As variações de humor são bem comuns. Há dias em que estamos animados e felizes, mas em outros a vida nos traz tantos problemas que o desânimo nos pega de jeito. Todos passam por momentos assim, mas quando o período de mau humor se prolonga, mudando o comportamento e afetando o relacionamento com os outros, pode ser sinal do chamado transtorno bipolar do humor, uma doença que exige tratamento.
O professor de psiquiatria da Universidade Federal do Paraná (UFPR), Osmar Ratzek, explica que existem variações da doença. Os casos mais graves que anteriormente eram chamados de psicose e maníaco-depressivo são os menos comuns, aparecendo raramente hoje em dia. As pessoas passam por fases de muita agitação, falam demais, gastam excessivamente e ainda perdem o contato com a realidade.
O tipo mais comum da doença são os casos moderados. As pessoas que estão passando por este problema ficam cerca de 90% do tempo deprimidas, têm desejo de morrer e em outros 10% do tempo estão com extrema euforia, com energia de sobra, querendo arrumar o guarda-roupa de madrugada, por exemplo, para elas não parece nem um pouco estranho.
Segundo o professor, cerca de 5% da população possui o transtorno bipolar. Ele pode aparecer em qualquer idade e o principal responsável pelo surgimento da doença é a genética. Os adolescentes são os mais vulneráveis, a maioria dos casos se manifesta em pessoas que estão nessa fase da vida. Os fatores que podem desencadear o problema são a depressão, o estresse e até alguns remédios. ?Mas só desencadeiam quando já existe um quadro formado da doença?, fala o psiquiatra.
Ratzke diz ainda que algumas vezes aparecem casos mistos do transtorno. Ao mesmo tempo em que a pessoa está depressiva também apresenta um quadro de euforia. Os dois componentes juntos são perigosos porque aumentam o risco de suicídio.
Insônia influencia o dia-a-dia diretamente
Enquanto a maioria das pessoas está dormindo, recuperando as energias para enfrentar as atividades do dia seguinte, a professora Jurema Batiuk, de 51 anos, está acordada. A insônia é uma companheira constante há cerca de sete anos. Ela conta que há dias em que fica acordada até de madrugada e, depois de muito esperar, é que o sono chega. Outras vezes consegue dormir com facilidade, mas depois de algumas horas acorda e só quando o dia está amanhecendo consegue dormir de novo. ?Tem dias em que penso que nem adianta ir para a cama, se deitar não vou dormir?, diz.
A conseqüência disso é visível no outro dia. Acorda cansada, ombros pesados, os olhos ardem, a cabeça fica pesada e o corpo dói. Além do mal-estar físico, fica mal-humorada porque acaba dormindo até tarde e não consegue dar conta de todas as atividades do dia. Falta à aula de ginástica e a casa também fica de lado. Ela começa a dar aula no período da tarde e nesse horário conta que o humor já melhorou um pouco. O problema maior é enfrentar o período da manhã.
A psiquiatra e neurofisiologista, Gisele Minhoto, explica que a falta de sono pode se originar de um problema físico ou psicológico, um quadro clínico de dor ou estresse, por exemplo. Um dos resultados disto é o mau humor. ?As pessoas se sentem prostradas, desanimadas, com mau humor, se irritam com facilidade?, fala. A psiquiatra diz que vem aumentando o número de pessoas que apresentam problemas para dormir. Porém ela não sabe dizer se isto acontece devido à vida cada vez mais estressante ou se é porque agora as pessoas começaram a procurar ajuda.
Gisele diz que na hora de dormir não se deve ficar remoendo os problemas. É preciso fazer uma higiene mental, deixar as preocupações de lado. Também não se deve ficar preocupado se vai ou não conseguir dormir, isso gera ansiedade. É preciso criar uma espécie de ritual antes de deitar, ir desacelerando o ritmo, e isto pode incluir um banho morno e uma música calma. Outra dica importante é não usar a cama para fazer as refeições e para assistir à televisão. ?A cama deve ser usada apenas para dormir e fazer sexo?, diz Gisele. Também deve-se evitar alimentos estimulantes como café.
Adolescentes também são vítimas
Mas nem todo o mau humor que ataca os adolescentes é sinal de transtorno bipolar. A variação de humor é bem comum nesta idade. Na mesma hora em que estão bem, basta um simples fato para que o mundo vire de ponta-cabeça. Tania de Jesus, mãe de Ana Coline de Jesus, de 12 anos, sabe bem o que é isso. A mudança de humor da filha é constante. ?Ela está animada porque a gente vai sair. Aí ela vai procurar uma roupa, se não acha o que quer briga com todo mundo e diz que não vai sair mais?, fala. Outras vezes se acha a menina mais linda do mundo, no outro dia já não gosta do que vê no espelho.
