Uma espécie exótica de javali vem preocupando biólogos e pesquisadores que atuam no Parque Estadual de Vila Velha, em Ponta Grossa, na região dos Campos Gerais. Trata-se do javaporco (Sus scrofa híbrido), que começou a aparecer no lugar há cerca de cinqüenta anos e se multiplicou de forma intensa e desordenada, competindo com espécies nativas.
?Embora seja de origem africana, o javali veio da Europa para a América do Sul por volta do ano de 1906, sendo introduzido primeiramente na Argentina, depois no Uruguai e posteriormente no Brasil, pelo Estado do Rio Grande do Sul. O início da criação do animal no Paraná se deu na década de sessenta?, explicam as biólogas Simone Umbria e Simone Dala Rosa, que desenvolvem trabalhos dentro do parque.
O javaporco é originário de javalis que escaparam para ambiente natural e cruzaram com porcos domésticos ou porcos que, também devido a fugas ocorridas em cativeiros, se tornaram selvagens. O nome científico do animal deriva da denominação científica do javali puro, que é Sus scrofa. Atualmente, a espécie exótica está disseminada por diversas regiões tanto do Paraná quanto de outros estados do Brasil e países sul-americanos.
O número exato de javaporcos presentes em Vila Velha não é conhecido. Isso porque o bicho, que geralmente tem hábitos crepusculares, foge diante de qualquer aproximação de seres humanos. Eles também não representam grandes riscos às pessoas, podendo vir a atacar apenas em situações extremas, quando se sentem ameaçados ou quando necessitam defender os filhotes. ?É muito difícil ver o animal. Tanto que temos uma única foto dele, conseguida através de montagem de armadilha fotográfica. Eles são rápidos e não permitem aproximação. Não há registros de ataques a visitantes ou funcionários do parque?, dizem.
Os javaporcos, que normalmente se deslocam em grupos, representam ameaça principalmente ao cateto, uma espécie de porco-do-mato nativo da região que está tendo que disputar espaço e alimento com os representantes da espécie exótica. A estimativa é de que, em breve, a disputa se torne desigual. Isto porque, enquanto um cateto fêmea tem no máximo dois filhotes a cada gestação, os javaporcos têm de seis a dez filhotes, se multiplicando muito mais rapidamente.
?Estamos tentando conhecer a biologia do javaporco para poder propor um plano de manejo dos animais que vivem em Vila Velha. Não pensamos em eliminar a espécie exótica, mas sim retirar parte de seus representantes do parque, diminuindo a quantidade de indivíduos no local. Também não queremos transferir o problema para outro lugar. Por isso, pensamos em conversar com criadores que possam receber os bichos. Todo o trabalho deve ser feito sem que o bem-estar dos animais deixe de ser levado em consideração.?
As biólogas não sabem dizer com exatidão se o javaporco, que chega a pesar 200 kg, é capaz de cruzar com o cateto, que pesa até 30 kg. Até agora, não há indícios de cruzamentos entre as espécies, mas a possibilidade não é descartada. Os javaporcos se alimentam de pequenos invertebrados, raízes e frutos. A distribuição geográfica deles é conhecida principalmente através de pegadas deixadas na mata, solo fuçado e troncos encontrados roídos.
Biólogas estudam hábitos do animal
Foto: Daniel Derevecki |
Simone Dala Rosa e Simone Umbria desenvolvem projeto. |
Além de estudarem os hábitos do javaporco, as biólogas Simone Umbria e Simone Dala Rosa desenvolvem um projeto de educação ambiental voltado a crianças que vivem no entorno do Parque Estadual de Vila Velha. Elas iniciaram o trabalho em meados do ano passado e já contam com uma turminha de 38 meninas e meninos, entre 6 e 13 anos de idade, interessados em apreender mais sobre a fauna da região.
?O projeto surgiu por acaso. Realizávamos pesquisas no parque e em áreas próximas e algumas crianças começaram a nos acompanhar, demonstrando interesse por nossos estudos. Foi então que resolvemos inseri-las em algumas atividades e criar o projeto. Hoje, as participantes têm carteirinha do grupo e saem para campo, realizando ações como observação de espécies e visualização de pegadas?, contam.
As biólogas também tentam conscientizar as crianças sobre os malefícios da caça indiscriminada. Na região de Vila Velha, a caça de espécies selvagens ainda é realizada como forma de diversão por muitos grupos de amigos e famílias. ?Algumas pessoas que vivem nas proximidades do parque falam da caça como se ela fosse uma atividade normal. Por isso, tentamos explicar às crianças por que elas não devem matar os animais. Esperamos que elas levem as informações a seus familiares e tenham maior consciência da necessidade de preservação ambiental.? (CV)
Cateto é o mais prejudicado
O cateto – principal prejudicado pela disseminação acelerada do javaporco – também é popularmente conhecido como caititu ou porco-do-mato brasileiro e tem como nome científico Tayassu tajacu. O animal não é considerado um suíno, pois tem apenas três dedos nas patas traseiras.
Os representantes da espécie também vivem em bandos, sendo que alguns machos podem ser observados sozinhos. Normalmente, os grupos são compostos de cinco a dez indivíduos. Porém, já foram verificados grupos com até vinte componentes.
Os animais habitam florestas e cerrados e têm expectativa de vida de até 25 anos. Assim como os javaporcos, se alimentam de frutas, invertebrados e raízes. (CV)
Variedade de espécies
Além do javaporco e do cateto, quem visita Vila Velha tem a oportunidade de visualizar e obter informações sobre uma série de outros animais. No lugar, vivem lobos-guarás, sussuaranas, gaviões-caracaras, corujas-buraqueiras, gralhas, tucanos, tatus-galinha, quatis, gambás, serelepes, tamanduás-mirins, entre outras espécies.
O parque estadual fica a oitenta quilômetros de Curitiba e a vinte da cidade de Ponta Grossa, na região dos Campos Gerais. No local, também é possível conhecer rochas de formatos curiosos, visitar as furnas (constituídas de quatro crateras) e a Lagoa Dourada, cujo fundo é misturado com mica, que faz com que a água tenha coloração dourada ao refletir a luz do sol. (CV)