As gôndolas dos supermercados portenhos ficaram praticamente vazias esta semana. O desabastecimento provocado pela greve do setor agropecuário – e dos piquetes que impediam o transporte de alimentos – varreu a carne, elemento crucial na mesa dos argentinos, dos comércios das principais cidades do país. Nos restaurantes, o produto estava sendo racionado, enquanto que os gerentes – especialmente os dois estabelecimentos freqüentados por turistas nos bairros de Recoleta e Puerto Madero – cruzavam os dedos para evitar que a greve dos agropecuaristas fosse mais além deste fim de semana.
Para os argentinos, a falta de carne aproxima-se de uma situação de tragédia gastronômica. Os habitantes deste país são os maiores carnívoros humanos do planeta, já que consomem quase 70kg de carne per capita por ano.
Nas gôndolas do supermercado Coto, da rua French, em plena Recoleta, bairro da elite portenha, onde nas semanas anteriores exibiam-se suculentos nacos de carne em bolsas de plástico, desde a segunda-feira (24) estavam vazias.
Os pequenos açougues de bairros de classe média como o de Almagro, sem contar com o produto emblemático da mesa dos argentinos, não reabriram suas portas a partir do feriado da Páscoa. A modo de férias forçadas, os açougueiros estavam em compasso de espera pelo retorno do abastecimento.
Em uma quitanda da avenida Pueyrredón, o proprietário comentou à Agência Estado que suas estantes cheias de verduras e legumes só haviam sido possíveis graças ao "estoque preventivo" e "a uns contatos com sitiantes da área da Grande Buenos Aires" que proporcionavam-lhe os produtos furando o bloqueio agropecuário.
Nos restaurantes mais prestigiados da capital, os gerentes admitiram que contavam com um estoque preventivo. Mas, se o desabastecimento continuasse, hotéis como o Sheraton já estavam avaliando eventuais modificações em seus cardápios. No elegante Hotel Alvear foi implantado um "plano de contingência" para "melhor distribuir" a matéria-prima bovina nos pratos.
O desabastecimento, no entanto, poderia acabar até domingo, já que o governo e as câmaras de comércio fecharam um acordo para retomar a entrega e comercialização produtos. Em diversos piquetes realizados nas estradas no interior do país, os produtores – em sinal de boa vontade com o governo – concordaram em deixar passar caminhões que transportavam laticínios.
A falta de alimentos provocou casos de saques a supermercados no empobrecido município de La Matanza, onde grupos de 10 a 30 pessoas atacaram comércios e levaram seus produtos. Também foram registrados saques na periferia da cidade de Mendoza, perto da fronteira com o Chile. Além da escassez de alimentos, os postos de gasolina das grandes cidades do interior começam a padecer a falta de combustível.