A psicóloga da Clínica de Psicologia Instituto Terapêutico, Marilza Carvalho, diz que estas mudanças no humor são bem comuns na adolescência. Ela explica que os adolescentes vivem uma fase difícil porque começam a transitar entre a vida infantil e a adulta. Para algumas situações são considerados bem grandinhos e para outras ainda são crianças. Para os pais a psicóloga recomenda muita paciência.
Marilza diz que é comum os pais errarem algumas vezes, e isto acontece até com psicólogos e professores, já que o conhecimento teórico se perde porque naquele momento eles são apenas pais. ?A adolescência também desestabiliza a identidade dos pais que, algumas vezes se sentem impotentes junto aos filhos?, diz. O importante é tentar acertar mais do que errar.
Enfrentando com coragem as dificuldades
Foto: Átila Alberti |
Elizabeth de Carvalho: ?Tudo depende da cabeça da gente?. |
A dentista Elizabeth de Carvalho, de 53 anos, faz quimioterapia desde novembro do ano passado depois que descobriu um câncer em um dos seios. Motivos para ficar mal-humorada não faltam. Os cabelos começaram a cair, as náuseas, as dores nas juntas e nos pés são constantes, além do cansaço físico e a perda do paladar. Mas o desânimo e a tristeza dificilmente fazem parte do seu dia-a-dia. Elizabeth vive sorrindo e arrancar dela uma gargalhada não é difícil. Para ela, manter o bom humor é fundamental para conseguir atravessar essa difícil fase da vida.
Ela disse que quando recebeu a notícia do câncer não conseguiu ficar triste. ?Acho que tudo depende da cabeça da gente, a tristeza não leva a nada, só atrai coisas ruins. Eu não sorrio, dou gargalhadas?, fala. Depois que começou a fazer quimioterapia, a vida ficou um pouco mais complicada. Precisa fazer uma dieta diferenciada, lidar com o mal-estar físico e a auto-estima. Ela admite que às vezes a tristeza bate à porta, mas quando isto acontece dá um jeito de reverter a situação. ?Escuto uma música alegre, saio de casa?, diz.
Ela também não deixou o trabalho de lado, diz que quando está com os pacientes esquece dos problemas. Além disso, a vida a ensinou a separar as preocupações diárias, das coisas que realmente importam. ?A vida com reclamações é uma chatice, ninguém agüenta ficar ao lado de quem só reclama?, completa.
Elizabeth vem usando o bom humor para ajudá-la a enfrentar a doença. O psicólogo Tonio Luna, diz que o humor também é uma ferramenta usada nos consultórios de psicologia para melhorar o estado terapêutico das pessoas. ?Por exemplo, uma pessoa que está deprimida devido a problemas de relacionamento e sempre apontando o parceiro como culpado, em tom de brincadeira, faz com que se lembre que em outra determinada situação foi ela quem pisou na bola. A situação precisa ser colocada de uma forma agradável, bem-humorada?, fala.
Trabalho
O bom humor, ou a falta dele, também afeta a vida das pessoas no trabalho. Além de gerar dificuldades de relacionamento, afastando os colegas, também pode afetar a produtividade, deixando as promoções cada vez mais distantes. Em ambientes onde o trabalho costuma ser tenso, como nas plataformas de petróleo da Pretrobrás, o bom humor ajuda a manter um bom ritmo de produção. Luna diz que fez uma consultoria para a empresa e recomendou que fossem adotadas várias atividades para descontrair os trabalhadores. ?A risada é extremamente saudável?, fala.
Por outro lado, ele também alerta para que as pessoas não fiquem fingindo um estado de espírito que não corresponde com a realidade. Ficar aborrecido algumas vezes é natural e isto não precisa ser escondido. Basta apenas tomar o cuidado de não despejar o mau humor em cima das outras pessoas.
Luna também dá algumas dicas para deixar o mau humor bem longe. Ele recomenda quebrar a rotina com atividades que dêem prazer, como exercícios físicos e um bom papo com os amigos. Mas se mesmo assim, o mal não der trégua, aliado a outros sintomas como alterações de apetite e falta de sono, pode ser sinal de problemas como a depressão. É preciso buscar ajuda.