A campanha presidencial na Venezuela é desequilibrada a favor do governo, mas o sistema eleitoral é confiável, permite controle e monitoramento pela oposição e exclui a possibilidade de fraude massiva que não seja detectável.
Essa é a conclusão de um detalhado informe sobre as condições em que se realiza a disputa e sobre o sistema de votação eletrônico venezuelano lançado neste mês pelo think-tank americano Wilson Center e pelo Idea (Instituto Internacional para Democracia e Assistência Eleitoral, na sigla em inglês).
O estudo feito pelo acadêmico mexicano José Woldenberg e pelo ex-diplomata chileno Genaro Arriagada diz que o sistema, questionado pela oposição até 2006, ganhou legitimidade de lá para cá.
“Como questionar totalmente [o sistema] sem considerar que, em duas das últimas quatro votações, ele mostrou triunfo da oposição? Isso não impede de apontar suas limitações, mas elas não são de magnitude tal que impeçam atuar dentro dele”, escrevem.
Os autores se referem à proposta de reforma constitucional que foi apresentada por Hugo Chávez em 2007 e derrotada em referendo por 1,5% de votos de diferença e às eleições parlamentares de 2010, quando o voto geral oposicionista venceu o chavista -ainda que, por conta do sistema distrital misto e de mudanças nas circunscrições, o governo tenha levado mais deputados.
Na Venezuela, o sistema é parecido com o do Brasil, mas, lá, cada voto eletrônico gera um comprovante em papel que o eleitor deposita numa urna convencional. Ao final da votação, as atas eletrônicas são conferidas, na presença de observadores dos partidos ou coalizões, com o resultado de urnas convencionais escolhidas por sorteio.
Nas eleições de 2010, 55% das atas passaram pelo cotejo. Os observadores partidários de cada mesa de votação também recebem as atas eletrônicas, que podem ser comparadas com os resultados apresentados pelo CNE (Conselho Nacional Eleitoral).
Para os autores do estudo, a possibilidade de conferir resultado mesa por mesa torna praticamente impossível forjar resultados desde que a oposição se organize para ter observadores nas 37 mil mesas eleitorais do país.
A coalizão opositora MUD (Mesa da Unidade) diz ter a estrutura necessária para fazê-lo, em uma mega estratégia batizada de “defesa do voto”, comandada pelo coordenador nacional da campanha de Henrique Capriles, Leopoldo López.
Se não houver observadores em cada mesa, argumentam, poderia-se cogitar a possibilidade de que governistas em conluio com mesários -escolhidos por sorteio- votassem pelos ausentes para alterar os resultados.
Intimidação e desinformação
O informe discute ponto questionado pela oposição no passado e até hoje uma sombra nas eleições: é possível identificar como cada eleitor votou? A questão é importante porque, baseado nesta possibilidade, beneficiários de programas sociais e funcionários públicos poderiam deixar de votar na oposição temendo represálias.
Há um precedente relacionado, já que os que assinaram pedido para realizar referendo revogatório contra Chávez em 2004 foram parar na chamada Lista Tascón, uma lista negra que levou a demissões e foi usada como critério de contratação no serviço público.
O fantasma foi revivido nos últimos meses por setores minoritários da oposição e na imprensa opositora, porque nesta eleição haverá a identificação biométrica dos eleitores.
O estudo descarta a possibilidade de quebra do sigilo do voto -“a análise de auditores externos do CNE e do conselheiro do órgão ligado à oposição indicam que o segredo do voto está assegurado”-, mas critica o CNE, alinhado ao governo, por não fazer uma campanha intensiva para dissipar a dúvida.
“Alguns críticos do governo apontam que isso [campanha esclarecedora] não será possível dado que a desconfiança joga a favor do candidato governista”, escrevem.
Sem observadores
O informe pode ser resumido assim: a maior vulnerabilidade na eleição venezuelana está antes do voto, com o uso de cadeias nacionais de rádio e TV pelo presidente, falta de controle do uso dos recursos públicos e alinhamento do CNE com o governo, não no risco de fraude dos resultados.
Por fim, os autores também criticam a ausência de observadores internacionais eleitorais na campanha e no dia da votação. O CNE não permitirá observadores, mas “acompanhantes”, “forma de participação simbólica que carece de real significado”, diz o estudo.
O Centro Carter, por exemplo, não aceitou o novo status, e as autoridades eleitorais venezuelanas tampouco convidaram observadores da União Europeia ou da OEA (Organização dos Estados Americanos). A Unasul (União de Nações Sul-Americanas) será acompanhante, numa estréia do grupo em atividades eleitorais nos países membros.
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