Comemorando a 15.ª primavera

Em 1955, dona Jussara Almeida tinha 15 anos. Naquele tempo, conta a aposentada, essa era a idade em que uma garota começava a pensar em namorar, para ter um par que a acompanhasse no baile de debutantes. ?Nada era mais importante do que a valsa dos namorados. Você dançava até a meia-noite com o pai e, depois, com o namorado?, explica. Era a apresentação à sociedade. O baile de dona Jussara foi na Sociedade Thalia, mas ela diz que participou como conviva da festa de todos os clubes tradicionais naquele ano. ?Na prática, depois de debutar, a gente tinha permissão para ir aos bailes à noite, usar vestido comprido, salto alto, um pouco de batom. Ninguém queria perder a chance de estar em todos as festas?, lembra.

O baile de debutantes tem sua origem distante de Curitiba, aparecendo timidamente na Áustria juntamente com a valsa e o auge dos bailes da corte no século XVIII. Servia também para apresentar as moças à sociedade, mas não necessariamente aos 15 anos. Já a palavra debutante vem do chique francês, onde debut quer dizer início, apresentação. Ou seja, para qualquer moderno de plantão, trata-se de uma tradição para lá de datada. Mas, surpreendentemente, em Curitiba o baile continua muito em voga. Somente no último mês, quando os tradicionais clubes sociais da cidade promoveram seus bailes, aproximadamente 500 debutantes foram introduzidas à sociedade.

De acordo com o antropólogo e professor da Universidade Federal do Paraná (UFPR) Carlos Alberto Balhana, já houve época mais pródiga para a celebração, em que esses baile nos clubes sociais da cidade eram os programas preferidos do curitibano, principalmente na década de 1960. Nesse tempo, dificilmente havia um final de semana em que casais de pés-de-valsa não rodopiassem embalados por orquestras nos salões do Thalia, do Curitibano, do Graciosa e do Concórdia, um dos preferidos da época. ?Assim como hoje, o baile de debutantes tem a ver com glamour e principalmente é a iniciação da adolescente no mundo adulto?, explica Balhana. Mas muito além do mundo adulto, ressalta o antropólogo, é o mundo dos ?bem- nascidos?. ?Trata-se de uma tradição, onde se perpetua o nome da família no quadro social dos clubes?, explica.

Para Balhana, nada mais lógico do que essa tradição, mesmo tendo perdido muita força com o passar dos anos, continuar viva em Curitiba, uma cidade bastante conservadora. ?Mas o caráter mudou. Antes as meninas esperavam ansiosas pela ocasião, pois era quando poderiam passar a freqüentar e a se sentir parte do mundo adulto?, diz. Na época dos bailes, tradicionalmente em setembro, as casas de sapatos e roupas chiques colocavam fotos das debutantes na vitrine. Hoje essa tradição foi parar dentro dos shopping centers.

Modelos

O antropólogo explica que durante a década de 1960, o modelo de beleza e comportamento que as jovens curitibanas seguiam era o da atriz Audrey Hepburn, imortalizada no filme Sabrina. ?A idéia dessas jovens era ser Miss Brasil, mas para isso era necessário ser imaculada e religiosa e ter cara de pura e santa?, aponta. Mas a partir do fim dessa década, através da revolução sexual, o modelo de atitude passou de menina pura para mulheres decididas, personificadas pelas atrizes Brigitte Bardot e Rachel Welch. ?A partir disso a tradição do baile de debutantes caiu muito, sendo mantida principalmente na elite?.

Meninas vestidas como princesas

Hoje, na opinião do professor Carlos Balhana, muitas jovens acabam participando das festas devido a pressão dos pais. ?No início meus pais pressionaram, mas depois me apaixonei pela idéia de participar do baile?, conta a jovem Camila Caetano Brandt, que debutou juntamente com outras 36 adolescentes do Santa Mônica. Mais surpreendente, Camila diz que nenhum de seus convidados achou a idéia de participar do baile ?cafona?. ?Quase todas as minhas colegas de classe debutaram?, revela. E mesmo que ganhem outros presentes ou viagem para o exterior, uma nova tradição aos 15 anos, acabam realizando o baile.

Para o coordenador social do Santa Mônica, Natan Kaiser dos Reis, que há oito anos organiza o baile de debutantes no clube, as mães são as principais responsáveis pela manutenção dessa tradição. ?Elas fantasiam a ocasião e vibram quando vêem suas filhas vestidas de princesa?, diz. Os bailes tradicionais acabam sendo quase um investimento, custando a partir de R$ 4 mil apenas para participação, dependendo do clube. Natan conta que o evento já deu uma modernizada, contando com videoclipes e músicas mais recentes no repertório. ?Mas o que não pode faltar é a participação de algum ator global na festa?, conta.

Vestido

Mas a parte que ainda mantém o maior glamour na comemoração é a escolha do vestido. Natan diz que a tradição manda as meninas vestirem branco, porém o clube está abrindo um pouco para a escolha de tons pastéis. ?Mas nada muito chamativo?, ressalta. E se a participação em si já pode custar muito, o vestido é quase um conto de fadas. Segundo Vera Van Der Sand, proprietária da Maison Valentina, uma das confecções mais procuradas pelas debutantes em Curitiba, gasta-se mais na cidade com essas festas do que com casamentos. ?Escolher a roupa foi a parte que mais me diverti durante a preparação para a festa?, admite Camila. E aí, novamente a mãe tem participação preponderante. ?A mãe quer ficar tão deslumbrante na festa quando a filha?, conta Vera. De acordo com a estilista, o aluguel de um vestido já usado não sai por menos de R$ 650, mas revela que já fez vestes de mais de R$ 5 mil. ?O preço médio de um primeiro aluguel sai por R$ 1,8 mil?.

Presentes

Além da festa, muitos adolescentes estão preferindo viagens para o exterior para comemorar os seus 15 anos. Segundo Daniel Teixeira, que faz vendas numa das agências da CVC em Curitiba, ir para Disney em julho tornou-se o ?sonho da classe média curitibana?. ?Numa sala de aula de um colégio particular caro, cerca de 40% dos alunos faz essa viagem. Tornou-se um status perante os amigos?, diz Teixeira. O preço do status: cerca de U$ 1,8 mil. Natan diz que muitas das debutantes do clube fazem a viagem, mas mesmo assim fazem o baile. Além disso, todas ganham uma jóia durante a festa. ?Pode passar o tempo, mudar as tradições, mas essa é a noite de princesa de todas elas?, acredita Natan. (DD)

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