitário. (CV)