Polêmico, piercing na língua atrai mais adeptos

Tão polêmico quanto ter um piercing na língua são as possíveis conseqüências que o pequeno ornamento pode gerar. De um lado, estudos de médicos comprovam a relação do piercing com traumas, que vão desde um processo inflamatório simples até lesões que podem vir a se tornar um câncer. De outro, há os pierciers (pessoas que colocam piercings), que admitem o risco de infecções ou inflamações, mas que dissociam o pequeno objeto como causa de um câncer bucal. Em meio à discussão, estão os clientes – a maioria adolescentes, na faixa dos 17 aos 20 anos -, que mostram um pouco de preocupação, mas não querem perder a oportunidade de seguir a moda.

“Já ouvi dizer que dá câncer na boca, na língua, e para quem fuma é ainda mais preocupante. Mas cuidando bem, fazendo a higienização correta, não haverá problemas”, aposta a estudante Michele Cássia Kazik, de 21 anos, que ontem teve a língua perfurada. Já é o segundo piercing que ela coloca. O primeiro foi no umbigo. “Não pretendo ficar muito tempo com o da língua. Em um ano, acho que tiro”, comentou, acrescentando que o motivo principal foi a curiosidade. “A primeira sensação é bem bacana”, disse, em tom de aprovação.

Sua amiga Juliana Dall?Agnol, 20 anos, também teve a língua perfurada ontem, pela segunda vez. “Fiquei quase um ano e meio com o piercing na língua, sem o meu pai saber. Quando ele descobriu, reclamou, fez um discurso. Resolvi tirá-lo, mas agora quis colocar de novo”, contou. Para Juliana, o risco de vir a desenvolver um câncer bucal é o mesmo de quem usa aparelhos ortodônticos ou prótese dentária.

Trauma

O vice-presidente da Associação Paulista de Estomatologia e professor da Universidade Santo Amaro (Unisa), estomatologista Artur Cerri, conta que há dois anos vem desenvolvendo pesquisa com quem tem piercing na língua. Segundo ele, todos os casos analisados, sem exceção, apresentam algum tipo de alteração celular. “A mucosa da boca não é igual à pele. Apresenta muito mais sensibilidade, e o piercing é um trauma que provoca reações, desde processos inflamatórios simples até lesões cancerizáveis (que podem se tornar um câncer)”, alerta.

Segundo o médico, sessenta pessoas foram pesquisadas até agora. A idéia é concluir os estudos no ano que vem, com um total de duzentas pessoas. “As lesões são microscópicas, mas bastante preocupantes”, diz. Segundo ele, do universo pesquisado, quatro apresentam leucoplasia ou lesões cancerízáveis. “É um número bastante alto, principalmente porque a idade em que essas lesões começam a aparecer é a partir dos 40 ou 50 anos. Agora, os jovens já começaram a desenvolvê-los também.”

Para Cerri, a solução não é proibir o uso de piercing na língua, mas conscientizar. “As pessoas precisam saber os riscos que correm”, aponta. Ele lembra, no entanto, que o câncer é uma doença multifatorial, causado por predisposição genética, cigarro, bebida alcoólica e trauma. “Algumas lesões são reversíveis, outras não.” O câncer bucal, segundo o médico, aumentou 37% nos últimos dez anos no Brasil. Dos novos casos de câncer que surgem por ano ? entre 300 mil e 400 mil ?, estima-se que cerca de 7% a 8% são relacionados à boca.

Higiene reduz os riscos, diz piercer

Lyrian Saiki

A piercer Shelly, que trabalha na área há oito anos e atende atualmente na Pepy Tattoo Studio, centro de Curitiba, conta que faz pelo menos um piercing na língua por dia. “A maioria dos clientes tem entre 17 e 20 anos, de ambos os sexos”, conta, acrescentando que menores têm que ter autorização dos pais. O piercing na língua é, segundo ela, o quarto mais procurado, atrás de umbigo, sobrancelha e nariz. Para colocar o de língua, cobra R$ 20,00, desde que o cliente leve a jóia. Incluindo o pequeno ornamento, o preço sobe para R$ 50,00.

Com relação aos riscos de inflamação, Shelly diz que eles existem, mas que a higienização adequada e a utilização de materiais descartáveis (no caso de agulhas) e esterilizados ajudam na recuperação. Com relação ao possível câncer de boca, Shelly é taxativa: “Não digo que não dê câncer, mas não há provas de que alguém teve câncer por causa do piercing. Os riscos são os mesmos de quem usa aparelho ortodôntico, prótese ou implante.”

Além de uma higiene mais apurada, com a utilização de anti-séptico bucal, Shelly orienta que as pessoas que acabaram de ter a língua perfurada tomem o antiinflamatório cataflam (ou genérico); evitem cigarro, bebida alcoólica e drogas durante o período de cicatrização (durante três meses aproximadamente); evitem beijar durante um mês e se alimentem de líquidos em geral, especialmente frios como sucos, vitaminas, gelatina e sorvete.

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