Dois assuntos predominavam nas ruas de Havana nas últimas semana: os capítulos decisivos da novela brasileira A Favorita e as mudanças econômicas que começaram a ser discutidas nos comitês populares na quarta-feira e serão definidas no Congresso do Partido Comunista Cubano em março.
Muitos trabalhadores do setor de serviços estão preocupados com seu futuro e o do país. Eles dizem – em sua maioria impregnados da doutrina revolucionária – acreditar na direção do partido e na elaboração teórica dos economistas, mas temem perder certos direitos que são o seu maior orgulho, a saúde e a educação gratuitas.
A maior parte dos trabalhadores cubanos só conheceu o modelo de economia socialista, implementado pela revolução cubana liderada por Fidel Castro e vitoriosa em 1959. Pelo menos 500 mil deles devem perder seus empregos nas estatais do país e – de acordo com o plano do governo de Raúl Castro, que sucedeu ao irmão depois que ele adoeceu, em 2006 – incorporar-se a pequenos negócios individuais ou familiares privados, que vão de salões de barbearia a criação de coelhos.
Raúl, que antes de chegar à chefia do Estado era visto por muitos no exterior como uma voz do partido que defendia a adoção de reformas econômicas ao estilo chinês, admitiu em vários de seus discursos que a produtividade estatal era ineficiente e incapaz de suportar a política de subsídios sociais. O corte de 500 mil vagas de emprego do Estado só deve ser concluído no ano vem, mas já há quem sinta seus efeitos.
Fervor revolucionário
O farmacêutico Antônio – ou “Toni, o Boticário”, como se apresenta – tem agora duas ocupações. Num dia, trabalha exercendo sua profissão original. No outro, dirige uma van da cooperativa Cubataxi para aumentar sua renda.
Nereida Avilés, de 50 anos, que trabalha na segurança do Hotel Lincoln, em Havana Velha, também já sentiu os efeitos das mudanças econômicas. Antes, ela trabalhava no setor de nutrição e servia as mesas do restaurante do hotel. Foi dispensada do setor pela direção e ficou magoada com isso. Ainda está sendo treinada para o novo trabalho, mas, como muita gente na ilha, aceita as determinações do Estado com a resignação que o governo costuma qualificar “fervor revolucionário”.
“A vida é muito dolorosa e temos de fazer muitos sacrifícios pela revolução”, diz Nereida. “Mas, se são necessários, eu os faço com satisfação.”