Formar profissionais professores, neste início de século e de milênio, vem sendo um desafio que se impõe às propostas de formação. Para isso, voltar a atenção para um projeto de formação que dê conta do ?aprender a ser professor? a partir de uma revisão da concepção de conhecimento como algo nocional e imutável, apontado por Imbernón (2002), é o que nos propomos neste estudo.
O professor não pode mais ser considerado técnico ou especialista, único responsável por aplicar e fazer cumprir as regras que emergem do conhecimento científico. A metáfora do professor como ?técnico? que prevaleceu no século XX, herdada do positivismo, para Pérez Gómez (1998, p. 96-97) tem como eixo norteador a concepção tecnológica da atividade profissional (prática) e traz em si uma autêntica divisão pormenorizada do trabalho, gerada pela hierarquização na produção do conhecimento, pela aceitação externa sobre as metas de intervenção e conseqüente separação entre teoria e prática.
Ao propormos a superação dessa metáfora pela inserção profissional do futuro pedagogo/professor, no espaço da escola, e pela reflexão sobre a prática pedagógica, buscamos, como diz Imbernón (2002, p. 40), ?levar em conta o meio, o grupo, a instituição, a comunidade, as bases implícitas, as decisões e as atitudes do professorado?. Além disso, ao organizar esta prática de inserção, no contexto de um Projeto Pedagógico fundamentado em uma perspectiva crítica de educação, buscamos a superação do conceito de professor, próprio do enfoque da racionalidade técnica, centrado no eixo da transmissão-assimilação do conhecimento.
A perspectiva da nossa proposta é bem mais complexa, pois entendemos que o futuro pedagogo/professor, ao lidar com o conhecimento em construção e ao conceber a educação como compromisso político ancorado em valores éticos e morais, terá que considerar o desenvolvimento das pessoas e a colaboração entre os membros da instituição educacional.
Assim, ser pedagogo/professor, hoje, é ser um profissional competente para organizar a prática pedagógica do espaço escolar, ensinar, participar de decisões que envolvem o projeto da escola, lutar contra a exclusão social, manter relações de estudo com a equipe do espaço em que exerce sua profissão, inclusive com a comunidade do entorno desse espaço. Ter clareza de que o espaço profissional não será apenas o espaço escolar, mas toda sua rede de relações, inclusive o espaço não escolar.
A formação do pedagogo/professor, ao assumir o papel de ir além da atividade de especialista em supervisão escolar, orientação educacional e administrador escolar e também professor, não se restringe à mera atualização científica, pedagógica e didática, mas se transforma em espaços de participação, reflexão e formação para que os futuros pedagogos/professores se adaptem e possam conviver com a mudança e a incerteza. Nessa proposta, procuramos fazer com que o saber escolar entrasse em diálogo com o saber do futuro pedagogo/professor e a realidade objetiva em que as práticas sociais se produzem, possibilitando aos atores do processo de ensinar e aprender, uma perspectiva espiralada, num movimento de ação-reflexão-ação. (…)
(…) Nessa perspectiva de formação concordamos com André (1997, p. 21) quando diz que ?os conhecimentos são construídos por meio da ação e da interação? e que ?o sujeito aprende quando ele se envolve ativamente no processo de produção de conhecimentos através da mobilização das suas atividades mentais e da interação com o outro, mediada pela linguagem?. Assim, um dos instrumentos propostos para dar conta de situações complexas com que irá se deparar o futuro profissional da educação no seu dia-a-dia será a de incluir, segundo a autora, o ?desenvolvimento de habilidades básicas de investigação? (p. 21).
(…) Nessa perspectiva, consideramos oportuno afirmar que a formação inicial do profissional da educação é indissociável de uma prática profissional. É um processo que exige uma formação contínua no sentido de movimento sem interrupção: o formar-se sempre por meio do qual vai adequando sua formação às exigências da futura atividade profissional e vai construindo sua identidade profissional. (…)
Assim, tomamos como eixo epistemológico para essa pesquisa a concepção de que a teoria é a expressão de uma determinada prática e não de qualquer prática. Nesse paradigma, a prática não é dirigida pela teoria, mas a teoria vai expressar a ação prática dos sujeitos. São as formas de agir que vão determinar as formas de pensar dos homens. ?A teoria pensa e compreende a prática sobre as coisas, não a coisa. Daí, a sua única função é indicar caminhos possíveis, nunca governar a prática? (BRUNO 1989, p. 18). A base do conhecimento é a ação prática que os homens realizam por meio de relações sociais, mediante instituições. O pressuposto básico é que ?o homem não reflete sobre o mundo, mas reflete a sua prática sobre o mundo? (BERNARDO, 1977, v. 1, p. 86). Dessa forma, ?o conhecimento é sempre o conhecimento de uma prática, nunca da realidade natural ou social? (SANTOS, 1992, p. 29). Com essa postura, procuramos desenvolver um processo de pesquisa-ensino (MARTINS, 2003) procurando ultrapassar as reflexões acadêmicas que se materializam em relações sociais unilaterais, verticalizadas e individualistas; na maioria das vezes distanciadas dos problemas que a prática pedagógica, desenvolvida nas escolas, enfrenta.
Nota:
Trabalho apresentado no Congresso Internacional Educação e Trabalho: Representações Sociais, Competências e Trajetórias Profissionais – Aveiro Portugal, maio/2005.
