Os jovens estão fumando menos. Esta é a conclusão de uma pesquisa inédita realizada por professores da Universidade Federal de São Paulo. O objetivo do estudo foi fazer uma comparação do número de pessoas que já experimentaram o cigarro entre 12 e 18 anos antes e depois de 2000, ano em que entrou em vigor a Lei n.º 10.167 que, entre outros dispositivos, efetivou a proibição de propaganda de cigarros em qualquer tipo de mídia, restringindo a divulgação comercial do fumo a pôsteres, painéis e cartazes na parte interna dos locais de venda.
Em 1997, 15.501 jovens foram entrevistados nas escolas públicas de dez capitais brasileiras – dentre elas, Curitiba. Em 2004, a pesquisa teve 21.712 entrevistados, ampliando significativamente a amostragem. Segundo os dados coletados na capital paranaense, 41,4% das meninas entrevistadas em 1997 diziam já ter experimentado o cigarro. Em 2004, o número caiu para 27,8%. Já entre os rapazes a redução do número de fumantes foi de 40,1% para 23,6%. A pesquisa comprova também um dado curioso: as mulheres continuam fumando mais que os homens em Curitiba.
Na análise da faixa etária, a boa nova é que o número de jovens de 11 a 12 anos que já fumaram em Curitiba caiu pouco mais de 10%. Já a redução do número de iniciados entre 16 e 18 anos continua sendo maior, mas apresentou redução de 60,7% para 46,4%.
Segundo Elisaldo Carlini, um dos envolvidos na pesquisa, a redução em todo o País foi de 32,7% para 25,02%. ?A única capital que mostrou crescimento no número de jovens que já experimentaram o cigarro foi Fortaleza. No Rio de Janeiro, os números se mantiveram e nas outras oito, houve redução?, comenta.
Ele acredita que o fato de a propaganda de cigarros estar proibida desde 2000, sob pena de duras multas aos infratores, ajudou a mudar o quadro. ?Não dá para dizer que foi só por isso. Mas acreditamos que a proibição deu uma contribuição importante, pois não está mais acessível aos olhos seduzíveis dos jovens?, diz o médico, que é presidente do Centro Brasileiro de Informações sobre Drogas Psicotrópicas (Cebrid).
Também conduziram o estudo os especialistas José Carlos Galduroz, Arilton Martins Fonseca e Ana Regina Noto, todos professores da Unifesp. Outra suposição levantada na pesquisa para a redução do número de jovens que já experimentaram são os avisos nada convidativos que são impressos nas carteiras de cigarros, também por determinação da mesma lei. ?Acreditamos que as políticas públicas têm sido importantes no combate ao tabagismo. A proibição de fumar em shoppings ou em locais fechados são outras determinações importantes. Hoje o fumante tem cada vez menos locais para fumar, o que ajuda a limitar o hábito.?
Influência na formação da personalidade
Em fase da formação da personalidade os jovens são mais suscetíveis à influência de todo o tipo de propaganda. Pelo menos na concepção da neurociência, vertente da psicologia, que estuda o funcionamento do cérebro.
Segundo o psicólogo Naim Abel Filho, como o jovem está formando a personalidade, ele é mais facilmente seduzido. ?Eles ainda não têm experiência de vida suficiente para avaliar até que pondo a idéia vendida pela propaganda é verdadeira.?
Como geralmente as propagandas de cigarros eram vinculadas à aventura, esporte, romance e refinamento, ficava ainda mais fácil vender os cigarros aos jovens. ?O cigarro remetia àquelas situações, seduzindo a juventude. Sem pensar nas conseqüências, eles aderiam ao hábito, sem pensar que depois dificilmente conseguem largá-lo?, diz.
Quando trabalhou no Procon há alguns anos, Abel participou de um congresso que tratava do cigarro como vilão do consumismo. ?As propagandas de cigarros eram abusivas, porque exploravam a fragilidade dos jovens, e enganosas, porque vendiam uma falsa visão da felicidade?.
Com veemência, Abel fala que evitar qualquer tipo de contato dos jovens com o cigarro é importante porque eles também são mais suscetíveis ao vício que a nicotina provoca. ?Quando mais jovem uma pessoa começa a fumar, mais difícil vai conseguir largar o cigarro. Está cientificamente provado?, diz.
Os estudos na área da neurociência comprovaram que até perto dos 20 anos, o cérebro está em formação. Por isso, é mais sensível à ação das substâncias destrutivas, como o álcool, a cocaína e a nicotina. ?Essas substâncias agem em uma área que responde pela sensação do prazer. Acaba se tornando uma dependência física. O jovem necessita da substância para se sentir bem.?
Segundo o psicólogo, a nicotina provoca um vício tão forte que apenas poucas pessoas que tentam parar conseguem. ?O índice varia de 30% a 40% de recuperação. E quando mais jovem a pessoa começou e a quanto tempo ela fuma, mais difícil de sair do vício.? Dependente, a pessoa fica mais propensa a desenvolver doenças como o câncer de pulmão ou doenças cardiovasculares.
Opinião sobre propaganda é variada
Fotos: Anderson Tozato/O Estado |
Viviane Matioli: ?Comecei a fumar para fazer estilo. Acho que jovens começam a fumar por isso?. |
Entre os fumantes, a opinião sobre a influência das propagandas de cigarro para o consumo é variada. Alguns jovens começaram a fumar depois de 2000, quando aconteceu a suspensão dos anúncios, de modo que eles não tiveram contato com a publicidade tabagista. Portanto, foram outros fatores que os influenciaram para adquirir o hábito.
Taís Penteado, de 18 anos, começou a fumar com 12 anos e diz que na casa dela pai e mãe fumavam. ?Meu pai só parou em 2002, quando teve um infarto, mas minha mãe fuma até hoje?, diz. Ela confessa que o que a seduziu no cigarro foi a imagem que ela tinha dos fumantes e, mesmo não tendo sido influenciada pelos anúncios, ela apóia a proibição, pois a publicidade costumava vincular o cigarro à situações de liberdade, glamour e estilo. ?Proibir os anúncios ajuda. Eu comecei a fumar para fazer estilo, pose. Acho que a maioria dos jovens começa a fumar por isso. Pela imagem do cigarro?, diz.
Bruno Zullato: ?Empresas têm liberdade para vender o produto?. |
Foi o que aconteceu também com Viviane Matioli, de 16 anos. Ela começou a fumar com 12 anos. ?Eu achava lindas as mulheres mais velhas, com as unhas grandes, segurando um cigarro. Mas hoje me arrependo de ter começado, porque é difícil de parar.?
Andressa Jotzak, 20 anos, diz ter começado a fumar há três anos, para controlar a ansiedade. Ela também apóia a lei que proíbe os anúncios. ?Influencia especialmente os mais jovens, que ainda estão formando a personalidade. Vincular o cigarro ao sucesso, ao glamour, ao esporte, acaba incentivando o consumo.?
Já Bruno Zullato, 21 anos, é contrário à proibição dos anúncios. ?As empresas têm que ter liberdade para vender o produto delas. O jovem tem o poder de escolha e consciência do mal que o cigarro faz. A influência de parentes e amigos é mais forte.? Ele mesmo confessa ter começado a fumar por influência dos amigos e concorda com a dificuldade de deixar o vício, que ele carrega há seis anos. Ele fuma uma carteira de cigarros por dia e anda com uma carteira reserva para não ficar sem. ?Teve um dia que andei algumas horas para achar um local aberto para comprar cigarro. Se pudesse voltar atrás, não teria começado.?