Físicos encontram provável “partícula de Deus”

Após anos de espera, imprevistos, problemas técnicos e muito suor, os físicos do LHC (Grande Colisor de Hádrons), maior acelerador de partículas do mundo, anunciaram a descoberta de uma nova partícula. E eles acreditam que seja o famoso bóson de Higgs.

Caso isso seja confirmado, será o coroamento da teoria científica mais bem-sucedida de todos os tempos -o chamado Modelo Padrão, que explica como se comportam todos os componentes e forças existentes na natureza, salvo a gravidade (explicada pela relatividade geral).

Contudo, cabe atenção para a formulação cuidadosa das afirmações dos pesquisadores.

Em seu último relatório, no fim do ano passado, eles já sugeriam ter encontrado algo, mas não descartavam um alarme falso.

Agora, eles já cravam categoricamente a existência da nova partícula. Só não admitem com todas as letras que se trata da almejada “partícula de Deus”.

“Apesar de os eventos [de colisões de partículas no acelerador] sugerirem que estejamos diante do bóson de Higgs, a confirmação de que se trata realmente da partícula predita requer mais medidas comparativas”, afirma Sérgio Novaes, físico da Unesp (Universidade Estadual Paulista) e membro da Colaboração CMS, um dos dois experimentos do LHC que servem de base para o anúncio.

Ossos do ofício, num esforço que envolve análise de dados de milhões de colisões de partículas para que, estatisticamente, seja possível chegar a alguma conclusão definitiva.

De toda forma, o novo achado dá toda pinta de que se trata mesmo do almejado bóson.

O anúncio da descoberta foi feito num evento realizado às 4h (de Brasília) de hoje, transmitido ao vivo pela internet da sede do Cern (Organização Europeia para Pesquisa Nuclear), em Genebra, Suíça, para a abertura da 36ª Conferência Internacional em Física de Altas Energias, o Ichep, em Melbourne, Austrália.

Entre os convidados no auditório estava ninguém menos que o escocês Peter Higgs, físico que propôs (simultaneamente a outros) um mecanismo de como as partículas adquirem sua massa e, com isso, emprestou seu nome ao famoso bóson.

Sem erro

Os cientistas descartam a essa altura que alguma flutuação estatística seja responsável pelo achado.

A probabilidade de não ser uma nova partícula, e sim algum engano, é de menos de 1 em 1,7 milhão. Cometer um erro desses é tão improvável quanto ganhar na loteria.

Ainda mais porque o resultado é confirmado pela combinação de dois experimentos do LHC Atlas e CMS e está alinhado com os dados obtidos pelo Fermilab, nos Estados Unidos, com seu antigo acelerador Tevatron, hoje desativado.

Concorrência

Na segunda-feira, os americanos chegaram a divulgar suas últimas análises dos velhos dados, que mostravam a indicação de uma partícula com as características do bóson de Higgs e uma energia entre 115 e 135 giga-elétronvolts (GeV), com 90% de confiança.

Entretanto, ainda estava longe do grau de exigência da comunidade para tratar o resultado como uma descoberta.

Somente agora, com os resultados do LHC é possível cravar a existência da nova partícula, com energia de 125 GeV.

Fim ou recomeço?

A descoberta do Higgs há anos é apresentada como a principal motivação para a construção do LHC. Agora que a partícula provavelmente foi encontrada, pode ficar para o público uma sensação de vazio. Mas o sentimento não é compartilhado pelos físicos.

“Em primeiro lugar, há um equívoco em associar o LHC só ao bóson de Higgs”, afirma Ronald Shellard, físico de partículas do CBPF (Centro Brasileiro de Pesquisas Físicas) e vice-presidente da SBF (Sociedade Brasileira de Física).

“Todos concordamos que o bóson de Higgs não vale US$ 10 bilhões. Essa máquina, o LHC, foi concebida para explorar o Universo além do Modelo Padrão. A descoberta do Higgs coroa o maior feito intelectual da história da humanidade até agora, uma teoria que explica uma infinidade de fenômenos naturais”, disse. “Mas, para o LHC, ela é apenas o começo.”

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