Foto: Chuniti Kawamura/O Estado
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Bahls: ninguém morre da síndrome, mas a sensação de morte iminente leva ao pronto-socorro.

Pânico: susto ou medo gerado sem fundamento, de modo súbito, que pode provocar uma reação descontrolada de um indivíduo. A definição do vernáculo contida no dicionário Houaiss justifica porque a Síndrome da Ansiedade Aguda tornou-se usualmente conhecida como Síndrome do Pânico. As pessoas que desenvolvem o problema de ordem psicossomática costumam ter crises sem uma causa propriamente conhecida, que desencadeia uma série de reações, como taquicardia, mãos molhadas, desmaios e, especialmente, uma sensação indescritível de morte iminente. Dependendo da constância das crises, a síndrome pode provocar o isolamento do portador, tornando a vida dele um verdadeiro suplício.

Segundo o psiquiatra Saint-Clair Bahls, a síndrome atinge de 1% a 3% da população, aumentando em dez vezes as chances para as pessoas que têm histórico familiar do problema, e costuma ser identificada após a análise de uma lista de quatorze características. ?Se a pessoa apresenta quatro destas características, é dado o diagnóstico?, diz. Antes, porém, de ter o problema definido, o paciente costuma passar antes por um clínico geral e por um cardiologista, já que os sintomas fazem a pessoa passar muito mal. ?Ninguém morre de Síndrome do Pânico, mas a sensação de morte iminente, beirando um enfarte, leva as pessoas ao pronto-socorro. Porém, quando os exames físicos não indicam nada, é feito o exame que detecta a síndrome?, explica. Em resumo, muitas pessoas sofrem do mal sem saber, apesar de hoje a doença já estar mais conhecida.

Uma vez diagnosticado o problema, o portador da síndrome começa a ser submetido a um tratamento, que reúne remédios e psicoterapia. ?Geralmente o tratamento é feito com antidepressivos ou em casos extremos, com ansiolíticos?, comenta o médico. As substâncias agem para controlar a descarga de nor-adrenalina e diretamente no neurotransmissor gaba, que relaxa com a introdução dos remédios.

Desmembramentos

Não bastassem as terríveis sensações que afligem os portadores da síndrome, ela está relacionada a outros dois problemas de caráter psíquico. Um terço das pessoas que desenvolvem a síndrome podem desenvolver também a agorafobia, que é o pavor de estar em contanto com as pessoas. ?Muitos dos pacientes se encerram em casa e precisam sempre de alguém por perto para uma eventual crise. Essas pessoas podem ver não só a vida social prejudicada, como também a profissional?, alerta Bahls.

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A depressão atinge de 40% a 80% dos portadores da síndrome e o abuso do álcool chega a afetar de 20% a 40% dos pacientes. ?O álcool dá uma sensação de relaxamento, que pode tornar o hábito pela bebida uma válvula de escape.? Além do perigo do portador se tornar dependente, há o da administração do álcool com os remédios, com reações adversas sérias.

Especialistas recomendam remédios e psicólogos

Ciciro Back/O Estado
Maria Olívia: crise é desencadeada por lembranças, lugares ou referências do passado.
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A eficiência dos remédios no tratamento da Síndrome do Pânico só é completa, segundo os especialistas, se eles forem administrados paralelamente ao tratamento psicológico. A terapia abre espaço para a busca do foco do problema e dá armas para combatê-lo.

?A ansiedade sempre existiu e é inerente ao ser humano. No caso da síndrome, ela atinge o estado máximo, por isso é chamada também da Síndrome da Ansiedade Aguda?, explica a psicóloga Maria Olívia das Chagas e Silva, que já teve em seu divã muitos pacientes que desenvolveram a síndrome.

Segundo ela, o que mais aflige os pacientes é não entender o porquê do desenvolvimento do problema, que surge repentinamente, sem dar sinais prévios. ?Geralmente o que desencadeia as crises são lembranças, lugares ou referências do passado, algum conflito ou situação desconfortável pela qual a pessoa passou.?

Maria Olívia cita como exemplo a situação em que uma pessoa passou dentro de um banco e viveu um susto de um assalto ou furto iminente. Esse susto fica armazenado e a volta ao ambiente em que ele ocorreu pode desencadear uma primeira crise, que passa a acontecer sistematicamente. ?Os sintomas são exagerados e fogem ao controle da pessoas. Taquicardia, mãos molhadas e até desmaios podem acontecer.?

