A Índia quer fortalecer a relação com o Brasil e ter o País como principal aliado na América do Sul. A avaliação é do diplomata aposentado Fausto Godoy, hoje professor de relações internacionais da ESPM, que serviu em 11 países da Ásia. Godoy trabalhou na Embaixada do Brasil em Nova Délhi, nos anos 80, e depois foi cônsul-geral em Mumbai, no fim dos anos 2000. Para ele, a Índia é a parceira ideal para o Brasil. “A classe média da Índia é de 350 milhões de habitantes – um Brasil e meio. Será que não é um mercado interessante?”, questiona. Leia a seguir trechos da entrevista dada ao jornal O Estado de S. Paulo.

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Qual o significado do convite dos indianos ao presidente Jair Bolsonaro para a cerimônia do desfile do Dia da República?

É um momento muito importante para toda a sociedade indiana. Desde que houve a independência da Índia, eles sempre tentaram se aproximar e nós fizemos um certo “corpo mole”, por assim dizer. A então primeira-ministra, Indira Gandhi, esteve aqui em 1968, mas só em 1996 um presidente foi para lá, o Fernando Henrique.

E por que a Índia quer o Brasil por perto?

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Porque nos parecemos muito em vários setores. Somos países líderes nas nossas regiões. Temos um projeto de desenvolvimento econômico muito similar, que começou no início dos anos 90 com o abandono dos dois países da política de substituição de importações, da volta para o mercado interno, e fomos nos globalizar. A Índia tem um mercado interno muito grande, que é interessante para nós, e o relacionamento comercial entre os dois países hoje é muito desequilibrado. Sou membro da Câmara de Comércio Brasil-Índia. As empresas indianas estão nos procurando. E quais empresas brasileiras estão na Índia? Existe um descompasso muito grande.

O senhor considera que há potenciais inexplorados nessa relação?

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Sim. Por isso essa visita, para achar pontos de encontro. Daí a importância da delegação que está indo com o presidente. O comércio bilateral, no ano passado, foi de US$ 7,5 bilhões. Com a China, foi de US$ 100 bilhões. Mas a população da Índia é igual à da China. A classe média da Índia, que pode consumir produtos como nós, é de 350 milhões de habitantes – um Brasil e meio. Será que não é um mercado interessante? Só agora estamos vendo isso? Atualmente, o parceiro ideal do Brasil é a Índia, país que mais tem nosso perfil, apesar das diferenças de civilização e de população. Temos de forjar uma aliança muito profunda, porque a Índia é importante naquela região da Ásia e nós somos muito importantes na América do Sul.

Como fazer funcionar uma parceria estratégica?

Com vontade política. Se não existe isso em diplomacia, não acontece nada. É fácil fazer e assinar um acordo para depois ter o que mostrar como resultado da viagem. Agora, vai ser realmente válido? Se tiver vontade política, sim. E, aparentemente, existe. Então, acho que estamos diante de um fator muito importante. O agronegócio é o futuro. Temos de usar nossas vantagens comparativas. Você pode passar sem um computador, mas não pode deixar de comer. A presença da ministra da Agricultura (Tereza Cristina) é muito importante para lançar essa agenda. Vejo duas agendas funcionando bem, a da agropecuária e a da tecnologia da informação.

Como vê o interesse do Brasil em formar um mercado global de etanol?

Essa é uma aposta. O mercado de automóveis na Índia é brutal. E a população também é brutal. O etanol seria um substitutivo menos poluente para a Índia acrescentar em sua matriz energética. Lá existe um grande problema de poluição, pessoas andando de máscaras nas ruas. Aparentemente, a solução atual seria a mudança, acrescentando mais etanol. Mas a pergunta é: teríamos capacidade de suprir um mercado do tamanho do indiano? São desafios para o futuro. Isso depende de coordenação governamental.

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.