Pequenas justiças, grandes injustiças

d6A.jpgO colunista André Petry da revista Veja, na edição de 21 de setembro último, confronta o tratamento dado pela Justiça a alguns casos nominados. Compara, por exemplo, o que deverá acontecer com Paulo Maluf e o filho Flávio ou em relação a Roberto Jefferson, Severino Cavalcanti e os envolvidos no ?mensalão?; e, no lado oposto, o que aconteceu com pessoas comuns como Rosemeri Rosa de Jesus, presa desde agosto do ano passado por ter roubado uma ducha elétrica de R$ 19,00 num supermercado de São Paulo. Ela foi condenada a 11 meses e 20 dias de cadeia sem direito de apelar em liberdade.

Sueli Silva é outro caso emblemático da Justiça do País. Brasileira, negra, está presa desde 30 de junho de 2004, condenada a 16 meses de reclusão, por tentativa de furto de queijo, biscoito e desodorante, no valor de R$ 30,00. Rosana Evangelista, também negra, mãe de cinco filhos, tentou furtar um pacote de fraldas – R$ 13,80 -, mas foi ?privilegiada? e responde ao processo em liberdade. Emília, branca, 23 anos, tentou levar um carrinho de bebê e pegou 21 meses de prisão.

Confesso que em algumas situações – e admito como uma imperfeição de caráter necessitada de correção – sou muito passional. O que penso, falo e faço, é com a força da paixão. Idéias ardentes, sentimentos com tonalidades fortes; alegrias intensas, indignação explodindo diante de injustiças. Dificuldade de ser morno. Perdoe-me o amigo leitor por abrir esta fresta da alma, mas pergunto: embora o que Petry denuncia não seja novidade para ninguém, podemos ficar insensíveis? São casos concretos, de gente com nome e sobrenome, de brasileiros, ricos, poderosos e protegidos uns e de pobres, negros muitos deles, e discriminados outros. Onde está a equitatividade na distribuição da justiça?

Não se defende a impunidade dos pequenos ou dos grandes delitos. Um erro não justifica outro e, consideradas as circunstâncias atenuantes, a falta de algum tipo de apenamento para pequenos furtos, além do prejuízo já consumado ao comerciante, serviria de incentivo para que os mesmos se tornassem prática corriqueira, até por reincidentes. Mas e os peixes graúdos? Com raras exceções, estes não são privados de liberdade. No máximo abrem mão de um mandato político, temporariamente, e algumas mordomias, sofrem alguns aborrecimentos burocráticos e nada mais. Não saem de cena e nem são obrigados a devolver aos cofres públicos ou a terceiros lesados as fortunas adquiridas ilicitamente.

A regra de ouro de conduta moral dos cristãos é só fazer aos outros aquilo que gostaríamos que nos fizessem, bem como a sua equivalente negativa. E pode ser estendido ao desejo ou sonho, como diz o jornalista ao final de seu artigo, de que a vergonhosa Justiça brasileira, sem generalização, se corrija. Desejo seguido por uma postura mais firme, menos omissa por parte de cada cidadão na luta pelo estabelecimento dos valores éticos em todos os setores da atividade humana, a partir da exemplificação pessoal. Vale para a Justiça, para a política, para os órgãos públicos, aos empresários, profissionais liberais e religiosos. Vale para todos nós.

Que cada um se coloque no lugar de Rosemeri, Sueli ou Rosana. Imagine-se atrás das grades, sem advogado brilhante ou interessado, com a família abandonada e saber do tratamento dispensado aos ricos, poderosos e ladrões de milhões. Como será passar cada dia, cada hora de 15 ou 20 meses numa situação dessas?

Mas o Espiritismo afirma que nada acontece por acaso e que Deus é perfeito em sua justiça. De onde deduzimos que estas pessoas estão pagando por crimes praticados em outras vidas e que ficaram mais ou menos impunes ou cometeram injustiças proporcionais neste mesmo passado ou, ainda, estão sendo submetidas a uma dura prova moral de paciência, fé, resignação e coragem.

É possível afirmar que o próprio fato de ser pobre e negro num país que nega no discurso, mas discrimina na prática, já faz parte das necessidades espirituais deste indivíduo. Provavelmente ele próprio solicitou a inclusão de experiências desta natureza no seu planejamento reencarnatório. Temos, por este processo, na contabilidade moral de nossos atos, a desoneração de débitos contraídos no passado ou a aquisição de créditos futuros. Nada se perde, nada é em vão ou casual. Pela onisciência, Deus tudo vê e dispõe de cada fato para promover o crescimento espiritual de suas criaturas.

Mas não se pode esquecer que a injustiça aqui está menos na punição do pequeno furto do que na impunidade do gigantesco. Enquanto no primeiro caso, quita-se a dívida perante Deus e os homens pela fraqueza da tentação, talvez num momento de desespero e por amor a um filho, no segundo, os réus, gananciosos e premeditados, contraem pesado ônus a ser obrigatoriamente resgatado no futuro.

Os primeiros já estarão livres, os últimos comprometidos por muito tempo. De fora não ficam nem os juízes, excessivos no rigor com alguns e permissivos com outros. Um dia se verão diante do tribunal de suas próprias consciências, juízes de si mesmos, e responderão, conforme o Cristo, uns na mesma medida de severidade empregada com os fracos e outros pela fraqueza ou interesse vil na tolerância e omissão com os poderosos do mundo.

Colaboração da Associação de Divulgadores do Espiritismo do Paraná – ADE-PR

 e-mail: adepr@adepr.com.br.

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