A Síndrome da Ansiedade Aguda tornou-se Síndrome do Pânico quando os laboratórios detectaram que os antidepressivos ajudavam a amenizar o problema, porém sem o tratamento psicológico. A psicoterapia serve para detectar o foco do problema, a origem dele. A partir daí, é feito um tratamento específico. ?Em poucos meses de tratamento intensivo, a pessoa começa a ficar razoável. Há quem defenda que o problema não tem cura, porém, com o tratamento efetivo, as crises não costumam voltar.? (GR)

Conflito precisa ser combatido

João de Noronha/O Estado
Jomar: táticas.

O bioterapeuta Jomar Machado da Cunha também sofreu com a Síndrome do Pânico, mas encontrou uma alternativa diferenciada para deixá-la distante de seu dia-a-dia. Há 25 anos, ele começou a apresentar sintomas de desarmonia emocional. ?Cheguei ao ponto de largar o carro no meio da rua, correr para um táxi e pedir que ele me levasse ao hospital, achando que estava tendo um enfarte?, diz.

Ele foi consultado por três psiquiatras, porém avesso à alotropia, se recusou a tomar os remédios. ?Refleti e notei que se eu conseguia ajudar os outros a encontrar a cura através do autoconhecimento, da auto-análise, poderia fazer o mesmo.?

O conhecimento passado pelos médicos fez o bioterapeuta iniciar a identificação do conflito que deflagrou a crise. ?Eu tinha um conflito em casa, provocado pela disputa da minha mãe com a minha esposa e aquilo me causava as crises de ansiedade extrema.? Na sua concepção, a Síndrome do Pânico, como qualquer outra doença, é o aviso que a natureza dá atenção para algo que está errado na vida das pessoas e elas não percebem. ?Eu tinha o conflito e não o resolvia. Com a síndrome, aprendi a combatê-lo.?

Uma vez identificado o conflito, ele passou a tratá-lo com algumas táticas. ?Sempre que a crise vinha, eu me deitada e tentava meditar para que ela fosse embora.? Mas ele só conseguiu vencer o problema quando começou a apelar para o racional, fazendo-o suplantar o emocional. ?Acredito no poder da mente, que está presente dentro de cada um.? Aos poucos, as crises foram passando e ele usa até hoje a experiência para ajudar aqueles que acreditam em tratamentos alternativos. (GR)

Vontade de largar o carro na rua

Quando o jornalista Cláudio Dalla Benetta descobriu que possuía Síndrome do Pânico, em 1988, a doença era pouco conhecida. Os sintomas apareceram repentinamente, traduzidos numa ansiedade extrema que o fazia ter vontade de largar o carro na rua e voltar para casa.

?Foram oito anos de tratamento com remédio e terapia?, conta. No decorrer dos anos, as crises foram ficando esporádicas até que, em 1996, se viu praticamente livre delas. Praticamente porque ele sabe que a doença pode ficar estável, mas em estágio latente. Ele compara a síndrome com o alcoolismo. ?O alcoólatra pode ficar limpo durante trinta anos, mas com o estímulo da bebida, ele pode deflagrar a doença novamente. No Pânico, o contato com o foco pode trazer de volta o problema?, diz. No caso de Dalla Benetta, a combinação de fatores genéticos – a mãe sofria de ansiedade – com o estresse do trabalho foi bombástica e detonou o problema, hoje controlado. ?A pessoa nunca fica 100%, mas consegue ter uma vida normal.?

Ônibus

Como de praxe, a Síndrome do Pânico pegou a jornalista Ellin Bossardi Alves desprevenida. Acostumada a se locomover através de transporte coletivo, foi justamente a aglomeração de pessoas no ônibus que deflagrou o problema. ?Eu ficava em um estado que cada vez descia do ônibus mais longe do trabalho. Até que comecei a ir a pé, do Cajuru até o Centro?, diz.

O diagnóstico inicial feito por um médico foi de depressão, apesar dela possuir os sintomas básicos da síndrome: taquicardia e falta de ar. Ela só soube que era portadora da síndrome quando viu um reportagem sobre o tema e se identificou. ?A partir dali, comecei o tratamento com psicoterapia.? Nas sessões de terapia, ela tomou conhecimento que a síndrome possivelmente foi deflagrada devido à perda do pai e dos preparativos para o casamento, já que situações de perda ou mudança de rotina costumam ser mola precursora da síndrome.

Em dois anos de tratamento intensivo, ela conseguiu se recuperar e hoje a situação está sob controle. ?Só quem tem o problema sabe como ele afeta a vida. Estar livre dele é um alívio?, diz Ellin. (GR)