O ódio e o clima hostil ao trabalho de jornalistas aumentaram, segundo o ranking mundial da liberdade de imprensa de 2018 elaborado pela ONG Repórteres Sem Fronteiras (RSF). O fenômeno foi observado em países tão diferentes como os Estados Unidos e Venezuela, aponta o relatório divulgado nesta quarta-feira, 25, pela instituição. Marcado estruturalmente pela violência e a corrupção, o Brasil subiu uma posição e foi para a 102ª colocação no ranking, que avalia anualmente as condições para o exercício do jornalismo em 180 países.
Na lista, quanto mais alta a colocação, melhores são as condições para o exercício da atividade. A ONG mostrou que a hostilidade contra os meios de comunicação foi encorajada por políticos e por regimes autoritários, em cenário que já não é exclusividade de países sob regimes autoritários. Esse é o caso da Turquia, que está na 157ª no ranking, ou o Egito (161º), mergulhados na “fobia dos meios de comunicação” a ponto de aprisionar arbitrariamente os profissionais críticos a seus governos, afirmou a instituição.
A Repórteres Sem Fronteiras também avaliou no trabalho que cada vez mais chefes de Estado eleitos democraticamente enxergam a imprensa como um “adversário”, e não mais como “um fundamento essencial da democracia”. Os Estados Unidos, por exemplo, caíram duas posições no ranking da liberdade de imprensa e agora ocupam o 45º.
Uma justificativa seria a de que o presidente Donald Trump é adepto do “media-bashing”, que qualifica os repórteres como “inimigos do povo”. Na Índia (138º colocado, com recuo em duas posições), os discursos de ódio contra os jornalistas teriam aumentado pelas redes sociais, com exércitos de trolls pagos pelo governo.
Para o secretário geral da Repórteres sem Fronteiras, Christophe Deloire, a liberação do ódio contra os jornalistas “é uma das piores ameaças para as democracias”. “Os dirigentes políticos que alimentam a repulsa contra o jornalismo têm uma pesada responsabilidade, pois colocam em questão a visão de um debate público baseado na apreciação plural dos fatos e favorecem o desenvolvimento de uma sociedade de propaganda. Contestar hoje a legitimidade do jornalismo é brincar com fogo”, diz.
Pelo segundo ano consecutivo, o líder em liberdade de imprensa no ranking é a Noruega, seguida por outros países nórdicos. Já a Coreia do Norte manteve a última colocação – é onde o jornalismo encontra as piores condições para seu exercício livre em todo o mundo. A análise também destacou que, com onze jornalistas mortos, o México (147º) tornou-se em 2017 o segundo país mais mortífero do mundo para os jornalistas. Está atrás apenas da Síria, que há anos vive sob guerra civil.
Brasil O Brasil melhorou uma posição, em um contexto de grande tensão política, segundo a ONG, com o impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff (PT) em 2016 e a prisão do também ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, no período pré-eleitoral de 2018. “O fato de ter melhorado apenas uma posição não significa que tenha apresentado alguma melhora. Os problemas em torno do trabalho dos jornalistas no Brasil permaneceram”, disse o diretor para a América Latina da RSF, Emmanuel Colombié.
Entre as formas de agressão contra jornalistas no Brasil, a ONG destacou os ataques durante a cobertura de manifestações. A instituição também apontou que no País jornalistas são “regularmente intimidados ou alvos de processos judiciais abusivos”. Isso atinge principalmente a mídia alternativa, que trabalha longe de centros urbanos.
A Venezuela caiu seis posições (143º lugar), na maior queda do continente, devido ao governo de Nicolas Maduro. Para Colombié, as agressões durante as manifestações, as prisões arbitrárias e as expulsões de jornalistas estrangeiros se multiplicaram no país. “Nicolas Maduro não quer que jornalistas mostrem a realidade do país, atrapalha o trabalho da imprensa com serviços de espionagem e a proibição da entrada de jornalistas estrangeiros. Já está quase certo que ele irá se eleger de novo, e a situação de censura vai continuar”, disse.
Já o Canadá de Justin Trudeau conquistou quatro lugares e alcança o Top 20, no 18º lugar, no nível em que a situação da liberdade de imprensa é classificada de “relativamente boa”. Os conflitos armados que perduram na Síria (177º) e no Iêmen (167º), as acusações recorrentes de terrorismo usadas contra os jornalistas no Egito (161º), na Arábia Saudita (169º) e no Bahrein (166º) continuam a fazer do Oriente Médio a região mais difícil e perigosa do mundo para um jornalista exercer sua profissão.
A Costa Rica foi classificada como o melhor país da América Latina no ranking: ficou em décimo lugar em 2018. Cuba encontra-se em 172º lugar. Mantém-se, ano após ano, como o pior país do continente em liberdade de imprensa. O governo castrista manteve um monopólio quase absoluto sobre a informação.
As fake news também são uma preocupação da ONG, que ressaltou que acompanhará de perto a sua disseminação e checagem. Para Colombé, não deve ser papel do Estado essa regulação. “Não é o Estado que deve dizer o que é informação ou não. Isso pode ser usado de forma perigosa de abuso contra o trabalho jornalístico”, disse.